"Foi quando me vi trancada dentro do meu apartamento de 54 m² que comecei a identificar que estar presa e longe dos familiares me fazia muito mal." Essa breve descrição poderia ser de qualquer um que precisou trabalhar de casa e manter distanciamento por causa do novo coronavírus. É de uma mulher, de 29 anos, que teve o histórico de ansiedade e síndrome do pânico agravado pela pandemia. A terapia, antes semanal, passou a ser três vezes por semana e as doses de remédios para controlar as crises aumentaram.
A brasiliense, que preferiu preservar a identidade, faz parte do grupo de pessoas que sentiu o estresse, a ansiedade e a depressão aumentarem na quarentena, mas as consultas com a psicóloga são um ponto de equilíbrio para seguir adiante.
"Nesses cinco anos de terapia, só tive benefícios e consigo identificar os gatilhos (das crises). Tenho esclarecimento muito maior de mim mesma e falo para as pessoas que sabem que tenho doença mental que a terapia não é só para isso. É para se conhecer e é muito positivo", diz. No passado, as crises de ansiedade também levaram a um quadro de depressão.
"Eu estava bem, nunca deixei de fazer tratamento, tinha vida normal em vista das fases que já tive. Com a pandemia, acabou piorando." O primeiro indício de que as coisas iam mal foi quando passou a trabalhar de casa, em meados de março. "Comecei a ter crises fortes." Ficar longe da mãe e da avó - que moram juntas e são do grupo de risco - contribuiu na piora. "Isso foi um dos gatilhos para ter crise de ansiedade e pânico."
Para a psicóloga Cristina Laubenheimer, vários fatores têm levado à ansiedade extrema, e a mudança nas relações humanas traz impacto. "De repente, quem antes era seu conforto passa a ser ameaça. Isso gera conflito grande." Em junho, estudo da Ipsos em 16 países mostrou que o Brasil é o que mais sofre com ansiedade na crise sanitária. Dos brasileiros, 41% lidam com o problema. As mulheres são as mais afetadas (49%).
Apreensão
Quem também recorreu à terapia e passou a tomar calmantes e antidepressivos leves foi Priscilla Martin, instrumentadora cirúrgica e laserterapeuta que continuou trabalhando na pandemia. Ela, de 41 anos, seguiu em contato com diversas pessoas dentro de diferentes hospitais e manteve atendimentos em domicílio quando a situação exigia. Divorciada, a profissional depende dos pais, idosos, para cuidar do filho de 9 anos enquanto passa o dia fora.
"Desde quando começou o alarme da covid, fiquei extremamente preocupada. Saindo para trabalhar todo dia, indo aos hospitais, todo mundo com aquela cara de terror. Você não sabe o que faz, se pode falar, se pode pôr a mão na maçaneta. E quando chega em casa, também não sabe bem o que fazer. O tempo todo é nessa tensão e preocupação. Minha vida hoje está muito mais estressante do que a rotina anterior", conta Priscilla, que chegou a atuar em um parto cuja paciente tinha covid.
Por mais que ela use máscara, escudo facial, luvas, troque os itens sempre que preciso e use soros para lavar as vias aéreas, a dúvida sempre ronda o pensamento. "Vou para casa e fico: 'será que estou realmente salva? Será que não peguei?'. Até o momento, a gente conseguiu se manter em segurança", conta.