Cria de Guaianases, extremo leste da capital, Renan Millá, 28, sempre quis montar seu próprio negócio. Pensando nisso, o jovem decidiu apostar em algo inovador, mas focado na sua vivência. Em novembro de 2022, ele deu vida ao Café do Milá, uma cafeteria gourmet na periferia de São Paulo.
Renan largou o sonho de ser jogador de futebol para criar seu empreendimento, como uma forma de popularizar a versão gourmet da bebida na quebrada e de levar um pouco do que, segundo ele, foi elitizado também para os mais pobres. Foi vivenciando a desigualdade no bairro onde mora que o jovem decidiu focar nos estudos para mudar de vida.
“No bairro onde cresci não tínhamos muitas oportunidades, tampouco recursos para nosso desenvolvimento pessoal e social. Os programas de capacitação são escassos. O estudo me transformou, foi um impacto. Passe a conhecer melhor a cidade e as necessidades de cada canto. Vi que era muito maior do que eu imaginava”, destacou o empreendedor.
Assim, Renan viu que precisa mudar o jogo. Se formou faculdade de Logística e conseguiu ingressar no tão desejado curso de Engenharia. Depois dos contratempos em empresas onde trabalhou, passou a enxergar oportunidades.
“Quando moleque, eu ia para outros bairros para curtir pagode, black music, bares a afins, jogávamos fliperama e comíamos hot-dog nos bairros centrais, coisas bobas, mas não tínhamos esse recurso no nosso bairro. Entendi que os consumidores de regiões centrais somos nós, e que não queremos nos deslocar tanto assim para consumir algo. Enxerguei precisarmos de algo de qualidade aqui”, contou Renan.
Para ele, o café é algo que o conecta, lhe dá a oportunidade de ensinar e aprender. Um de abertura e da troca. Milá também destaca a importância de mudar a perspectiva do empreendedorismo na periferia. “Não é só consumir ou vender, é entender. Eu, cria da quebrada, quero que vejam que é no suor, que é lendo, estudando, aprendendo e trocando, que vamos chegar”.
Com o Renan, o Café Milá chegou para fazer diferença e desequilibrar o conceito atual, interferir na cultura local. “Eu ofereço amor, isso em forma de carinho e atenção nos detalhes. Eu gasto energia pra que fique clara a compreensão. Não é só sobre o café, mas sobre a ideia de que aqui podemos ter e ser tudo, independentemente de onde você mora ou está. Quem dita o ritmo é você, e a quebrada pode!”
Para que a sua cafeteria fosse criada, Renan foi um pouco de tudo. Sem recursos para montar uma equipe, ele teve de abrir ainda mais o seu leque de habilidades.
“Fui operação, o criador, o designer, fiz o projeto, desenhei, quebrei parede, coloquei piso, fiz a parte elétrica, fiz a decoração, faço as artes, compro, cobro, vendo, penso nas estratégias, crio os drinks, faço a parte contábil e administrativa, varro chão, lavo louça, negocio com fornecedores. Nem tudo sai ótimo, mas eu sou da quebrada, é assim que começa, do começo, com uma ideia e depois estruturamos ela”, contou o jovem.
Seis meses depois da criação da sua cafeteria, Renan vai abrir a sua primeira vaga de emprego. “Meu primeiro colaborador, com muito orgulho, é cria daqui, que é um valor nosso. Vamos devolver ao bairro, aos periféricos, aos pretos, à Quebrada, o que jamais deveria ter sido retirado daqui. A vontade de vencer, o encorajamento e nosso café pertence a nós”, relatou o empreendedor.