Mulheres mudam de vida empreendendo nas favelas de Salvador

Moradoras das periferias criam os próprios negócios em busca de equilíbrio financeiro, realização pessoal e crescimento da comunidade

15 jun 2022 - 05h00
(atualizado em 22/9/2022 às 17h32)
Luciana Cerqueira Tavares
Luciana Cerqueira Tavares
Foto: Shirley Mascarenhas

O que começou como realização pessoal agora faz parte de um movimento de transformação social. Ao empreender, moradoras das periferias de Salvador mudaram suas vidas e o local em que vivem. Embora as dificuldades apareçam, elas não desistem e continuam inovando para manter suas empresas.

Luciana Burgers

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A fim de gerir e sustentar seus negócios, empreendedoras locais utilizam a determinação e a coragem para seguir em frente, como é o caso da soteropolitana Luciana Cerqueira Tavares, 36 anos, fundadora da Hamburgueria artesanal, a Luciana Burgers. Ela foi aluna da escola de gastronomia periférica, começando sua jornada no empreendedorismo em 2015. Hoje, é uma referência em hambúrguer artesanal no bairro de Pirajá e adjacências.

Antes de abrir a Hamburgueria, Tavares trabalhava na área de formação, fisioterapia, atendendo em domicílio e ministrando aulas de pilates, mas tudo mudou depois que se afastou da área de saúde e realizou uma cirurgia bariátrica. A partir disso, decidiu empreender para pagar as contas. “Na época, eu morava de aluguel, peguei minhas economias e investir em uma lanchonete com produtos naturais, mas infelizmente alguns meses depois percebi que era necessário mudar o público alvo. Mudei para pastelaria, porém não era algo inovador para o bairro, após algumas pesquisas boca a boca, resolvi então focar em hambúrguer artesanal. Com isso, surgiu a primeira hamburgueria artesanal do bairro de Pirajá”, explica.

Com sete anos de hamburgueria, Luciana Tavares diz que é importante ter o próprio negócio, porque se ganha autonomia para tomar decisões e implantar novas ideias, além disso, é possível administrar melhor o tempo e ter retorno financeiro equivalente ao trabalho. “Antes de empreender tinha uma carga horária menos flexível e meus ganhos não eram proporcionais, - o valor era fixado pela empresa que prestava serviço -, com salário pré-determinado que dificilmente aumentaria. Hoje, tenho horário mais flexíveis e com ganhos maiores, correspondentes à dedicação, ao esforço e proporcionais ao crescimento das vendas, podendo assim estipular minhas margens de lucro e meu salário”, assegura.

Tavares salienta que a vantagem de empreender é poder trabalhar com que gosta, já que chance de prosperar é maior. “A vantagem de empreender é conseguir trabalhar com que gosta, tudo que fazemos com prazer e amor a chance de prosperar é maior: ter autonomia, horário flexível, rendimento e lucros proporcionais”, desataca, mas ressalta que as desvantagens é ter um investimento inicial e lidar com riscos e ter ganhos variáveis. Além de saber lidar e filtrar aquela clientela tóxica”, salienta.

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A pandemia do Covid-19 também impactou diretamente no empreendimento de Luciana, exigindo que ela se reorganizasse e inovasse, “A hamburgueria funcionava apenas com atendimento presencial, foi necessário implantar atendimento delivery com as medidas implantadas durante o Lockdown’’, lembra.

De acordo com a pesquisa do Impacto da Pandemia do Coronavírus nas Micro e Pequenas Empresas, realizada, em 2021, pelo Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), no último ano, apenas 28% das donas de pequenos negócios conseguiram pagar os gastos do dia a dia com recursos provenientes de suas próprias empresas e 80% apresentaram queda de faturamento.

Mesmo com todas as dificuldades a empreendedora afirma que a empresa já gerou e pretende gerar trabalho para jovens do bairro de Pirajá (local da hamburgueria), dando oportunidade para que eles ingressem no mercado e adquiriram experiência no primeiro emprego.

Para quem quer empreender, Luciana aconselha, “Se o seu sonho é empreender, arrisque-se, saia de sua zona de conforto, estude, pesquise, planeje e vá em busca do que realmente quer.  Ser empreendedor é muito gratificante, principalmente quando fazemos com amor”, finaliza.

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Espaço Gleice Vitória

“Durante a pandemia foi desafiador manter a minha empresa, porém com estratégias de fidelização dos clientes, consegui manter boa parte da clientela”, conta a Consultora de Beleza e Marketing Digital, Gleiciane Vitória dos Santos, 35 anos, moradora da comunidade de Pirajá.

Gleiciane conta que é uma mulher apaixonada por elevar a autoestima de outras mulheres e por ajudar outras que também desejam empreender. Com mais de oito anos atuando como empreendedora, ela destaca que sua vida mudou depois de criar o próprio negócio em 2015, o Espaço Gleice Vitória, “Me sinto mais autoconfiante e independente. Descobri um mundo novo que foi o empreendedorismo e hoje não me vejo voltando pro mercado tradicional”, afirma.

