De silêncio e recolhimento, costumeiramente cinza e chuvoso, chega o dia dos mortos. Minha mãe lembrava que os trens deixavam de apitar. Mas não é assim em toda parte.
No México, comendo gulosamente caveirinhas de açúcar, fantasiados divertidamente de esqueletos macabros, todos dançam e ululam: verdadeiro Carnaval para eles. Gosto da proposta. Agrada-me essa coragem para celebrar algo que, em geral, tememos fortemente. Sem dissimulação ou tentativa de engano, os mexicanos — com sua postura alegre nessa data — aceitam que mortais é o que somos e o que nos dilacera.
Também é o que dá à vida seu preço mais elevado. Se não morrêssemos, se o viver não se destacasse do fundo escuro da morte, seria tão radiante? Rara? Perturbadora? Importante caminho: pensar a morte para amar melhor a vida, como ela é, frágil e passageira.
Viver é combater, resistir, sobreviver, e ninguém pode fazê-lo indefinidamente. No fim, é preciso morrer, única conclusão que nos é prometida. O adágio latino é correto: se queres ser capaz de suportar a vida, estás pronto para aceitar a morte.
A fórmula cultural mexicana parece afastar claramente o luto da questão. Mais do que chorar ou lamentar os mortos, os irmãos de raiz asteca comemoram. Estão certos. Como não celebrar o que é — para toda comemoração, toda vida — o horizonte último?
Vamos refletir um instante: é preciso acolher a morte como objeto necessário. Se não fosse ela, cada momento da vida teria o mesmo sabor. É o enigma derradeiro que torna misteriosa nossa vida e nos torna humanos ou, na palavra que os gregos empregavam para nos designar: “mortais” — os que vão morrer.
Epicuro, grande sábio, compreendeu claramente que toda a nossa vida depende da morte. Ele ensinava: “contra todas as outras coisas é possível obter a segurança; mas, por causa da morte, todos nós, os mortais (podemos entender, os homens), habitamos uma cidade sem muralhas”.
Não sei se concordo por inteiro. Há sim uma possibilidade de defesa diante desse pleno desafio. Nós que acreditamos em algo depois da morte, pensamos e vivemos de maneira diferente de quem não acredita. Para nós, espiritualistas, a morte é o começo da vida verdadeira, o que nunca dispensou ninguém de morrer, mas esclareceu muita gente de antemão sobre o que morrer significa.
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