Brasília - O ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS) chamou de "tragédia" e de "pior dos mundos" a alteração pelo governo federal da forma de divulgação dos dados da pandemia da covid-19. "Me parece que estão querendo fazer uma cirurgia nos números dos protocolos públicos. Não informar significa o Estado ser mais nocivo do que a doença", disse Mandetta, em uma live da faculdade IDP, de Brasília.
Em sua fala, Mandetta também criticou a possibilidade de o País deixar a Organização Mundial de Saúde. Neste sábado, o Ministério da Saúde passou a restringir as informações disponíveis em sua página na internet que mantém sobre informações a respeito da pandemia.
Depois de retirar do ar por um dia, o site https://covid.saude.gov.br/ exibe agora apenas as informações sobre os casos de pessoas recuperadas da doença, os casos de novas contaminações e os óbitos. Todas as demais informações históricas da doença no País, dados acumulados, foram omitidas da população pelo governo Jair Bolsonaro.
O ex-chefe da pasta da Saúde desferiu uma série de críticas após ser questionado, na live, especificamente, sobre a restrição das informações. Ele classificou como estratégia política com intenção de "esconder números, manipular os números, não deixar notícias ruins" e disse que isso é prejudicial para o cidadão.
"O direito à informação é quase como um direito que ele tem para como que ele pode fazer para prevenir aquela doença infecciosa, como ele contrai, o que ele pode fazer. O que acontece na sua cidade, nos seus bairros, no serviço público, como está funcionado, cada um deles, para que ele possa se portar enquanto cidadão, sabedor dos riscos", disse o ex-ministro.
Mandetta criticou diretamente a gestão militar no comando da saúde. O atual ministro da Saúde é o general Eduardo Pazuello e há dezenas de militares na pasta. "O SUS não foi conquistado, ele está sendo temporariamente ocupado por pessoas que têm uma excelente formação para o campo militar, mas não têm nenhuma formação para o campo da saúde pública", disse.
"Em guerras, militares são muito acostumados a construir bunkers de segredos inacessíveis. Mas, na guerra contra vírus, a informação compõe a primeira linha de defesa do indivíduo", afirmou o ministro, que se disse preocupado que os atuais responsáveis por conduzir a saúde possam estar lá apenas "cumprindo missão".
"Se essa missão é se passar por sonegar as informações, colocá-las em horário inacessível, ou rever, torturar os números para que eles confessem verdades que eles entendam que sejam as que melhor se encaixam para o momento, talvez seja isso que a gente vá presenciar, uma grande noite da ciência", afirmou. Fazendo um paralelo, o ministro disse que o regime militar escondeu informações sobre uma epidemia de meningite em 1975. "É uma tragédia o que a gente está vendo agora, o desmanche da informação", afirmou Mandetta.
"Por mais que eles queiram retirar do MS, podem os conselhos nacionais de secretários estaduais de Saúde transmitir as informações. É da transmissão de informações que se ganha credibilidade', frisou.
O Tribunal de Contas da União deve discutir a possibilidade de passar a reunir e divulgar as informações das secretarias estaduais de saúde, por proposta do ministro Bruno Dantas.
Genocídio indígena
Mantetta afirmou também que pode estar havendo um genocídio da população indígena, por meio do novo coronavírus.
"No caso dos indígenas, que tem uma valência internacional muito elevada, tenho certeza que o Supremo vai, em algum momento, se debruçar sobre esse tema, que pode flertar com o genocídio, já que são povos alguns isolados que nunca tiveram e relação e não construíram um arcabouço de anticorpos contra a família do coronavírus", disse.
Mandetta criticou também a possibilidade de saída do Brasil da Organização Mundial de Saúde. "Sair da OMS é nos colocar como páreas mundiais na saúde, é sair completamente da mesa. É igual a um menino mimado que fala: 'se eu não posso jogar, vou embora pra minha casa'. E ele não sabe que o melhor não é ser dono da bola, o melhor é jogar futebol e, para isso, você precisa de 22", disse o ex-ministro da Saúde.
O Brasil perderia muito no trânsito internacional e no acesso a mecanismos de produção e acesso a vacinas, segundo o ex-ministro. "Não somos uma superpotência para ficar de fora de um grande espaço de discussão como é a OMS, embora ela tenha cometido erros no início (da pandemia)", disse.