Mulheres negras abrem bar e buscam pluralidade em favela

'Vale muito a pena acreditar na sua ideia e no seu potencial. Começar a empreender me fez entender que sou muito potente', diz empreendedora

4 fev 2022 - 08h00
(atualizado em 11/2/2022 às 15h53)
Daiane Menezes
Daiane Menezes
Foto: Silvio Santana

No Brasil, em novembro, as micro e pequenas empresas foram as grandes responsáveis pelas novas vagas de emprego no país. Das 324,1 mil novas contratações, o setor criou 245,5 mil, o que corresponde a 75,7%, enquanto que as empresas de médio e grande porte abriram 84,2 mil novos postos, é o que aponta o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).

O levantamento feito com base em dados do novo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho e Previdência, revela que as micro e pequenas empresas, nos diversos segmentos como, por exemplo: no ramo comercial e de serviços, manteve a tendência de ser o responsável por sete em cada dez novos postos de empregos no Brasil.

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Ainda de acordo com o Sebrae, a Bahia, no ano passado, foi de crescimento das Micro e Pequenas Empresas (MPEs). Foram registrados mais de 137 mil negócios do tipo entre os meses de novembro de 2020 e 2021. Além do mais, de janeiro a outubro do ano passado, as micro e pequenas empresas geraram 90 mil empregos formais.

Com essa alta, surgem projetos que direcionam desenvolvimento do empreendedorismo nas comunidades em Salvador. Além disso, muitos baianos estão criando os próprios negócios como bares, clínicas, entre outros, no intuito de buscar o sonho e a independência financeira.

Como é o caso da empreendedora Daiane Menezes, que se uniu a outras mulheres, com o mesmo propósito, e abriram o próprio negócio.

“Quatro mulheres negras que se encontraram na vida e se uniram, avisando que os seus passos vêm de longe, trazendo cada uma as vivências e pluralidade de saberes em diversos segmentos de mercado de trabalho”, conta Daiane Menezes, de 34 anos, umas das fundadoras do Bar e Restaurante Malembe Food & Drinks.

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Ela e mais três mulheres negras, Mônica Tavares, Milena Moraes, Diana Rosa criaram o Bar e Restaurante Malembe, que nasceu da necessidade de um lugar voltado para população negra que carecem de espaços plurais, um espaço que vai além da boa música, focando também na qualidade gastronômica, drinks diversos e eventos culturais que pretendem resgatar a conexão com a ancestralidade delas.

De acordo com Menezes o nome "Malembe" é uma referência à religiosidade de matriz africana.

“A palavra oriunda de Angola é um canto ou súplica às divindades. Malembe também significa uma expressão popular no país africano que pode ser traduzida para o baianês como "venha devagar, na manha”, esclarece.

A empreendedora conta que o bar foi inaugurado no começo de junho de 2019 e tem capacidade para até 80 pessoas simultaneamente.

“A proposta da casa é de um ambiente descontraído, jovem, e que cultua a ancestralidade africana, com foco principalmente na população negra e LGBTQIAP+”, explica.

Ela diz que teve dificuldades para empreender pois não tinham apoio financeiro, mas tiveram amigos que acreditaram na ideia delas. “Apoio financeiro, mas tivemos e ainda temos muitos amigos que nos apoiam e acreditam em nosso trabalho”, fala firme.

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Menezes afirma que empreender vale a pena, pois mostra a força que tem. “Vale muito a pena acreditar na sua ideia e no seu potencial. Começar a empreender me fez entender que sou muito potente”, pontua.

Menezes enfatiza que é muito importante empreender na comunidade, pois com o empreendedorismo as possibilidades de oferecer um produto de qualidade para as pessoas que, muitas vezes, não recebem isso, é grande.

“Empreender para a comunidade tem uma importância muito grande. Acredito que seja poder oferecer serviços de qualidade e com valor para aquelas pessoas que geralmente não recebem esses serviços e não são vistas como potencial público consumidor”, afirma.

Menezes ressalta que é o diferencial delas é a identidade e o sonho das idealizadoras contidas no Malembe. “Nosso diferencial é conter a identidade e o sonho de quatro mulheres pretas. Absolutamente tudo no Malembe, tem um pouco de nós”, diz entusiasmada.

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O estabelecimento fica localizado na Ladeira do Carmo, 7, Santo Antônio, Salvador, Bahia.

No malembe, Daiane Menezes é a gastrônoma e bartender com responsabilidade na elaboração de cardápio e carta de drinks. Além dela, Milena Moraes atua como relações públicas, promovendo eventos no bar. Também tem a Mônica Tavares, administradora geral, sócia proprietária e Diana Rosa, criadora do cardápio internacional e vegano, é a principal intermediária da relação Bahia-Angola.