Gleiciane Vitória dos Santos
Foto: Gal Pereira

De acordo com a empreendedora, a criação do próprio negócio aconteceu repentinamente, através de um convite de um colega que trabalhava com perfumes. “Eu já trabalhava com marketing de relacionamento em uma loja que vendia roupas e outros produtos no atacado. O meu líder saiu da empresa e foi para outra no ramo de perfumes de bolsas e me convidou para se juntar a ele, mas, incialmente, resisti. Após um tempo experimentei os perfumes gostei e fui trabalhar com ele como revendedora. A parti disso, comecei a empreender”, explica.

Depois disso, segundo Gleiciane, surgiu necessidade de ter um espaço com pronta entrega para atender as clientes que precisavam de produtos imediatos. “Tenho meu espaço na sala da minha casa, mas só vem aqui as clientes mais próximas. A maioria das vendas faço pelo WhatsApp, pelo Facebook e Instagram. Agendo as entregas e as levo para as clientes. As que moram aqui em Pirajá podem retirar o produto aqui mesmo, na minha casa. Fiz alguns cursos de marketing digital on-line para aprender a gerenciar e vender pelas redes sociais”, comenta.

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A consultora diz que com o próprio negócio consegue atender em média 30 clientes por mês e isso ajuda nas despesas de casa, “Consigo ajudar nas despesas de casa, trabalho no meu ritmo, posso modelar minha rotina de acordo com minhas necessidades”, diz.

Gleiciane revela que antes de adentrar ao “mundo do empreendedorismo”, trabalhou com telemarketing, atendente de loja de roupa em shopping, além de já ter sido promotora em grandes lojas de varejo da cidade. “Antes eu tinha ganhos limitados, não tinha tempo para investir em mais conhecimentos para evoluir como pessoa e profissional. Hoje consigo fazer cursos, tenho liberdade e faço meus próprios ganhos”, enfatiza.

Além disso, Santos diz que empreender é libertador, com benefícios de poder fazer o próprio horário e o salário. Entretanto, existem alguns desafios, como por exemplo, amigos e família entenderem que mesmo em casa o trabalho é desenvolvido. “Quando se trabalha em casa, as vezes a família e amigos tem dificuldade em entender que mesmo em home office e acessando o celular, estamos trabalhando”, declara.

Ela dá dicas para as pessoas que querem empreender, “Tenha coragem para dar o primeiro passo. Escolha algo que se identifique e tenha habilidade, se planeje e execute. É importante também ter claro seus motivos para começar, pois quando os desafios vierem você terá que se lembrar de cada um deles pra continuar”, destaca.

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Bê Popcorn Gourmet

“Abrir o próprio negócio é uma oportunidade de poder trabalhar com algo que lhe agrada, criar soluções para ajudar o público a interagir, consumir, fidelizar. Deste modo ir aos poucos conquistando seu espaço. Estar mais próximo a família e alcançando rentabilidade”, conta Elaine Marta Miranda Carneiro, 35 anos, mora no bairro de Pirajá, atua no ramo de Pipocas Gourmet.

Elaine criou a Bê Popcorn Gourmet há oito meses e diz que é uma das pioneiras na região da venda da pipoca gourmet, “Percebi que a pipoca gourmet é um produto novo aqui na região, então fiz cursos, me aperfeiçoei e comecei a vender, ela tem um milho totalmente diferenciado, saborizado de uma forma diferente das pipocas tradicionais”, conta.

O que a levou a abrir o próprio negócio foi a oportunidade de ficar perto do filho recém-nascido. “Foi a oportunidade que tive para conciliar trabalho e maternidade. Poder acompanhar meu filho em suas fases, além de empreender com calma e assertividade”, afirma.

Ela, que trabalhava numa Consultoria de Recursos Humanos, faz questão de ressaltar que o regime do trabalho antes de empreender era baseado em seguir diariamente um ritmo de regras, normas, altas pressões, cumprir demandas em curtos prazos, “Era uma total dependência em diversas decisões e situações”, comenta.

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Elaine Marta Miranda Carneiro
Foto: Virgínia Marta Mota Miranda Silva

Contudo, depois que abriu o próprio negócio ganhou mais liberdade e autonomia. “Tenho mais liberdade, autonomia nas decisões. Posso escolher os horários de trabalho e conciliar a vida pessoal, familiar e profissional”, afirma.

A empreendedora vende as pipocas, através de divulgação nas mídias sociais, além claro, do boca a boca dos clientes e amigos. “Vendemos a pronta entrega e por encomendas, de forma personalizada, para festinhas e eventos corporativos”, explica.

Elaine Carneiro diz que o empreendimento possibilitou a aquisição de novos conhecimentos e responsabilidades. “Adquiri mais conhecimentos e responsabilidades, pois acompanho e cuido de perto de cada mínimo detalhe do negócio. Hoje, tenho a oportunidade de auxiliar nas contas da casa, continuar investindo no meu negócio e estar mais próximo da minha família”, afirma.

Segundo a empreendedora, sua iniciativa beneficia a comunidade ao oferecer o fácil acesso a uma tendência gastronômica no bairro, pois esses tipos de produtos artesanais, geralmente são vendidos apenas em Shoppings.

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Elaine comenta que gostaria muito que a história de sua empresa influenciasse mais mulheres a empreender, assim elas teriam mais tempo para acompanhar o desenvolvimento de seus filhos.

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