O texto retrata a situação de São Paulo, no que diz respeito à dengue, mencionando falhas na prevenção pela administração de Ricardo Nunes, como armadilhas para o mosquito e o custo alto de repelentes, além do baixo investimento na vigilância em saúde.
Passei os últimos quatro dias congelando, assando, insone, estúpido, suarento, paralisado, dolorido, diarreico. Dei uma melhoradinha, vim aqui vomitar meu mal-estar. Vem mais por aí.
Como peguei? Na minha casa temos redinha em todas as janelas, botamos sal nas plantas etc. Somos fanáticos do repelente, porque nosso filho pegou dengue anos atrás, e a segunda tem chance de vir hemorrágica.
Um tubo de repelente bem normalzinho sai R$ 35 reais, 100 ml. O top master, R$ 182,00. Inacessíveis ambos pra maioria das famílias brasileiras. Devia ser distribuído grátis no SUS (junto com esses elétricos de tomada, mosquiteiro, redinha etc.). Mas os governos federal e estaduais estão fazendo um trabalho medíocre com a dengue, pra dizer o mínimo.
Não tão cansados de saber que existe um troço chamado Aquecimento Global, e quanto mais calor, mais Aedes? Não dava pra ter planejado pra essa previsibilíssima explosão da dengue em 2024? A temperatura vai continuar aumentando, ano após anos. Fora a novela da vacina.
Recomendo a você o investimento num repelente hardcore, se puderes bancar, e faça figa, ou reze pedindo proteção para sua divindade de preferência. Dengue é horrível. Não me acomodo em posição nenhuma. Não consegui trabalhar nada esses dias, sorte que não sou Uber ou marreteiro, imagine quantas pessoas estão doentes e sem receita neste momento.
Mas com toda inoperância letal do governo federal, boto minha dengue diretamente na conta do prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes. Por três razões.
Primeiro porque a vinte metros da minha casa tem uma pracinha. Ela está abandonada faz séculos, mato alto, lixo, focos de dengue à beça. É responsabilidade da prefeitura.
Como é fiscalizar fortemente as construções que pipocam por toda São Paulo. Na minha rua está subindo um arranha céu breguésimo chamado Eleva Harmonia. Uma vizinha nossa conseguiu tirar fotos por cima do tapume. Um monte de focos de dengue. Reclamamos com a construtora, a You Inc. Resposta gentil, providências zero. Idem na subprefeitura.
Se na Vila Madalena o esculhambo é desse porte, imagine na periferia, onde mora a maioria dos paulistanos. Quando o ambiente que a gente vive não é cuidado e fiscalizado direito pela prefeitura, não tem redinha e repelente que te garanta.
Donde que morreram 49 pessoas de dengue em São Paulo esse ano. Já foram notificados quase 150 mil casos. Números oficiais, os reais devem ser maiores. São milhões de horas de sofrimento desnecessário, na cidade mais rica do Brasil.
São Paulo tem um orçamento gigante. Ele vem sendo muito usado em obras sem licitação, geralmente executadas por construtoras pra lá de suspeitas.
Segunda razão porque boto minha dengue na conta do prefeito: ele assinou um contrato de R$ 19 milhões com empresa de um cara que é diretor de uma associação que ele próprio, Nunes, preside. É para fornecer armadilhas para o mosquito. O contrato tem todo perfume de superfaturamento: cada armadilha saiu R$ 400, sendo que se comprada da Fiocruz sairia por R$ 10.
E as armadilhas, sem manutenção, tornaram-se criadouros do Aedes. Sério, são R$ 19 milhões de dinheiro público para o brother do Nunes, e o resultado é aumentar a dengue na cidade. Tudo explicadinho nesta reportagem da Agência Pública.
Finalmente: em seu mandato, Nunes destinou em média 40% a menos que a gestão Haddad nos recursos para a vigilância em saúde, que inclui o controle do mosquito. Clássico estilo bozonóide de lidar com crises sanitárias, faltou só o Pazuello.
Resultado: na maioria dos estados, inclusive no de São Paulo, a dengue está estável. Muita gente ainda vai pegar, sofrer e morrer, mas o pico parece ter sido ultrapassado. Já na cidade de São Paulo, o número de casos continua crescendo.
Não sei muito o que fazer fora cuspir minha raiva aqui e fazer força pra derrotar essa bandalheira assassina na próxima eleição, em outubro. E torço, com muita maldade no coração, para que Ricardo Nunes ainda passe o que estou passando.
Assista ao vídeo com o comentário de André Forastieri.
(*) André Forastieri é jornalista e empreendedor, fundador de Homework e da agência de conteúdo e conexão Compasso, e mentor de profissionais e executivos. Saiba mais em andreforastieri.com.br.