Daiane Menezes deixa uma mensagem para aquela pessoa que tem vontade de abrir o próprio negócio: “Comece. Entenda qual a necessidade do público que você quer atender, se cerque de informação sobre o segmento do negócio e faz seu caminho. Você vai aprender muito quando tiver vivendo seu sonho”, afirma.

Sócias do Malembe Monica Tavares, Diana Rosa, Milena Moraes e Daiane Menezes
Foto: Uelinton dos Santos

Caminhos de Pirajá

Com o aumento de número de empreendedores na Bahia nascem projetos com objetivo de ajudar moradores em comunidades, como por exemplo, o “Caminhos de Pirajá”, que visa desenvolver o empreendedorismo e inovação em bairros populares de Salvador.

“Aprendi sobre organização financeira, como lidar com as emoções no empreendedorismo e saber vender o meu produto. Além disso, de como ter um negócio criativo e sustentável, ou seja, abriu minha visão de mundo de negócios”, fala agradecida, Larissa da Silva Dias.

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Ela faz parte do “Caminhos de Pirajá” e ressalta que aprendeu sobre diversas coisas no projeto, como: organização financeira, vendas, ser criativa, enfim, expandiu a visão do mundo dos negócios.

Fisioterapeuta e empreendedora, Larissa Dias é sócia-diretora da clínica “Larissa Dias”, na qual é pioneira do método Pilates, há 06 anos, no bairro de onde mora, em Pirajá. A empresa, criada em março de 2016, atende por mês de 100 à 120 pacientes e também oferece serviços de Fisioterapia, Psicologia, Nutrição e Fonoaudiologia.

A empreendedora destaca que abriu o próprio negócio por duas razões: a busca pela independência financeira e percebeu que o bairro de Pirajá não tinha Pilates: “Eu vi a necessidade de ter uma independência financeira e também levar para meu bairro o Pilates onde não existia esse tipo de segmento”, afirma. 

Larissa da Silva Dias
Foto: João Pedro Dias

Para a empreendedora, de 35 anos, empreender na própria comunidade traz diversos benefício para o local onde mora: “Valoriza a comunidade, gera empregos e renda, diminui as saídas para outros bairros mais distantes já que temos esse serviço e de qualidade, fortalece a economia do bairro”, afirma.

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Ela faz questão de ressaltar que empreender e possuir o próprio negócio tem uma grande diferença:

“Devemos estabelecer uma diferença importante entre ter um negócio próprio e empreender. Para Peter Drucker, o pai da administração moderna, empreender está ligado a inovação. Ou seja, você pode ter um negócio próprio (uma padaria, lanchonete, mecânica, etc.), mas não ser um empreendedor. Contudo, quando você busca inovar algum aspecto do negócio, está empreendendo. Empreender é um risco! Sempre penso que empreender é ser perseverante e resiliente”, esclarece.

Larissa da Silva Dias
Foto: João Pedro Dias

Outro morador contemplado pelo “Caminhos de Pirajá” é Loui Geovane Farias, 22 anos. Ele, que é empreendedor ambiental, fala que empreender possibilita conforto financeiro e oportunidades.

“A Importância de ter a oportunidade de obter um conforto financeiro, e também de gerar e alavancar a economia e emprego no bairro. Empreender é dar oportunidades a si de crescimento e do próximo também, seja atuando ou no exemplo de vida”, afirma.

Faria faz questão que explicar o que é empreendedorismo ambiental. Ele diz que é um desenvolvimento sustentável que investe na redução dos impactos ambientais e busca novas formas de produzir e oferecer produtos para os visitantes e turistas no espaço ambiental.

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Ele também é morador do bairro de Pirajá e trabalha, desde dezembro de 2017, no Instituto Trilha das Flores como coordenador, além de atuar na assessoria jurídica e Mobilizações. De acordo com Farias, o instituto é um coletivo apartidário que promove atividades esportivas e ambientais no Parque São Bartolomeu com a importância na engenharia social, quando se desenvolve atividades na área verde.

“Trilha das Flores é um movimento ambiental, com foco na preservação do Parque São Bartolomeu e do bairro de Pirajá. É um empreendimento criativo socioambiental. É um coletivo de moradores e profissionais que desenvolve ações e projetos em parceria para trazer benefícios a comunidade do Parque”, explica.

Loui Geovane Farias
Foto: Janine Bizerra

O empreendedor explica que o Parque são Bartolomeu é uma reserva de Mata Atlântica com grande importância ambiental, histórica e religiosa. O Parque envolve uma área de preservação ambiental da Bacia do Rio do Cobre (São Bartolomeu), incluindo uma represa e cascatas. Fica localizada entre a Enseada dos Cabritos e o bairro de Pirajá.

