"Eternamente jovem, eu quero ser eternamente jovem (…)" cantou a banda Alphaville no hit de 1984, Forever Young. Mas, embora a juventude seja cada vez mais glorificada na nossa cultura, desde em coisas aparentemente inofensivas, como filtros de Instagram, até comportamentos devastadores como o famoso etarismo (preconceito contra pessoas mais velhas, que inclusive ocasiona na exclusão dos mais experientes do mercado de trabalho), a cada dia mais, parecer jovem é parecer melhor… mas será mesmo? A Mente Afiada conversou com Amanda Rangel, psicóloga e CEO da Clínica Espaço Neuropulsar. Falamos sobre os problemas escondidos por trás da adolescência tardia, aquelas pessoas que simplesmente não conseguem assumir responsabilidades e agir como adultas.
Não é sobre seus gostos
Sim, essa matéria está aqui para te dizer que não necessariamente há problemas na sua forma de se vestir. Nem nas músicas e filmes que você gosta. Todo mundo conhece alguém que, por algum motivo (desde gravidez na adolescência, até a necessidade de trabalhar, ou mesmo a exposição precoce ao preconceito familiar, comum entre pessoas LGBTQIA+), precisou amadurecer cedo e agora pode estar querendo 'curtir' o que não viveu lá atrás. Isso pode até ser um resgate saudável, na verdade. O problema começa quando uma pessoa acima dos 24 anos de idade (ou seja, com o cérebro já bem desenvolvido, teoricamente), independente dos motivos, passa a negligenciar as responsabilidades da vida adulta.
"A adolescência tardia significa, na verdade, que a pessoa está tendo uma série de comportamentos tóxicos que não condizem com a idade dela. É um indivíduo que não aceitará nenhuma crítica, por exemplo, porque o papel de vítima sempre será mais confortável", afirma Amanda.
Por que isso acontece?
Os motivos podem ser diversos, segundo a profissional. "Acredito que parte da culpa é da cultura moderna, que valoriza o imediatismo, isso acaba incentivando comportamentos imaturos. Outro fator de risco são pessoas vindas de famílias superprotetoras. Se os pais sempre resolvem os problemas que seus filhos têm, eles perdem boa parte de sua capacidade de autonomia no futuro", alerta.
Outras razões são os transtornos psicológicos, que a especialista aponta como um dos responsáveis por prejuízos na capacidade de lidar com responsabilidades. Vale lembrar que a geração Z, dos nascidos entre 1995 e 2010, é uma das mais deprimidas e ansiosas da história em comparação com as gerações anteriores, segundo um estudo compilado pela Healthtech Vittude em 2023. "Além disso, há a falta de autoconhecimento. Muitos adultos não têm uma percepção clara de si mesmos e de suas responsabilidades, o que atrasa o amadurecimento emocional", explica.
Quais são os sinais de uma adolescência tardia?
Amanda listou alguns comportamentos e sentimentos que podem ajudar a identificar quando a falta de maturidade está se tornando nociva para cada um:
- Fuga de responsabilidades: A pessoa tende a evitar compromissos sérios, como trabalho estável, cuidar da casa ou tomar decisões importantes, deixando que outros assumam essas responsabilidades.
- Dificuldade em lidar com frustrações: Ao invés de enfrentar problemas, a pessoa tende a reagir de maneira explosiva, se vitimizando ou evitando confrontos, demonstrando incapacidade de administrar emoções negativas.
- Dependência emocional: Busca constante de aprovação ou apoio dos outros para tomar decisões ou validar seus sentimentos, mostrando falta de autonomia emocional.
- Procrastinação excessiva: Deixar de lado tarefas importantes ou adiar decisões necessárias de forma recorrente, causando prejuízos pessoais e profissionais.
- Comportamentos impulsivos: Agir sem pensar nas consequências, muitas vezes guiado por emoções imediatas, como gastar dinheiro irresponsavelmente, pular de emprego em emprego ou tomar decisões repentinas em relacionamentos.
- Manutenção de padrões imaturos em relacionamentos: Relacionamentos instáveis ou baseados em dinâmicas dependentes, evitando a construção de laços profundos.
- Falta de planejamento para o futuro: Incapacidade de pensar a longo prazo ou tomar decisões que garantam estabilidade, seja financeira, profissional ou emocional. (BOX)
Quais os riscos da adolescência tardia?
Por mais óbvio que seja, o maior risco que um adolescente tardio enfrenta é o de não amadurecer. "A imaturidade pode impactar negativamente na carreira, seja pela dificuldade de lidar com críticas, seja pela falta de responsabilidade. Os relacionamentos também são prejudicados, já que há uma dificuldade em formar laços profundos. E além disso, há a sensação crônica de vazio, já que a pessoa não toma o controle de sua própria história", explica a profissional.
E a solução?
O caminho é aquele conhecido de sempre: buscar o autoconhecimento por meio da psicoterapia, de preferência com abordagem centrada no desenvolvimento de habilidades sociais e emocionais, como a autorregulação, empatia e comunicação. "E será preciso frequentar as sessões de coração aberto, já que normalmente, um adolescente tardio não reconhece suas responsabilidades, e isso atrasa o desenvolvimento terapêutico. Por mais que inicialmente possa ser desconfortável, as consequências de se levar uma vida sem assumir controle por suas próprias ações são muito piores a longo prazo", finaliza a psicóloga.