Bruno Covas na UTI: o que se sabe sobre o câncer contra o qual prefeito de São Paulo luta

O prefeito de São Paulo pediu afastamento de 30 dias do cargo para se dedicar ao tratamento e à recuperação. Entenda o estágio da doença e como ela evoluiu desde que foi diagnosticada.

4 mai 2021 - 06h25
(atualizado às 07h31)
Bruno Covas teve o tumor na junção entre o esôfago e o estômago diagnosticado em outubro de 2019
Bruno Covas teve o tumor na junção entre o esôfago e o estômago diagnosticado em outubro de 2019
Foto: Governo do Estado de São Paulo / BBC News Brasil

No último domingo (02/05), o prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), anunciou que se licenciaria temporariamente do cargo para dedicar-se ao tratamento de um câncer.

Nas redes sociais, Covas publicou uma carta explicando os motivos e agradecendo o apoio e o carinho que vem recebendo:

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"Nesse momento, com toda a força e foco que preciso colocar na minha saúde, fica incompatível o exercício responsável de minhas funções como Prefeito de São Paulo. Por isso, vou solicitar à Câmara de Vereadores uma licença do cargo pelo período de 30 dias para me dedicar integralmente à minha recuperação."

O caso é tratado pela equipe de médicos do Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, que divulgou um boletim com as últimas informações sobre o estado de saúde do prefeito.

Segundo o texto, Covas passou por exames de sangue, de imagem e por uma endoscopia nas últimas horas.

Os resultados mostraram a presença de um sangramento na região entre o esôfago e o estômago, local onde o tumor surgiu.

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O prefeito precisou ser encaminhado para a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do hospital e foi entubado para receber "as medidas adequadas de suporte clínico".

A origem do problema

O diagnóstico da doença foi feito em outubro de 2019, quando os médicos concluíram que Covas tinha um adenocarcinoma na região de transição entre o esôfago e o estômago.

"O nome adenocarcinoma significa que o tumor vem de glândulas que estão localizadas nos pulmões, nos intestinos, no estômago, no pâncreas…", explica a oncologista clínica Maria Ignez Braghiroli, coordenadora do Comitê de Tumores Gastrointestinais da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica.

O diagnóstico depende de exames de laboratório, da endoscopia e da biópsia, que envolve retirar um pedacinho da região afetada para uma análise feita por patologistas.

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O tumor de Covas, infelizmente, já estava num estágio de metástase, que acontece quando as células cancerosas saem do local de origem e se instalam em outras partes do corpo.

No caso do prefeito, a enfermidade havia se espalhado para o fígado e o sistema linfático, uma rede de vasos importantíssima para o funcionamento do sistema imunológico.

De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (Inca), tumores no sistema digestivo estão entre os mais frequentes na população brasileira: todos os anos, mais de 11 mil pessoas são diagnosticadas no país com câncer de esôfago e 8,7 mil delas morrem em decorrência deste problema.

Já no câncer de estômago, são 21 mil casos e 15 mil mortes por ano.

Segundo a oncologista Renata D'Alpino, coordenadora do Grupo de Tumores Gastrointestinais e Neuroendócrinos da Oncoclínicas, não há muitos fatores de risco conhecidos para o desenvolvimento deste problema na região entre o esôfago e o estômago, como aconteceu com Covas.

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"De forma geral, o principal fator de risco é o refluxo gastroesofágico, que costuma acometer com mais frequência pacientes obesos e sedentários", explica a médica.

O refluxo gastroesofágico é marcado pelo "retorno" de parte da comida e de ácido do estômago para o esôfago, o que provoca irritações e lesões na camada interna deste órgão.

Os especialistas ouvidos pela BBC News Brasil observam, inclusive, um aumento no número de casos de tumores gástricos nos últimos anos e suspeitam que isso tenha algo a ver com mudanças no estilo de vida.

