Infância açucarada e premium? Sim, temos!

18 out 2018 - 15h47
(atualizado em 19/10/2018 às 18h14)
Foto: Mãe com Prosa

Outro dia estava na internet reservando um horário para as minhas filhas brincarem num parque de trampolins. Aí vi que precisava comprar meias antiderrapantes, quando  percebi que elas eram anunciadas como meias "premium". Oi? Meia vip? Até agora estou sem compreender o que significa uma meia "premium". Você sabe?

Fora o óbvio de que, colocar um sobrenome bonito num produto fazer com que ele imediatamente custe o dobro, fiquei refletindo por que razão temos gourmetizado a infância dos nossos filhos. E aqui me incluo totalmente, gente!

Leva pra restaurante que tem menu só pra eles

Produz festa que tem monitor só pra eles

Vai para as férias onde tem programação só pra eles

Fecha lugares, distribui pulseirinhas, cria uma atmosfera de exclusividade porque tudo tem de ser só pra eles….

Fico aqui pensando qual é o custo disso? E não me refiro ao financeiro…

Eles sempre terão tratamento especial na vida? Todos os momentos sempre serão uma experiência incrível, tipo um filme 4D com efeitos especiais e emoção?

Claro que hoje a gente vive num tempo com um bilhão de possibilidades, claro que é mega tentador oferecer coisas totalmente personalizadas, desenhadas e talhadas para que a infância deles seja absolutamente perfeita, mas….

Aí eu me lembrei de que outro dia as minhas filhas foram numa excursão na Sala São Paulo para assistir a um concerto. Nossa, fiquei muito feliz com a notícia de que Elisa e Manu poderiam voltar à sala mais linda que temos por aqui e, de quebra, ouvir musica de qualidade regida por uma mãe da escola. Que privilégio, gente!

Só que o maior privilégio que elas tiveram, eu soube depois. Como de costume, pensei que seria um espetáculo fechado para a escola, algo "só para a turma"ou talvez aberto a outras classes só da escola delas. Mas quando fui buscá-las soube que elas eram duas das mais de mil crianças ali, a maioria com realidades infinitamente diferentes da realidade das minhas meninas.

Eram crianças da rede pública, crianças com necessidades especiais, crianças de todo tipo e de todos os universos, juntas, misturadas mesmo, unidas pela chance de apreciar a arte de uma música clássica.

Confesso que quando soube disso fiquei alguns segundos apreensiva pensando se elas tinham visto algo que não estavam acostumadas, passado por alguma situação desconfortável, ouvido o que não deviam ou coisa assim.

Sim, elas viram mendigos no trajeto do passeio, alunos com limitações neurológicas, foram chamadas de filhinhas de papai porque estudam em escola particular e só puderam embarcar de volta quando outros 15 ônibus haviam partido.

Elisa e Manu viram beleza, diversidade, cultivaram a paciência e aprenderam que o mundo vai além do universo delas.

E eu? Eu vi que não consigo e nem preciso poupar tanto assim as minhas meninas. Elas vão sofrer, vão ficar tristes, vão conviver, vão esperar, vão se frustar e aprender que a gente não vive exclusivamente de alegria e nem tristeza. Ainda bem!

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