Saudades: anseio de melancolia por algo belo que passou

23 set 2017 - 10h00

Do nada você se pega caminhando pelo bairro da cidade em que viveu na adolescência. Segue por ruas e quarteirões não visitados há muito tempo. Passa pela casa daquela garota, a namorada de quando tinha dezesseis anos. Vista de fora, tudo parece igual – mesmo com outras pessoas morando lá. Os pais estão aposentados. Ela casada com dois filhos, vivendo em outra cidade.

Foto: aquatti / iStock

Sem querer, rápido, você se vê engolido por uma onda de sentimentos e afetos. Uma nostalgia profunda por tudo que era mas já não é mais. A falta sentida, meio agridoce, não é tento da garota, mas mais de quem você era, do que importava naquela altura. Não tanto do que se tinha (era tão pouco), mas mais do que se aspirava e sonhava.

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Também surge uma falta, difusa, elusiva, escorregadia, de como as coisas eram, de como vocês se entendiam como casal, dos planos ingênuos que agora, no presente, ganham relevo e importância justamente por serem ingênuos. Os planos em si, abandonados; a legitima autenticidade deles, daquele longínquo momento em que foram combinados, forte e presente como um farol de orientação no escuro da vida.

Apesar de ser intensamente desconcertante, é difícil explicar o que são esses sentimentos, esses fluxos de memórias, ternuras e sofrimentos. Por um segundo você fica perdido. A carga de emoções acaba desconcertando o cotidiano, você sequer sabe se têm seus trinta e seis ou os dezesseis anos de então; se tem aquele emprego no escritório ou se vai toda manhã para a escola logo ali na outra esquina.

Pelo menos nós, que empregamos como língua mãe o Português – com seu “arrolo da ternura” (Bilac) – temos a palavra ideal à mão, basta simplesmente dizer que se trata de “saudades”.

“Saudades”: esta palavra, corda doce da lira, não tendo tradução direta em nenhum idioma, carrega o anseio repleto de melancolia por algo belo que passou. Uma tarde na infância, uma casa, um ente querido, uma amizade, um sabor, uma paisagem, uns olhos...

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Sua beleza está no misto de dor pela perda e prazer por outrora termos sido agraciados com acontecimentos na nossa vida. A sensação evocada é o que mais perto podemos chegar de uma vivência espiritualizada, sem o filtro da racionalidade.

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Fonte: Marina Gold
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