Você já comeu camarão mole? Iguaria tem a casca fininha e cabeça que sai fácil

Especialista em frutos do mar e campeão do 'Mestre do Sabor', chef Dário Costa faz tempurá com a iguaria em seu restaurante Madê, em Santos

9 nov 2023 - 05h00
Chef Dário Costa mostra a flexibilidade do camarão mole. FOTO ALEX SILVA/ESTADAO
Chef Dário Costa mostra a flexibilidade do camarão mole. FOTO ALEX SILVA/ESTADAO
Foto: ALEX SILVA/ESTADAO / Estadão

Talvez você tenha comido camarão mole e nem saiba. Na dúvida, não há nada de errado em descer à Baixada Santista só para comê-lo no tempurá de Dário Costa. Mas, se cabe uma palavrinha, o oitavo prato do menu comemorativo aos 6 anos do Madê é muito mais que uma deliciosa fritura, com um quê de inusitada.

Um camarão-rosa daquele tipo, com muita sorte, troca de casca umas 20 vezes na vida e chega aos dois anos de idade. Fato que o chef mais premiado de Santos desconhecia. Filho de mergulhador, surfista e cozinheiro há 15 anos, Dário notou há pouco tempo que, no meio dos camarões a serem limpos, uns "20% tinham a casca bem fininha e a cabeça saia sozinha".

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Dobrando a atenção, viu que o fenômeno se repetiu. E se repetia. Foi atrás de Ricardo Franzese, terceira geração de comerciantes de pesca, no Guarujá: "É sempre assim, é que nos camaroeiros, os pescadores já separam, porque eles não têm o mesmo valor que os normais. Vale mais a pena a gente vender limpo".

O vencedor do reality Mestre do Sabor não se deu por vencido. Quis ouvir também Antônio Olinto Ávila da Silva, coordenador do Programa de Monitoramento da Atividade Pesqueira Marinha de São Paulo: "O camarão, como outros artrópodes, tem um esqueleto externo. A parte muscular, de dentro, cresce e a 'casa' vai ficando apertada, aí ele precisa trocá-la. No início, ela é fina e flexível. É a tal da casca mole".

Eureka! O cozinheiro tinha nas mãos era "o novo siri mole". Em vez de servi-lo em moqueca ou à dorê, empanou como um tempurá, salpicou uma maionese apimentada e um pouco de pó de alga. Apaixonou-se.

Processo de fritura do tempurá de camarão mole do restaurante Madê, em Santos. FOTO ALEX SILVA/ESTADAO
Foto: ALEX SILVA/ESTADAO / Estadão

No Madê, Dário destaca peixes e frutos do mar em pratos autorais, inspirados em clássicos da gastronomia: "Não posso abrir mão de atum e bacalhau, mas coloco o máximo possível de espécies desvalorizadas, como parapeba e roncador. O camarão mole segue a mesma filosofia".

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O crustáceo em questão ainda acompanha um kimchi de pupunha. Vem depois do temaki de peixe do dia (que pode ter bagre tratado como unagui, a enguia à moda japonesa) e do sonho de polvo P, outra espécie menosprezada pela pesca no Brasil.

O camarão com casca e tudo é seguido pelo tuna wellington. Sem alardes, vez por outra, o santista aproveita a massa folhada para envolver xaréu e carapau ao invés do atum que nomeia o prato: "Depois eu conto, mas ninguém nunca percebeu e nem reclamou".

O fish wellington é uma marca de seu primeiro restaurante e vem banhado com um molhinho denso e divertido de catuaba. Atualmente, finaliza a parte salgada do menu de aniversário de 11 tempos (R$ 300 ou R$ 456 se harmonizado com vinhos de pequenos produtores nacionais).

Com kimchi de pupunha, maionese picante e cebolinha, Dário Costa finaliza o camarão mole. FOTO ALEX SILVA/ESTADAO
Foto: ALEX SILVA/ESTADAO / Estadão

Mais do que ser o único jeito de provar o camarãozão ainda desconhecido, o cardápio comemorativo aponta a preocupação ambiental de Dário: "Longe do romantismo da pesca artesanal, o mercado são traineiras e camaroeiros, não barquinhos. Eles não se importam se o peixe amassa, porque para vender filé tanto faz. Usar o que é menosprezado, que é a maior parte do que vem nas redes, é uma maneira de manter o ecossistema".

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Contando com o seu outro restaurante na cidade de Santos, o Paru, Dário consome duas toneladas de pescados por mês, o que pula para quase dez durante o verão. Sem contar as duas casas em São Paulo (Deus Ex-Machina e Churrascada do Ma) e a caçula em Fernando de Noronha (Benedita).

À frente de cinco restaurantes, o chef Dário Costa comemora 6 anos do Madê com menu degustação que inclui o camarão mole. FOTO ALEX SILVA/ESTADAO
Foto: ALEX SILVA/ESTADAO / Estadão

Mergulhado nesse mar, o cozinheiro "foge do romance". Compra camarão-rosa, com casca dura ou mole, apenas na Franzese - e não simplesmente para sustentar um negócio familiar: "Eles usam 0,01 grama de sulfito por 10 quilos de camarão selvagem, só para ele não queimar no congelamento. Com medo de perder o produto, muita gente enche de sulfito sem dó e boa parte das alergias vêm vem disso".

À parte a compra consciente, de quebra, o cozinheiro faz uma bela economia e paga pelo crustáceo recém-descoberto quase um terço do preço do camarão-rosa convencional.

Madê

R. Minas Gerais, 93, Boqueirão. Ter. a qui., das 12h às 22h30; sex. e sáb., das 12h às 23h; dom., das 12h às 17h. Reservas: (13) 99115-1913

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