Na vibrante comunidade da Federação, periferia de Salvador, Priscila Mércia Santos do Nascimento, aos 36 anos, está causando impacto ao empoderar mulheres negras e inspirar mudanças positivas. Sua formação em Relações Públicas é a base de uma jornada repleta de propósito e ação.
A parte principal da trajetória profissional de Priscila começa quando ela ingressa como assistente pedagógica no Aceleração com Elas, do Acelera Iaô – Programa de Afroempreendedorismo. A iniciativa fomenta o trabalho de empreendimentos negros baianos com apoio, qualificação e aceleração de negócios criativos.
No primeiro ano de atuação, “ficou perceptível que mais de 80% do público atendido eram de mulheres negras e periféricas. A partir daí, vem a necessidade não só de fazer uma formação específica, como também de inseri-las nas novas narrativas de mercado, e a que mais se destaca é a digital”.
Começa o desenvolvimento de uma trilha de formação em gastronomia, influência digital e podcast que “brilhou os olhos e me trouxe a possibilidade de executar uma mudança real na vida de várias mulheres pretas e periféricas”, conta Priscila.
Durante a pandemia, formação online
A abordagem online é componente vital da empreitada, estratégia mobilizada sobretudo na pandemia de coronavírus. Priscila aproveitou as redes sociais para compartilhar conhecimento em transmissões ao vivo, contando suas próprias lutas como mulher negra e empreendedora, abordando relação com dinheiro e precificação.
A relações públicas cita pesquisa do Sebrae e da Fundação Getúlio Vargas (FGV), segundo a qual mulheres demonstram maior competência em implantar programas de inovação em seus negócios e que a reabertura das empresas pós-pandemia está sendo realizada mais rapidamente por elas.
Dados de agosto de 2022 mostram que 71% das mulheres usam redes sociais e aplicativos para vender produtos, enquanto o percentual de homens é de 63%. Elas também realizam mais vendas online, 34% contra 29%.
Deusa Chic no caminho do crescimento
Uma dessas mulheres é a empreendedora Marcela Santos, moradora de Nova Brasília de Itapuã, periferia de Salvador. Empreendendo desde 2015, Marcela, mais conhecida como Deusa Chic, acredita que o programa Acelera Iaô mudou sua perspectiva. Ela vem crescendo na área de turbantes, bolsas, acessórios e reformas de roupa.
“Quero continuar no caminho. Muitas oportunidades surgiram, além das conexões que fiz e estou fazendo. Realizei sessão de fotos, foi criado material para minha marca, como cartão de visitas, adesivos, papel timbrado”, enumera.
Segundo a baiana, “para nós que somos afroempreendedoras, é uma oportunidade de potencializar o trabalho, nossas marcas e fortalecimento do black money”.
Desafio de empreendedoras negras na Bahia
No contexto baiano, existem desafios históricos para as empreendedoras negras. “Salvador é a primeira capital do Brasil. Tudo começa aqui, inclusive a colonização e a catequização. Esse processo distorceu a relação com o dinheiro, trouxe muito forte a ideia de que dar é melhor que receber, de que dinheiro é sujo e de que os puros de coração não têm ambição”, critica Priscila.
Entre os impedimentos que precisam ser superados, há limitações em estabelecer preços e a cultura de relações afetivas. O atendimento é acolhedor, o relacionamento com o cliente é intimista, mas “isso causa, em muitos casos, um conflito de interesse no inconsciente das empreendedoras”, explica a relações públicas.
O trabalho de Priscila é enfrentar e descontruir noções arraigadas que impedem o avanço de negócios de mulheres pretas. E ela está conseguindo, colaborando com a comunidade em direção a um futuro capacitado e justo.
Colheita dos ancestrais e as próximas gerações
Filha dos professores Carlos Lomanto e Uilza Santos, Priscila Mércia cresceu em uma família envolvida com militância negra e social. Seu pai foi ativista e sindicalista e sua mãe, empreendedora em constante atualização.
Aos 19 anos, Priscila teve o primeiro contato com a comunicação profissional, através de uma formação para jovens. Veio a graduação em Relações Públicas, com bolsa em universidade privada. Seu trabalho acadêmico analisou discursos de identidade racial.
Durante a formação, teve contato com o terceiro setor, entre adolescentes do subúrbio de Salvador. Com 12 anos de formada, transitou entre empreendimentos próprios, setor público e privado.
Relação entre maternidade e empreendedorismo
“Aos 30 anos, decidi ser mãe e, mais do que nunca, isso me conectou com a necessidade de mudança social, no comprometimento da construção de uma sociedade mais acolhedora para minha filha Diara Akinlana.”
Após empreender em áreas como gastronomia, moda, doces e artesanato, teve dificuldade em fazer eventos comemorativos para a filha, por falta de representatividade. “Então começo a trabalhar com a construção de personagens negros para festas infantis e maternidade.”
Sobre seu trabalho atual, ela entende o ciclo do qual participa. “A mulher preta é a minha causa. Inspirar mulheres a se movimentar e construir novas histórias é uma honra. Eu vivo a colheita dos meus ancestrais e as próximas gerações viveram a nossa”, finaliza.