Junho marca os 33 anos (data cabalista por excelência) do falecimento de Jorge Luis Borges. Grande mestre, cego, vidente. De todas as lições que dele se pode assimilar, uma impressiona demasiado: a fascinação do sábio lúcido que, apesar do impedimento da cegueira (bloqueio físico e material), conseguiu ver melhor (com o agudo olho do Espírito).
Arquétipo representado idealmente no retrato de Aristóteles feito pelo pintor holandês Rembrandt (Museu Metropolitano de Nova Iorque): o grande filósofo, pesquisador da natureza e da sociedade, educador de Alexandre, o mais poderoso dos homens, pousa a mão em devoção, assumindo que há muitas e mais coisas além de sua “vã filosofia”, num busto de Homero, o poeta cego, errante.
Os olhos intactos de Aristóteles, cheios de melancolia, compreenderam que, na dimensão humana-visível em que se encontra (dimensão racional-filosófica) – coberto pela riqueza dos mais finos tecidos, véus brancos, brilho do ouro e das pedras preciosas – não se pode ascender ao patamar eterno-transcendente (dimensão poético-religiosa) do mármore branco que cristaliza a figura do poeta cego, liberto de toda vaidade, coberto (em oposição) pelo simples dos mantos, modesto e perfeito.
Esse contraste brutal pintado por Rembrandt ecoa na obra e nos ensinamentos de Borges. A questão do que se pode e não se pode ver, a questão do aqui e do além. Possuímos o mundo através de cinco sentidos, destes a visão se destaca como principal, do qual mais dependemos. Porém, a imensa maioria de nós, vai ensinar Borges – justo ele que era cego, ou, justo ele porque era cego? –, não se vê, não vê muito o outro e, menos ainda, vê o Universo.
Borges concorda com os hindus: uma das mais elevadas qualidades mentais é a Ekagrata, a Atenção. Mais do que a visão, a Atenção carrega o senso agudo, a medida matemática da beleza e da admiração, da importância e do valor dos homens e dos seres.
Incapaz de ver, Borges desenvolveu uma sabedoria de sentido mais amplo de mundo. Com seu olhar interior, além das limitações oculares, Borges vai falar em seus livros de uma perspectiva que vai além do visionário. Desenvolvendo uma peculiar clarividência, encontra outra harmonia, menos banal e mais vibrante do que a nossa – do fantástico, do sobrenatural, da magia. Uma harmonia (sem visão, mas com atenção; sem olhar, mas com vidência) na qual inicio e fim se fazem de partes e todo, de nada e pleno.
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