Em relatório divulgado nesta quinta-feira (13), a organização de direitos humanos Human Rights Watch (HRW) afirmou que as condições precárias de saneamento e água que contribuíram para um surto do vírus zika persistem no Brasil e deixam o país vulnerável a uma nova epidemia do vírus.
O documento, intitulado "Desprezadas e desprotegidas: o impacto do surto do vírus zika em mulheres e meninas no Nordeste do Brasil", apresenta lacunas nas respostas dadas pelas autoridades brasileiras perante a proliferação da doença.
Segundo a ONG, apesar de o governo brasileiro ter declarado o fim do estado de emergência nacional de saúde pública em maio de 2017, 18 meses após a declaração de emergência nacional, a infecção ainda ameaça o país.
"Os brasileiros podem ver a declaração do Ministério da Saúde sobre o fim da emergência de zika como uma vitória, mas riscos significativos permanecem, assim como as questões de direitos humanos subjacentes que foram expostas", disse Amanda Klasing, investigadora dos direitos das mulheres da HRW.
"Os direitos básicos dos brasileiros estão em risco se o governo não reduzir a infestação do mosquito [Aedes aegypti] no longo prazo, garantindo o acesso aos direitos reprodutivos e apoio às famílias que criam crianças afetadas pelo zika", salientou.
A HRW avaliou que doença não foi contida no curto prazo e ainda é um risco porque o Brasil adota políticas negligentes há anos em relação à oferta de saneamento básico, fator que permitiu a proliferação e a rápida disseminação da doença.
"As autoridades brasileiras devem fazer investimentos há muito atrasados em infraestruturas de água e saneamento para controlar a reprodução dos mosquitos e, assim, melhorar as condições de saúde pública", considera a HRW.
Mais de um terço dos 206 milhões de habitantes no Brasil não têm acesso a um abastecimento contínuo de água, obrigando os residentes com poucas opções senão encher recipientes para uso doméstico. Sem cobri-los, esses recipientes podem se tornar locais de reprodução para o Aedes aegypti. No nordeste, menos de 25% da população estava conectada a sistemas de águas residuais em 2015, segundo a HRW.
Desde que a doença foi detectada no Brasil em 2015, mais de 2.600 crianças nasceram com microcefalia e outros problemas neurológicos causados pela infecção. Em 2017, o número de casos de vírus zika e de bebês nascidos com deficiências ligadas à doença caiu drasticamente em relação a 2016, mas as autoridades brasileiras não conseguiram identificar a causa exata dessa redução.
Atendimento a mulheres e aborto
Para fazer o relatório, a HRW entrevistou 183 pessoas em Pernambuco e Paraíba, os dois estados brasileiros mais atingidos pela doença, incluindo 98 mulheres e meninas com idades entre 15 e 63 anos. A ONG também falou com homens e meninos das comunidades afetadas, prestadores de serviços, especialistas e autoridades governamentais.
Nessas entrevistas, os investigadores da HRW constataram que muitas mulheres grávidas e meninas não receberam informações abrangentes sobre a prevenção da transmissão do vírus durante as consultas pré-natais.
"Muitos [profissionais de saúde] não informaram que o vírus zika pode ser transmitido sexualmente, em parte devido a informações contraditórias ou inconsistentes que receberam das autoridades. Como resultado, poucas [mulheres] utilizavam consistentemente preservativos para proteger o feto da transmissão da doença", destacou o relatório.
A ONG recomendou que o Brasil reforce os serviços de saúde voltados para atender mulheres e meninas, descriminalize o aborto e garanta que crianças afetadas pelo zika tenham acesso a serviços especializados de saúde que lhes garantam maior qualidade de vida.