Faria diz que a Trilha das Flores tem muita importância para a comunidade, pois promove atividades físicas e ações ambientais no Parque São Bartolomeu, além de gerar economia, estimular senso crítico aos moradores e buscar integração entre o parque e o bairro de Pirajá.

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“No viés econômico, as atividades geram a economia do Parque, uma vez que estimulamos os moradores a empreender –vender produtos durante as atividades. Na perspectiva educacional, buscamos formar massa crítica sobre temas ligado a meio ambiente e comunidades. Já no quesito social, buscamos a integração entre a comunidade e o parque. Mostrando o forte potencial do empreendedor ambiental”, esclarece.

O empreendedor fala que a vida se transformou depois do Trilha das Flores.

“Minha vida transformou quando pude obter mais conhecimentos na área ambiental, ecológica, social, jurídica e empresarial. Me reeducando e mantendo mais ainda a conscientização ambiental, de estar conectado com pessoas de excelência importância nas esferas do meio ambiente, servindo experiência e dando-me oportunidades de entendimento e crescimento no ramo”, explica.

Farias ressalta que o projeto “Caminhos de Pirajá” é muito importante para ele, pois teve a oportunidade de aprender sobre empreendedorismo.

“O projeto “Caminhos de Pirajá” me deu uma enorme oportunidade de conhecimentos, de como ser um empreendedor e de como empreender um negócio, me dando um engajamento importantíssimo no ramo e isso me ajudou e está me ajudando cada vez mais é como o "sal e o tempero que faltava na comida". Então, o projeto é e foi importantíssimo para o meu crescimento e acredito também de outras pessoas que passaram por ele”, pontua.

Loui Geovane Farias
Foto: Janine Bizerra

Projeto

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“O projeto tem por objetivo fortalecer a economia local, dinamizar negócios e lideranças de alto impacto, com interatividade, participação da comunidade, eventos, material didático e muito mais”, é o que afirma Paulo Henrique Oliveira, 33 anos, coordenador do Projeto “Caminhos de Pirajá”.

Para Paulo Henrique, o projeto nas comunidades é muito importante, pois democratiza acesso aos conteúdos e é uma oportunidade de desenvolver negócios no bairro.

“É fundamental democratizar o acesso aos conteúdos, ferramentas e ao ecossistema de empreendedorismo. Isto significa levar oportunidade de amadurecer negócios e pessoas que podem contribuir o desenvolvimento da cidade, das pessoas que não tem recursos para financiar uma formação em empreendedorismo e colocar aquele bairro no circuito de inovação da cidade”, explica.

Ele explica que o projeto “Caminhos de Pirajá” contribui com o desenvolvimento socioeconômico da região do bairro de Pirajá.

“Caminhos de Pirajá tende a colaborar com o desenvolvimento socioeconômico por meio da educação empreendedora, fortalecimento de lideranças e qualificação dos empreendimentos produtivos”, descreve.

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Paulo Henrique Oliveira
Foto: Alcimar Pacheco

Conforme Oliveira, os participantes do projeto residem e/ou trabalham na comunidade e já estão vivenciando cursos com dinâmicas, metodologias inovadoras, para aprenderem sobre empreendedorismo e liderança. “Os encontros já estão acontecendo há 6 meses, inteiramente gratuito, com atividades online e presencial”, afirma.

O coordenador relata que o projeto é dividido em três etapas:

“A primeira é o diagnóstico social, por meio de um levantamento de informações junto à comunidade, no qual são ouvidos quase 200 moradores. Em seguida, é realizada uma intervenção urbana com a revitalização de um espaço que era depósito de entulho e virou uma praça. A segunda etapa é uma jornada de formação em empreendedorismo de 6 meses com empreendedores e liderança. E a terceira, é o apoio a bancarização dos empreendedores e criação de uma rede de gestão em empreendedorismo localmente”, esclarece.

Segundo Oliveira, o projeto é em parceria com o Instituto Camargo Corrêa e optou pela localidade de Pirajá, bairro que possui mais de 30 mil habitantes, conforme o censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, pelo comportamento urbano e ausências de projetos como esse no local.

Ele diz que para fazer parte do “Caminhos de Pirajá”, o qual já passou mais de 60 empreendedores, é através de um diagnóstico na comunidade, com identificação de lideranças, indicações e processo de inscrição. Depois, é feita a análise dos candidatos e, posteriormente, acontece a seleção, como foram os casos de Larissa da Silva Dias e Loui Geovane Farias.

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