Vale ressaltar, no entanto, que essas são informações genéricas e não se sabe se o prefeito sofria de refluxo ou se o câncer que ele desenvolveu tem realmente algo a ver com isso.

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Tentativas de controle

Após o diagnóstico, Covas foi submetido a sessões de quimioterapia, uma das alternativas terapêuticas mais utilizadas na oncologia.

"Em resumo, esses remédios danificam o DNA de células que se replicam mais rápido no corpo. O objetivo é destruir justamente as células do tumor", conta D'Alpino.

Geralmente, os médicos utilizam dois ou até três tipos de remédios dessa classe farmacológica para ampliar o efeito e diminuir o tamanho das lesões.

O câncer de Covas se desenvolveu na junção entre esôfago e estômago, no sistema digestivo. No detalhe à direita, é possível observar onde os dois órgãos (esôfago na parte superior e estômago na porção inferior) se unem
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

E foi justamente isso que aconteceu com o prefeito paulista: após quatro meses de tratamento, houve uma diminuição considerável da doença em seu local de origem (na fronteira entre esôfago e estômago) e na metástase que acometia o fígado.

O quadro, porém, permaneceu inalterado e preocupante no sistema linfático.

Foi aí que os especialistas decidiram apelar para um outro tipo de tratamento: a imunoterapia.

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Com pouco mais de dez anos de existência, esses remédios revolucionaram a oncologia e conseguiram ampliar consideravelmente a expectativa de vida de muitos pacientes.

Ao contrário das demais ferramentas, os imunoterápicos estimulam as próprias células de defesa do organismo a atacar o tumor.

"Não são todos os tipos de câncer que respondem bem à imunoterapia e sempre precisamos fazer uma série de análises para saber se o paciente vai ter algum benefício com essa opção", pondera D'Alpino.

Pelo que se sabe, Covas tinha as condições de receber esses fármacos: tanto que, em abril de 2020, as lesões no organismo dele pareciam estar bem controladas.

O prefeito conseguiu permanecer no cargo, apesar de todas as exigências e demandas da pandemia de covid-19.

Entre outubro e novembro de 2020, ele até participou ativamente da campanha eleitoral e venceu a disputa para permanecer à frente da capital paulista em mais um mandato.

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Passos para trás

Em fevereiro de 2021, porém, o quadro teve uma recaída: Covas precisou passar por uma nova rodada de quimioterapia para combater um nódulo que havia sido detectado em seu fígado.

Segundo D'Alpino, esse tipo de evolução é esperada quando o diagnóstico da doença ocorre num estágio mais avançado.

"No câncer metastático, é difícil pensar em cura. Por um tempo, o tratamento pode até controlar. Mas chega um momento em que as próprias células cancerosas se tornam resistentes e não são mais afetadas pelos remédios", descreve.

No último mês de abril, o quadro regrediu mais um pouco: novos focos do tumor foram encontrados no fígado e nos ossos.

A situação fez os especialistas modificarem o esquema terapêutico: se antes eles usaram primeiro a quimioterapia e só depois a imuno, agora vão utilizar as duas opções juntas, ao mesmo tempo.

"Essa é uma tentativa que tem se mostrado promissora nos estudos e busca trazer uma melhor resposta e um controle da doença", interpreta Braghiroli.

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Foram justamente essas sessões de tratamento que levaram o prefeito a pedir o afastamento temporário do cargo para dedicar-se à recuperação durante este mês de maio.

Porém, o agravamento do quadro nas últimas horas, com o aparecimento de sangramento e necessidade de internação em UTI e intubação, inviabiliza por ora a realização das terapias medicamentosas contra o câncer.

"O tumor na região do estômago é como se fosse uma ferida aberta. Se ela estiver descontrolada, isso leva a sangramentos", contextualiza Braghiroli.

Covas precisará desse cuidado intensivo pelos próximos dias para que consiga se recuperar e, assim, possa continuar o tratamento contra os tumores.

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