"Eu estava em uma festa quando um amigo me deu uma (pílula)", lembra Kristello, rapper inglês de 19 anos, sobre a primeira vez que tomou Xanax. Esse é o nome usado na Europa para o medicamento Alprazolam, prescrito para tratar ansiedade. Mas há quem consuma o remédio ilegalmente, como droga recreativa, comprada de forma clandestina e combinada com outros medicamentos.
Kristello conta que a experiência com o Xanax logo se converteu em um hábito diário. Toda noite, ele tomava uma pílula. "A sensação era como se eu estivesse flutuando e qualquer preocupação desaparecesse", afirmou. "Mas, quando você para de tomar o Xanax, é quando o problema começa". O rapper teve problemas para dormir, dores de estômago, suores frios e paranoia extrema.
"Pode ser péssimo para sua saúde mental", conta Kristello. "Você pode perder o discernimento ou a memória. A memória de longo prazo também pode ser afetada".
Especialistas do Reino Unido dizem que, apesar das advertências, o uso de Xanax falsificado aparentemente está crescendo no país, ainda que não existam números disponíveis para saber exatamente quanto.
"As pessoas compram coisas pela internet e não têm garantia do que recebem. Os componentes podem mudar de uma droga para outra, por isso estão brincando com a morte, porque essas coisas são perigosas", fala Rosanna O'Connor, diretora da divisão de Álcool, Drogas e Tabaco da Diretoria de Saúde e Bem-Estar do serviço de saúde pública da Inglaterra.
A Pfizer, fabricante de Xanax como medicamento receitado, declarou estar "alarmada" pelo aumento de versões falsificadas do produto. Segundo o laboratório, algumas das pílulas falsificadas contêm ácido, metais pesados e até cera para pisos.
No Brasil, o Alprazolam é um medicamento de tarja preta, vendido apenas com prescrição médica, não disponível no SUS. Os usos aprovados pela Anvisa são para tratamento do distúrbio de ansiedade e tratamento de transtorno de pânico.
Combinação letal
O medicamento foi exaltado por artistas de hip hop e frequentemente aparece nas letras de suas músicas. Em novembro de 2017, o rapper americano Lil Peep foi encontrado morto, depois de sofrer uma overdose de Xanax e Fentanil, um potente analgésico sintético. É uma combinação letal, segundo autoridades de saúde.
Os usuários correm o risco de ingerir essa combinação quando compram o remédio falsificado pela internet ou de vendedores nas ruas, sem garantia do que estão usando. "O perigo que temos aqui é que os jovens que estão acostumados a tomar o medicamento (Xanax) acreditam que sabem o que estão fazendo", afirma Tony Saggers, ex-funcionário da Agência Nacional de Crime do Reino Unido.
Festas Xanax
"Estas são duas pílulas de Xanax. Gastei 5 libras em ambas", contou Kieran, de 18 anos. Cerca de duas vezes por mês, uma sexta-feira ou sábado à noite, este jovem e seus amigos se reúnem para uma "festa Xanax" em seu apartamento em Dudley, no Reino Unido.
Em uma dessas festas, havia 12 pessoas circulando por sua sala de estar. Algumas jogavam o videogame PlayStation ou bebiam álcool. Outros misturavam Xanax com outras drogas ilegais.
"A melhor maneira de descrever o efeito é que você se sente como um marshmallow. É uma droga que te relaxa", fala o amigo de Kieran, Jordan, também de 18 anos.
Ambos dizem ter tomado Xanax falsificado acidentalmente, combinado com Fentanil, no ano passado. Se misturam as pílulas com álcool, é ainda mais perigoso.
"Me sinto sonolento. Me sinto como uma nuvem. Me sinto cômodo", diz, Jordan, 20 minutos depois.
Ao serem questionados sobre os perigos potenciais a que estão expostos, os dois jovens dizem que estão conscientes dos perigos, mas que decidem assumir o risco. "Acredito que, às vezes, deixamos passar (as advertências), realmente não pensamos sobre isso. Na imprensa vemos que há gente que morre, mas na realidade isso não parece nos preocupar nem um pouco", afirma Jordan.
Veja também