Após clínicas particulares abrirem negociação com um laboratório indiano de vacinas, o Ministério da Saúde informou que a rede privada também deve seguir a ordem de vacinação de grupos prioritários prevista no plano nacional de imunização. Desta forma, mesmo que possa vender o produto, as clínicas deverão oferecer primeiro a idosos e profissionais específicos.
"Os grupos prioritários, propostos pelo Ministério da Saúde em parceria com Conass e Conasems, devem, a princípio, ser obedecidos mesmo que haja integração de clínicas particulares de vacinação ao processo de imunização", disse o ministério em nota.
A declaração da pasta ocorre após a Associação Brasileira das Clínicas de Vacinas (ABCVAC) informar que o setor negocia a compra de cinco milhões de doses da Covaxin, imunizante contra a covid-19 fabricado pela farmacêutica indiana Bharat Biotech.
A Covaxin obteve no sábado, 2, recomendação de uso emergencial na Índia, mas os dados sobre a sua eficácia ainda são desconhecidos. A ABCVAC pretende enviar nesta semana uma delegação ao país para negociar a compra da vacina. A entidade espera que as doses cheguem ao Brasil em março, mas este calendário depende de aprovações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Em nota, o ministério também afirma que a vacinação no Brasil começará pela rede pública do Sistema Único de Saúde (SUS). No cenário mais otimista, o governo federal quer começar a campanha em 20 de janeiro. A ideia é vacinar no primeiro semestre de 2021 grupos prioritários, que somam 49,6 milhões de pessoas, como profissionais de saúde e idosos. Essa etapa deve durar quatro meses. O restante da população, segundo o plano nacional de imunização, será imunizado nos 12 meses seguintes.
A Saúde ainda declara que as clínicas terão de garantir o registro de dados sobre quais doses foram aplicadas na população. "É preciso observar que o registro da aplicação do imunizante precisaria ser feito junto à Rede Nacional de Dados de Saúde e à caderneta digital de vacinação. Esta rastreabilidade possibilita identificar quem tomou a vacina e em qual data, além de precisar o laboratório e o lote do imunizante, possibilitando a aplicação de uma segunda dose no prazo correto", diz o ministério.
Para ser aplicada, a Covaxin deve ser registrada ou receber aval para uso emergencial no Brasil. A fabricante da vacina precisa pedir essas permissões à Anvisa.
Em nota, a Bharat Biotech disse que iniciou procedimentos junto à Anvisa para "submissão contínua" dos resultados. Não há nada acertado ainda com a agência. Por este caminho, a empresa deve apresentar os dados das pesquisas em etapas, mesmo antes de finalizar todos os estudos.
A Bharat Biotech precisa também trazer estudos clínicos ao Brasil para usar a submissão contínua, o que não foi ainda sinalizado para a Anvisa. Só quatro laboratórios (AstraZeneca, Butantã, Janssen e Pfizer/BioNtech) aderiram a este modelo de entrega de documentos.
"A vacina, administrada em duas doses com intervalo de duas semanas entre elas, induziu um anticorpo neutralizante, provocando uma resposta imune e levando a resultados eficazes em todos os grupos de controle, sem eventos adversos graves relacionados a` vacina. Na última fase antes da liberação para uso emergencial, ela foi aplicada em 26 mil voluntários em 22 localidades da Índia", afirma a ABCVAC. Os dados sobre os estudos finais da vacina ainda não foram publicados.
A ABCVAC afirma que representa 70% do mercado brasileiro de clínicas de vacinação, com 200 associadas. "Inicialmente a notícia era a de que as clínicas privadas brasileiras não teriam doses disponíveis, porém, com a entrada desse novo player no mercado, tivemos a oportunidade de negociação", afirmou Geraldo Barbosa, presidente da entidade, em nota.
A Covaxin pode ser armazenada sob temperatura de 2 a 8 graus, mesmo intervalo utilizado na rede de frios do SUS. "A previsão é a de que seja lançada no mercado em fevereiro de 2021, e a projeção é a de que sua validade contra a covid-19 seja de 24 meses", afirmou a associação das clínicas privadas.
O caminho para aprovação do registro ou uso emergencial da Bharat Biotech exige uma série de análises da Anvisa. A agência pode pedir, por exemplo, certificações adicionais - com inspeção in loco - em fábricas que forneçam ingredientes das vacinas, além de comprovação de que os dados de eficácia seriam também observados na população brasileira. A Anvisa tem prazo de 60 dias para avaliar pedidos de registro de vacinas. O uso emergencial e temporário deve ser liberado ou não em dez dias, estima a agência.
A entidade brasileira afirma que o laboratório indiano também tem capacidade de atender o sistema público brasileiro. Há um memorando de entendimento não vinculante assinado entre o Ministério da Saúde e a farmacêutica.
A aposta do governo é a vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford com a farmacêutica AstraZeneca, que deve ser fabricada e distribuída no Brasil pela Fiocruz. Mas o governo Jair Bolsonaro assinou memorandos, que não obrigam a compra de doses, com a Pfizer/BioNTech, Janssen, Instituto Butantã (que produz a Coronavac, da chinesa Sinovac), Moderna e Instituto Gamaleya (que produz a Sputnik V).
O ministério tem sido cobrado para fechar acordos com as fabricantes, mas afirma que esses negócios só serão concretizados depois que a Anvisa conceder registro aos imunizantes.