Com escala 6x1, tempo é um luxo que periféricos na universidade não podem ter

Em instituições privadas, onde estuda a maioria, a regra é trabalhar para pagar o curso. Mal dá tempo de frequentar as aulas

15 nov 2024 - 16h10
Protestos contra escala 6x1 aconteceram em cidades como São Paulo, na Avenida Paulista, e no Rio de Janeiro, na Cinelândia (foto).
Protestos contra escala 6x1 aconteceram em cidades como São Paulo, na Avenida Paulista, e no Rio de Janeiro, na Cinelândia (foto).
Foto: Tânia Rego/AB

Não gosto de começar dando as credenciais, mas num tempo em que todo mundo é especialista em tudo, até analfabetos em Educação, preciso dizer que sou professor de faculdade há 15 anos.

Nesse período, chegaram às minhas aulas jovens periféricos que alcançaram a universidade, a maioria em instituições particulares na capital paulista e Região Metropolitana.

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Venho constatando, entre outros motivos – inclusive o desinteresse e a autossabotagem –, que a escala de trabalho 6x1 é uma grande dificuldade para atender ao mínimo de tempo que um curso superior exige.

Dando aulas para estudantes que trabalham seis dias por semana em shoppings, redes de lanchonetes, no comércio e similares, escuto constantemente, e sei que é real, a reclamação sobre a falta de tempo.

Com a escala 6x1, escravizante, estudar é um luxo que jovens periféricos não podem se dar. A vida é gasta basicamente no seguinte:

Trânsito: pode colocar umas quatro horas;

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Trabalho: em geral, oito horas. Foi metade do dia. Aí vai pra faculdade.

Faculdade: três horas, mais ou menos de sete até dez da noite.

Foram 15 horas.

Nessa conta apertadinha, sobrariam nove horas para fazer outras coisas. Mas quem é do corre em São Paulo sabe que não dispõe de nove horas livres por dia.

Falta tempo para o básico, como ler textos indicados pelos professores e fazer trabalhos. Na maioria dos cursos de graduação, são de três a cinco disciplinas por semestre.

Aí vem o meritocrata e diz “tem que estudar no dia livre, varar madrugadas”. Não tem, embora há quem faça, pelos motivos mais justificáveis do mundo.

Sabe qual a utopia? Ter tempo para descansar corpo e mente, ler um livro, ir ao cinema, construir de fato uma formação cultural mínima.

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Mas nem a formação para a qual a pessoa está se formando é plenamente possível. E não por dilemas educacionais profundos, complexos, não; simplesmente pela falta de tempo, uma questão cruamente matemática, lógica.

Não sei se, dado o eventual passo civilizatório da abolição da escala 6x1, o ensino superior vai melhorar.

Mas com certeza o professor poderá cobrar mais, em contexto mais favorável, e poderá, inclusive, rechaçar desculpas esfarrapadas de quem não corre atrás, mas usa a real dificuldade alheia para justificar sua inação.

Fonte: Visão do Corre
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