Em uma avenida do bairro Cidade Ariston, em Carapicuíba, região metropolitana de São Paulo, um letreiro nas cores preta e verde fluorescente chama a atenção de quem passa. Por fora, é possível ver a fachada de mais uma escola de desenho, mas quem passa pelos portões do local descobre que ali existe muito mais. Além de ensinar arte, a Escola Lumiart leva educação acessível aos jovens da região.
Idealizado em 2019 pelo artista e arte-educador André Gomes, o Del, 39, o espaço nasceu como uma forma de retribuir para a comunidade um pouco do que o trabalho como artista trouxe para a vida dele. “O que a arte me proporcionou de melhor foi a educação. Me possibilitou estudar e conhecer outro horizonte”, conta.
Del entrou no mundo da arte há mais de 25 anos, quando descobriram seu talento para o desenho. A partir de então passou a viver como artista e a se especializar. Fez cursos técnicos, faculdade de artes visuais e hoje é pós-graduado em história da arte.
E como testemunha do poder transformador da educação, Del, junto com a irmã Andreia Gomes, 42, decidiram que a Lumiart teria um cursinho pré-vestibular e uma biblioteca comunitária.
“Quem salva uma vida salva o mundo inteiro. Se eu conseguir garimpar alguém que ganhe a vida já vai ter valido muito a pena”, diz Del.
Com esse pensamento e juntando forças com a professora de sociologia Márcia Carvalho, 46, o cursinho para os jovens vestibulandos da região se tornou realidade.
Inspirada no trabalho do sociólogo Antonio Candido, um dos mais importantes intelectuais do Brasil, Márcia sentiu que, como aluna de universidade pública, tinha a obrigação moral de retribuir para a sociedade o aprendizado que recebeu.
“Um tempo atrás o Del e a Deia me perguntaram se eu não queria fazer uma oficina na escola. Falei pra ele que a minha a minha arte está ligada ao ensino. E o que eu gostaria de fazer era um cursinho pré-vestibular, popular e comunitário”, relembra.
Os irmãos abraçaram a ideia, a tornaram viável e, nas palavras de Márcia, “é uma sementinha que está sendo plantada e se espera que dê muitos frutos.”
“Conhecimento te faz romper com essa ideia de que porque você é periférico, tem que se manter nessa situação. E como se melhorar suas condições socioeconômicas fosse um pecado para quem nasceu na periferia. Conhecimento é a chave”, diz Márcia Carvalho.
O curso pré-vestibular da Escola Lumiart funciona de forma social. Aqueles alunos que têm condições financeiras pagam um valor simbólico que ajuda a custear algumas despesas da escola. Os estudantes que não podem colaborar são bem-vindos da mesma forma. De acordo com Del, cerca de 50 alunos passam por lá durante a semana.
Kebradoteca
Admirador de Paulo Freire, patrono da educação brasileira, Del inaugurou a Kebradoteca, uma biblioteca em que as pessoas da região podem pegar livros emprestados e expandir os horizontes. O lançamento foi em setembro de 2021, próximo ao centenário do educador e filósofo brasileiro.
“Acho que todo mundo deveria ter a possibilidade de conhecer outras culturas e ver o quanto o mundo é rico e grande. Aí a importância do livro. Às vezes esse despertar vem dali. Você fala: eu quero ir, eu quero fazer”, explica.
Para o artista, ainda falta incentivo para que as pessoas leiam e elas só precisam de um empurrão para pegarem gosto pela leitura.
“O difícil é se interessar pelos livros. Ter quem incentive e mostre que é um caminho legal. Quando a pessoa lê um livro que realmente fala o que ela queria ouvir, ela vai ler pelo resto da vida. Só precisa do livro certo”, conta.
A Kebradoteca ganhou o nome de outro ídolo de Del, o poeta Sérgio Vaz, que fez questão de estar presente na inauguração do espaço.
“Foi mágico. Ele é um cara que fala a nossa língua. A gente vai pegar um livro acadêmico e não vai entender nada. Aí vem um cara da quebrada que leu e entendeu e passa de uma forma diferente pra gente, com a nossa linguagem. Abre um leque de possibilidades”, relata.