Uma pesquisa da Merck e Ilumeo revelou a ligação entre obesidade e sentimentos negativos nas redes sociais. 54% das menções a obesidade foram negativas, destacando-se termos como 'nojo' e 'preguiça'.
Uma pesquisa encomendada pela farmacêutica Merck, líder global em ciência e tecnologia, e realizada pela consultoria Ilumeo, expôs o crescente vínculo entre obesidade e sentimentos como culpa, vergonha e depressão nas redes sociais. Analisando mais de um milhão de postagens no Instagram, Twitter e TikTok, o estudo mostrou que 54% das menções a pessoas com sobrepeso ou obesidade foram negativas, com termos como “nojo” (44%) e “preguiça” (36%) liderando as associações. Enquanto o movimento de aceitação corporal (“body positivity”) perde força, o “body shaming” ressurge, comparado pelos especialistas aos padrões tóxicos de magreza dos anos 2000.
Da autoaceitação ao autojulgamento
A análise identificou que 46% das postagens negativas abordavam autoestima ou autoimagem, sinalizando um retrocesso na discussão sobre diversidade corporal. “Vivemos uma romantização do emagrecimento a qualquer custo, com influenciadores e celebridades tratando o corpo gordo como um ‘erro a ser corrigido’”, explica Otávio Freire, fundador da Ilumeo e professor da USP.
O fenômeno é reforçado por trends como “What I Eat in a Day”, que acumula milhões de visualizações, mas muitas vezes normaliza dietas restritivas e métodos perigosos de perda de peso.
Obesidade não é escolha
Apesar de ser reconhecida como doença crônica pela OMS, a obesidade ainda é estigmatizada como falha de caráter. “Ninguém trata diabetes ou câncer sozinho, mas pacientes com obesidade enfrentam julgamento até por buscar tratamento”, destaca o endocrinologista Cristiano Barcellos.
O preconceito se estende ao uso de medicamentos: 56% das menções a remédios para obesidade são negativas, como se o tratamento fosse uma “fraude”.
Redes Sociais: entre a fome física e a emocional
Conteúdos virais como “Mukbang” (vídeos de pessoas comendo em excesso) ou áudios como “magras, magras, magras” não só banalizam transtornos alimentares, mas também afetam a saúde mental. Estudos citados na pesquisa indicam que a exposição a esses materiais aumenta o desejo por alimentos ultraprocessados e reduz a motivação para escolhas saudáveis.
“As redes criam uma falsa proximidade com influenciadores, distorcendo a realidade e incentivando comportamentos de risco”, alerta Freire.
O papel da análise do consumo digital na saúde
Diante do cenário, médicos defendem a inclusão da análise do consumo digital no acompanhamento de pacientes. “Precisamos entender como as redes afetam suas escolhas para oferecer orientações realistas”, afirma Maria Augusta Bernardini, diretora médica da Merck. Ela reforça que, embora medicamentos como Contrave (combinação de bupropiona e naltrexona) auxiliem no controle da fome emocional e fisiológica, o tratamento exige abordagem multidisciplinar.
Enquanto as redes sociais amplificam estigmas, especialistas defendem que a obesidade seja tratada com a mesma seriedade de outras doenças crônicas. Combater a desinformação e priorizar a saúde integral — não somente a estética — é urgente para evitar que culpa e vergonha continuem definindo essa jornada.