Um dos oito filhos de uma família pobre, bailarino pensava em desistir da dança aos 15 anos de idade, quando viu uma palestra da brasileira Ingrid Silva, que o incentivou. Agora eles dançam juntos na companhia criada no Harlem, mundialmente respeitada.
Oportunidades e exemplos são tão fundamentais quanto as duas pernas do bailarino Luís Fernando Rego, 23 anos, cria do Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, que ingressou na Dance Theatre of Harlem, prestigiada companhia de Nova York.
Apesar da escassez na família de oito irmãos – mãe viúva, faxineira, doceira, vendedora de produtos de limpeza – Luís Fernando teve a oportunidade de ver a irmã dançar em projeto social, que o incentivou a ingressar no curso de dança, com o qual conquistou bolsas de estudos e se profissionalizou.
Dançou no Brasil, chegou à Dinamarca e aos Estados Unidos. No meio do caminho, teve a oportunidade de um exemplo decisivo: aos 15 anos, quando pensava em desistir da dança, assistiu uma palestra da bailarina e ativista Ingrid Silva.
Luís Fernando se identificou com “uma pessoa que veio da mesma cidade, viveu coisas parecidas, superou e venceu. Aquilo foi uma força a mais”.
Não imaginava que um dia dividiria os palcos com ela, mas a brasileira diz quase a mesma coisa sobre o parceiro na Dance Theatre of Harlem.
“Luís tem uma história lindíssima que é muito parecida com a minha. Fico muito feliz por tê-lo conhecido lá atrás, e hoje em dia ele estar dançando comigo”, compara.
Oportunidades para dançar
Quando Luís Fernando tinha 13 anos, “o balé do Faustão só tinha menina. Eu achava que só aceitava mulher”. Vendo sua irmã dançar em casa, entendeu que não. Ela era aluna do projeto ViDançar, no Complexo do Alemão. Luís Fernando caiu pra dentro.
“Vi que poderia fazer parte, me apaixonei, gostei dos exercícios”. A formação o preparou para a Escola Estadual de Dança Maria Olenewa, oferecida pelo Theatro Municipal do Rio de Janeiro.
Foi lá que assistiu a palestra de Ingrid Silva. No passo seguinte, em 2017, Luís Fernando consegue bolsa integral na Escola do Teatro Bolshoi no Brasil, em Joinville (SC). Formado, atua na Companhia Jovem do Bolshoi.
Mas não fica por muito tempo. Em meio à pandemia de covid-19, Luís Fernando atravessa o oceano Atlântico. Foi atuar no Tivoli Ballet Theatre, em Copenhagen, Dinamarca. Era a primeira experiência internacional.
“Vi a oportunidade de sair do Brasil e fazer parte de um lugar economicamente muito bom”. Ele disse “quero estar lá, vou estar lá”, e ficou por três anos. Até que uma coincidência, em janeiro de 2023, o levaria para os Estados Unidos.
“Tem espaço pra mim”
Visitando um amigo em Nova York, Luís Fernando soube da seleção na Dance Theatre of Harlem, histórica companhia fundada em uma garagem no Harlem, em 1969, como projeto social.
“Fui sem a pressão psicológica de fazer tudo certo. Fiz a audição, foi tranquila”. Passou. Começaria em maio de 2023, mas outra coincidência adiou para 2024 o início nos EUA: demorou nove meses para resolver a burocracia da mudança, tempo necessário para curar uma lesão.
“Os primeiros meses estão sendo incríveis, tive oportunidade de conhecer a irmã do Michael Jackson. Estive na Califórnia, Virgínia, Massachussets, Boston, nunca pensei em conhecer. Vim de um lugar super humilde. Eu falei é possível, tem espaço para mim”.
E trabalho. A Dance Theatre of Harlem se apresenta de janeiro a janeiro. “Viajamos demais, nossa agenda se expande”. No dia da entrevista, dada dentro da van que o levava ao ensaio, Luís Fernando tinha dois espetáculos.