O presidente do Instituto Butantã afirmou em coletiva de imprensa nesta terça-feira, 10, que o "evento adverso grave" observado em um voluntário brasileiro da Coronavac não teve nenhuma relação com os testes do imunizante. "O evento adverso foi analisado e não teve relação com a vacina. E essa informação está de posse da Anvisa desde o dia 6", disse Dimas Covas.
Covas e membros do governo estadual afirmaram estar chocados e indignados com a decisão da Anvisa em paralisar o estudo. O Instituto afirmou ainda que não pode divulgar detalhes sobre o evento adverso por regras de sigilo. A única informação divulgada é que o voluntário era do centro de estudo do Hospital das Clínicas da USP.
De acordo com comunicado divulgado pelo infectologista Esper Kallás, principal pesquisador do estudo, a equipe de investigadores fizeram análises criteriosas sobre o ocorrido e também concluiu que o evento não está relacionado à vacina em teste. "Fomentar esse descrédito gratuito a troco de quê?", questionou o presidente do Butantan. "Mesmo com posse desses dados, a Anvisa nos avisou às 20h40, marcando uma reunião para hoje de manhã e avisando sobre a suspensão do estudo. Uma decisão que causa medo e incerteza."
O Instituto afirmou também que não pode divulgar detalhes sobre o evento adverso por regras de sigilo, mas reforçou que isso não era motivo para a interrupção do estudo. Na noite da segunda-feira, 9, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) suspendeu os testes do imunizante no País informando que o motivo era um voluntário brasileiro ter apresentado "evento adverso grave". Após a decisão, o Butantã se disse surpreendido com a medida e o presidente do Instituto, Dimas Covas, afirmou que esse participante morreu, mas que o óbito não teria relação com a vacina.
Covas explicou que um "evento adverso" não é o mesmo que "reação adversa", esta sim em geral relacionada à própria vacina. "Nesse estudo clínico tivemos reações adversas, eu mesmo as apresentei, foram leves. Não tivemos nenhuma reação grave. Não tivemos e continuamos a não ter. E podemos ter eventos adversos na população do estudo. É um acontecimento, mas que não tem relação direta com a vacina. São mais de 10 mil pessoas em acompanhamento e podemos ter os eventos mais diversos possíveis", afirmou.
Ele e o secretário de Saúde do Estado, Jean Gorinchteyn, compararam com um atropelamento. "Uma pessoa é atropelada quando sai de casa e morre - não estou dizendo que foi esse o caso - é um evento adverso. Isso é reportado, mas é um óbito pelo acidente, pela causa externa, sem nenhuma relação com a vacina", disse Covas.
Após a medida da Anvisa, a Coronavac não pode mais ser aplicada em nenhum dos voluntários. A vacina, entretanto, continua sendo testada em outros países. Na Indonésia, a farmacêutica estatal Bio Farm afirmou que o imunizante seguirá na fase clínica de testes, que envolvem 1,6 mil pessoas na província de West Java.
Em comunicado divulgado nesta terça, a Sinovac diz que entrou em contato com o Butantã após descobrir sobre a suspensão dos testes pela imprensa. "O diretor do Instituto nos disse que acredita que esse evento adverso grave não tem relação com a vacina. A Sinovac vai continuar falando com o Brasil sobre o assunto. O estudo clínico no Brasil é feito de acordo com o padrão internacional de Boas Práticas Clínicas (GCP, na sigla em inglês) e estamos confiantes na segurança da vacina", afirmou.
A paralisação da Coronavac no Brasil foi celebrada por Jair Bolsonaro por meio de um comentário publicado em seu perfil oficial nas redes sociais. "Morte, invalidez, anomalia. Esta é a vacina que o Dória queria obrigar a todos os paulistanos tomá-la. O Presidente disse que a vacina jamais poderia ser obrigatória. Mais uma que Jair Bolsonaro ganha", publicou. Ainda não foi confirmado se o voluntário que morreu no Brasil teria recebido placebo ou o imunizante.
Desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac e produzida no Brasil pelo Instituto Butantã, a Coronavac já foi aplicada em mais de 10 mil voluntários pelo País. Sua suspensão foi anunciada no mesmo dia que o governador João Doria afirmou que o primeiro lote dos imunizantes chegaria a São Paulo no próximo dia 20.
Em dados divulgados no mês passado, o Butantã afirmou que a incidência de eventos adversos entre os voluntários foi de 35% ante pelo menos 70% nas outras vacinas testadas. A comparação foi feita com dados das pesquisas de outros quatro imunizantes em estudos: Moderna, Pfizer/BioNTech, Oxford/AstraZeneca e CanSino.
De acordo com especialistas, o registro de eventos adversos é comum nesta etapa de pesquisas de imunizantes, mas sempre precisam ser investigados para se determinar a origem do problema. A pesquisa da vacina da Universidade de Oxford, em parceria com a farmacêutica AstraZeneca, também teve os testes interrompidos pelo menos duas vezes por causa de efeitos adversos graves, mas os estudos foram retomados após análises de comitê independente de cientistas.