Um estudo realizado por pesquisadores brasileiros da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), em Minas Gerais, mostrou que o consumo de alimentos ricos em gordura afeta não só o corpo, mas também a mente: comidas gordurosas podem levar ao aumento da ansiedade e de outros problemas.
A principal autora da pesquisa, Sylvana de Noronha, disse ao jornal Folha de São Paulo que uma dieta rica em gorduras altera a microbiota do nosso intestino, o que impacta diretamente as funções do cérebro.
A pesquisa foi feita com roedores. Eles foram divididos em dois grupos e, durante nove semanas, metade deles receberam poucos alimentos gordurosos, outra metade não. Os cientistas estudaram as amostras fecais dos animais e fizeram testes comportamentais nos roedores.
Além disso, também foram feitas análises do tecido cerebral e do material genético dos animais. O resultado da análise mostrou que houve uma redução significativa na diversidade de microrganismos intestinais, perda de saúde e aumento de bactérias associadas à obesidade nos roedores com dieta gordurosa.
Este grupo também apresentou maior estimulação do tronco cerebral, região associada ao estresse e à ansiedade. Rodrigo Menezes, professor da Ufop e também autor do estudo, disse que os resultados do experimento mostram que a produção de serotonina está diretamente ligada à alimentação.
O estudo foi publicado na revista científica Biological Research e foi feito em parceria com a Universidade do Colorado, em Boulder, nos Estados Unidos. Os pesquisadores alertam para uma limitação dos resultados: os animais que participaram do estudo eram todos machos.
Assunto não é novo
Na opinião da psiquiatra Cíntia Braga, a relação entre a alimentação e saúde fisica/mental já é conhecida da humanidade há séculos. Ela cita como exemplo a existência milenar da medicina ayurvédica.
"O eixo intestino-cérebro tem ganhado destaque nos estudos sobre a fisiopatologia de diversas doenças, inclusive, neurodegenerativas", ressalta Cíntia, que explica que a microbiota intestinal - ou seja, as bactérias "do bem" que colonizam o ambiente intestinal e que favorecem os processos digestivos - também sofrem influência direta da qualidade da dieta.
Ao falar sobre a nova pesquisa da Ufop, a psiquiatra avalia que muitas vezes os pacientes caem em um ciclo vicioso com a comida. "O estresse crônico leva a pessoa a procurar 'comidas de conforto', que geralmente são ricas em açúcar e gorduras: momentaneamente trazem conforto, mas como vimos, podem atrapalhar todos os processos metabólicos, influenciando diretamente a saúde mental", cita.
Ela recomenda a adoção de hábitos saudáveis de vida, como a prática de atividades físicas e uma alimentação saudável, rica em fibras, nutrientes e "gorduras boas" (presentes em peixes e oleaginosas) para tratar sintomas de ansiedade leve. "Entretanto, mesmo em quadros mais severos, essa mudança é fundamental para que haja remissão do quadro", finaliza.
Vale ressaltar que esta não é a primeira nem a única pesquisa da área que mostra a relação entre esses dois setores. Uma pesquisa australiana, inclusive, chegou a associar a dieta mediterrânea à redução da gravidade de sintomas de estresse e ansiedade, embora essa diminuição não foi observada para depressão.