'Não posso ir à piscina', diz mulher com doença de M. Jackson

Diagnosticado com vitiligo, o astro pop sofreu uma transformação física ao longo da carreira: a pele negra se tornou branca por manchas causadas pela doença. Mesmo com a popularização do problema, a visão de que pode ser contagioso gera preconceito aos pacientes

25 jun 2014 - 15h26
(atualizado em 8/12/2014 às 16h36)
<p>Michael Jackson em 1987 (à esquerda) e depois de tratamentos (à direita)</p>
Michael Jackson em 1987 (à esquerda) e depois de tratamentos (à direita)
Foto: Getty Images

Não é uma doença contagiosa, não causa dor, nem coceira e mesmo sendo popularizada por um dos maiores ídolos pops do mundo, ainda é motivo de preconceito.  Michael Jackson, morto há cinco anos por intoxicação, começou a ter os primeiros sintomas de vitiligo com menos de 30 anos e logo as manchas brancas, que chegarama a afetar mais de 50% do corpo do cantor, passaram a chamar a atenção. Na época, a doença era pouco conhecida. Michael começou a carreira musical com a pele negra, terminou um homem branco e chegou a ser acusado de rejeitar a própria raça. Assim como ele, pacientes de vitiligo sofrem com preconceito e se privam de diversas atividades: "não posso ir à piscina", disse Ana Maria Rovane, 51 anos, que tem a doença desde os 15 anos.

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"Meu sonho ainda é tampar todas as manchas" - Ana Maria Rovane, 51 anos

Eu comecei a ficar com a pele manchada perto dos 14 ou 15 anos, mas eram pequenas, sem muita evolução. Quando as pessoas passaram a perceber e ver as machas, me enchiam de perguntas: ‘o que é isso?, isso pega?, não tem cura’, falavam. Eu tinha que ficar explicando tudo a todos, era muito triste, cansativo e me estressava muito.

Teve uma vez que eu estava com um namorado, eu era jovem e ele também, quando ele viu minhas manchas, parou, se afastou, e ficou olhando. Daí ele questionou: ‘isso pega?’. Eu fiquei totalmente arrasada, desmotivada e triste. Chorei muito, na hora eu xinguei ele por dentro e fui embora. Ele nunca mais me procurou e isso aconteceu um monte de outras vezes. Eu me fechei para namorados, hoje até namoro, preciso ficar tampando as manchas, mas fiquei muito tempo sem querer saber por medo de passar por tudo de novo.

Em 2011, tive um problema de tireoide e as manchas começaram a aparecer em todos os lugares. Elas vão abrindo nos meus braços, nas costas, em tudo. Eu passo bronzeador e cremes para tentar amenizar, mas meu sonho ainda é tampar isso daí, todas as manchas. Eu fui a um lugar outro dia, faz pouco tempo, a mulher viu as manchas nas minhas costas e perguntou se eu tinha tomado sol, eu respondi que sim. Aí, ela falou: ‘isso não é sol, não, tem nas mãos também, isso é vitiligo’. Nunca mais vou voltar lá.

Não posso ir à piscina, porque as pessoas rotulam, pensam que é contagioso, vão me olhar diferente e não quero me expor assim. Já sofri muito preconceito, até mesmo no meu trabalho, quando alguém vê as manchas nas minhas mãos. Eu vejo aquilo nos meus pés quando eu vou tomar banho, já não prendo mais o cabelo para não mostrar, antigamente eu ligava mais para isso, hoje menos, mas o preconceito atrapalha muito a minha vida.

A causa do vitiligo ainda é desconhecida, de acordo com o dermatologista Abdo Salomão Junior. No entanto, a avaliação de casos deixou nítida a relação com o estado emocional do paciente. “A causa provável é imunológica, anticorpos que agem contra os melanócitos, as células que produzem pigmento, e as danificam. Essas lesões no início podem ser reversíveis, mas ficam mais graves com o tempo”, afirmou o médico. O vitiligo acomete apenas a estética da pessoa e não tem relação com qualquer outra doença, disse Salomão. “Não há alteração de sensibilidade, o problema atinge apenas a camada epidérmica da pele”, disse.

A chance de um paciente de vitiligo transmitir a doença é “nula”, reforçou Salomão. “Não há bactéria, não há fungo, é imunológico”, justificou. No entanto, segundo ele, ainda existem pessoas que questionam a ciência e temem contrair a doença. “Evitam beber no mesmo copo, se aproximar, ter contato físico”, exemplificou o médico. O vitiligo afeta 1% da população e, em cerca de 30% dos casos, há histórico familiar da doença, segundo  a dermatologista Aline Albino Quintanilha, professora da Faculdade de Medicina de Petrópolis.

Doença

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De acordo com a SBD, a doença pode ter duas classificações: unilateral – atinge apenas um lado do corpo, é mais comum em pacientes jovens e pode haver a perda da coloração de pelos e cabelos -, e bilateral – o tipo mais comum que afeta os dois lados do corpo e as manchas surgem, no início, nas extremidades. O vitiligo se caracteriza, explicou Salmoão, pela formação de manchas acrômicas na pele, mais frequentes em cotovelos, joelhos e outras regiões de traumas. “É importante diferenciar que as manchas só são diagnosticadas como a doença quando são livres de qualquer pigmentação, ou seja, totalmente brancas”, disse o dermatologista.  

O vitiligo é mais comum na adolescência, mas pode surgir em qualquer idade. Não há discriminação de raças em relação ao aparecimento da doença, no entanto, em pessoas negras as manchas ficam muito mais evidentes e chamativas, segundo Salomão, por isso surge a impressão de ser mais frequente em pessoas de pele escura.  

Tratamento

A doença não compromete qualquer capacidade física ou intelectual do paciente, a principal preocupação dos dermatologistas, segundo a SBD, são os efeitos emocionais decorrentes do vitiligo. De acordo com Aline, a pele é o maior órgão do nosso corpo e é o mais exposto também, por isso a doença afeta diretamente a aparência do paciente que "muitas vezes é alvo de preconceito". “A primeira coisa que fazemos é o esclarecimento que o problema é apenas estético. Depois, indicamos o apoio psicológico. É comum a medicação com ansiolíticos, já que a doença é influenciada pelo estado emocional da pessoa”, afirmou Salomão.

"Não podemos dizer que existe tratamento com cura definitiva para o vitiligo, principalmente para o generalizado", alertou Aline. Os métodos clínicos podem ser feitos por via oral, como o uso de imunomoduladores tópicos, que atuam no controle da resposta inflamatória cutânea, assim como os estéticos: câmara de UVB, laser e micropigmentação, enumerou Salomão. Aline acrescentou a opção cirúrgica, de transplante de malanócitos. “A resposta é variável: observamos resultado positivo em 60% dos casos. O fator primordial é controlar a ansiedade”, declarou o dermatologista. E uma saída para lidar melhor com as manchas, aconselhou Aline, é com o uso de maquiagem corretiva, que pode melhorar a autoconfiança. 

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De uma maneira geral, o paciente com vitiligo  não deve se expor ao sol, para evitar o risco de lesões novas em áreas queimadas, e também deve evitar traumas físicos intensos, pois quando o paciente se machuca podem surgir manchas no local, explicou a dermatologista. É importante a procura de um especialista assim que perceber uma mancha, para o início do tratamento.

Fonte: Terra
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