O Mounjaro, que tem como princípio ativo a tirzepatida, promoveu uma perda de peso relativa 47% maior em pacientes adultos com obesidade, na comparação com o Wegovy (semaglutida), de acordo com resultados da fase três do estudo SURMOUNT-5, divulgados nesta quarta-feira, 4, pela farmacêutica Elli Lilly.
Em média, após 72 semanas, a tirzepatida levou a uma perda de peso de 20,2%. Enquanto isso, a semaglutida resultou numa perda de 13,7%. "Os participantes do estudo que usaram tirzepatida perderam (em média) 22,8 kg, enquanto os que receberam semaglutida perderam 15 kg", disse a farmacêutica, em comunicado enviado à imprensa.
Além disso, 31,6% dos participantes tratados com tirzepatida perderam pelo menos 25% do peso corporal inicial, em comparação a 16,1% dos que usaram semaglutida. Os dados ainda não foram publicados em uma revista científica revisada por pares.
Segundo a farmacêutica, os eventos adversos mais comumente relatados no estudo, tanto para tirzepatida quanto para semaglutida, foram relacionados ao trato gastrointestinal, como náuseas e vômitos. Em relação à gravidade, esses eventos adversos foram considerados de leves a moderados.
No Brasil, a tirzepatida foi aprovada para o tratamento de adultos com diabete tipo 2 em setembro de 2023, com o nome comercial de Mounjaro. A farmacêutica aguarda avaliação regulatória da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para a liberação de uso no tratamento da obesidade.
Como a dose utilizada para pacientes em tratamento para diabete tipo 2 e obesidade será igual, o nome comercial (Monjauro) permanecerá o mesmo. Nos Estados Unidos, para pacientes com obesidade, o remédio passou a ser comercializado com o nome Zepbound, e foi aprovado pela Food and Drug Administration (FDA), órgão semelhante à Anvisa, em novembro de 2023.
O Wegovy é a versão antiobesidade do Ozempic, ambos têm como princípio ativo a semaglutida. A dosagem dos dois, porém, é diferente.
Conforme mostrou o Estadão em julho, outro estudo - não patrocinado pela farmacêutica -, publicado na revista científica JAMA Internal Medicine, já havia mostrado que, entre pacientes com sobrepeso e obesidade, a tirzepatida foi mais efetiva na perda de peso do que a semaglutida. Diferentemente do ensaio clínico da Eli Lilly, o estudo é chamado de mundo real, ou seja, coletou dados de pacientes em um contexto de uso cotidiano, fora de um ambiente controlado.
Embora aprovado no Brasil para tratamento da diabete tipo 2, o Monjauro ainda não é vendido no País. De acordo com a farmacêutica, isso decorre da alta demanda global. A empresa diz estar investindo recursos na ampliação da produção.
Como a tirzepatida funciona?
A tirzepatida é considerada um duplo agonista: significa que tem a capacidade de ativar os receptores de dois hormônios intestinais, o GLP-1 e o GIP. A semaglutida é conhecida como um agonista, pois atua apenas no GLP-1.
Além da associação com a liberação de insulina e o controle do açúcar no sangue, tanto os receptores GIP quanto de GLP-1 são encontrados em áreas do cérebro importantes para a regulação da fome e apetite, uma das principais hipóteses para explicar o funcionamento desses medicamentos na perda de peso.
De acordo com especialistas, o grande trunfo do Mounjaro é acionar os dois hormônios de uma vez e, com isso, proporcionar uma ação sinérgica, em que um ajuda o outro.
Além disso, o GIP parece ser fundamental para os resultados atingidos, de acordo com Luiz Magno, diretor médico sênior da Eli Lilly do Brasil. "Ele é muito mais presente no tecido gorduroso e também existe a presença de receptores do GIP no sistema nervoso central. Isso é o que provavelmente explica essa diferença de resultados que encontramos quando fizemos esse estudo 'cabeça-a-cabeça' dos dois medicamentos", explicou ao Estadão.
O endocrinologista Bruno Geloneze, pesquisador principal do Centro de Pesquisa em Obesidade e Comorbidades (OCRC) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), aponta que a hipótese para a maior promoção de perda de peso é complexa. A função do GIP, diz, é predominantemente, facilitar a secreção de insulina quando a glicemia do sangue está alta. "Em tese, esperávamos que a tirzepatida fosse mais potente exclusivamente para o controle do diabetes. E isso de fato acontece. Esses efeitos adicionais sobre fome e saciedade não podem ser atribuídos ao GIP em si", avalia.
Ele não descarta que possa haver um efeito do GIP sobre fome e saciedade, mas ele deve ser discreto, avalia. Para ele, o que pode ser o pulo do gato é que o GIP tem um efeito de diminuir a náusea. Com isso, seria possível um aumento no efeito do GLP-1, muito relacionado à fome e saciedade, sem um impacto tão expressivo do efeito colateral desagradável, explica.
O que muda?
Geloneze destaca que o papel de estudos "cabeça-a-cabeça" de medicamentos como esses não é apenas descobrir qual promove a maior perda de peso, mas também avaliar segurança e tolerabilidade. Além disso, uma maior perda de peso não torna um melhor do que outro.
A grande questão é haver mais produtos no mercado e, com isso, conseguir individualizar cada vez mais o tratamento, ou seja, entender qual paciente se beneficia mais de cada um deles. "Reduções mais altas, como essa encontrada com a tirzepatida , absolutamente são bem-vindas. No entanto, não são necessárias para uma parcela dos pacientes", comenta.
Ele aponta que um grupo que pode se beneficiar com a chegada de mais essa opção ao mercado, por exemplo, é o de candidatos à cirurgia bariátrica. "Para eles, se almeja seja uma perda em torno de 20% do peso corporal ou mais do que isso. Usando a tizepatida, ele poderia ser um candidato a abdicar de uma cirurgia e, com o medicamento, conseguir cronicamente manter o peso dentro de uma faixa mais saudável."