Uma pesquisa nas redes sociais sobre a Escola Olodum, que funciona na Rua das Laranjeiras, 30, Pelourinho, em Salvador, Bahia, aponta para o seu pioneirismo na educação antirracista no Brasil, através da música, da dança e do canto, como expressões de arte e cultura afro-brasileiras, impactando mais de 35 mil crianças e adolescentes. Isso, há 40 anos.
A instituição é vinculada ao bloco afro Olodum, fundado em 1979, e atende 850 alunos entre sete e 29 anos. A maioria são meninas de bairros periféricos de Salvador, do Subúrbio Ferroviário e do Centro, onde é comum problemas de infraestrutura urbana e vulnerabilidade social.
Apesar do acervo robusto encontrado sobre a escola na internet, nada se compara à experiência de assistir alunos, diretores e professores exibirem sua arte em cena e ouvir suas histórias de vida, forjadas pela instituição. A emoção da batida forte dos tambores e corações da comunidade escolar, além do cortejo entre os casarões centenários do Pelourinho, um dos berços da presença africana na primeira capital do país, é indescritível.
Essa foi a experiência vivida pelo público que lotou a Praça das Artes, no Pelourinho, em 25 de outubro, para celebrar os 40 anos da Escola Olodum, com o inédito espetáculo musical de rua Diamantes da Cidadania.
O espetáculo contou a história da instituição alternando performances de percussão, canto e dança, em reverência à ancestralidade. Houve esquete teatral representando a dinâmica dos debates em sala de aula, sobre a história da resistência negra e os protestos contra crimes raciais.
Pretas e pretos como o poder de Salvador
Na abertura do evento, os presidentes Marcelo Gentil e Jorge Ricardo Rodrigues destacaram os frutos colhidos pela escola desde a criação. “A escola ensina as pessoas a sonharem, ter asas e voar”, afirmou Gentil.
Jorge Ricardo Rodrigues, enfatizou o legado social do trabalho. “Esse projeto surgiu em minha casa, pensado por meus pais, para abrir oportunidades. Na década de 80, éramos considerados marginais. Ser aluno da Escola Olodum é ter um lugar para voltar, ter poder.”
A diretora geral, Linda Rosa Rodrigues, graduada em Direito e especialista em Marketing Digital e Mídias Sociai, é egressa da escola, como a maioria dos diretores e professores. “A gente educa, conscientiza, empodera e cria um ambiente em que os alunos possam mostrar os talentos lapidados durante esse processo.”
Aluno faz sua primeira apresentação
Enzo Miguel Ribeiro de Castro, 11 anos, mora em Cosme de Farias. Entrou neste ano no curso de percussão e está feliz com sua primeira apresentação, no aniversário dos 40 anos da escola.
Jane Quele Ribeiro dos Santos, mãe de Enzo, fez a cobertura fotográfica de todas as atrações da festa. “A escola ajuda muito na disciplina, cobra bom comportamento, oferece muito aprendizado e cultura, dá oportunidade de estar em muitos eventos.”
Professor ressalta senso de pertencimento
O professor de percussão Geraldo Magalhães Marques, 32 anos, estudante universitário de música, morador da Federação, ressaltou o papel da escola no fortalecimento da identidade dos alunos: é um componente educacional que eleva o senso de pertencimento e a consciência sobre questões históricas e culturais.
“Essa experiência me fez aprimorar habilidades e competências e aplicar no meio social e profissional. A escola abriu portas para minha carreira nas artes e na cultura. Tenho compromisso com a comunidade e a consciência do meu papel no desenvolvimento da juventude”, afirma.
Para secretária, arte potencializa talentos
Naiane Bonfim, 32 anos, moradora da Liberdade, graduada em Psicopedagogia Institucional, é secretária da escola. Estudou canto e dança afro e reconheceu que, nas aulas de liderança e juventude, conheceu mais sobre racismo, valorizou sua história e a cultura afro-brasileira.
“Eu me tornei uma mulher forte, posso ir aonde quero, fazer pós-graduação, atuar na área que quiser. As experiências vividas na escola foram importantes para mim, como mulher e profissional”, destaca.
Escola abre caminhos
A publicitária e musicista Thais Santos, 35 anos, moradora do Tororó, é fruto da formação da Escola Olodum, onde fez curso de fotografia e marketing digital em 2020. Hoje é professora de canto. Ela lembra que pessoas chegam com a autoestima muito baixa ou sem entender de que mundo fazem parte.
“Poder fazer parte da vida dessas crianças e adolescentes é um caminho, a escola abre e salva caminhos, é persistência e resistência. O retorno de meus alunos é incrível, crianças que começam a se desenvolver, a se reconhecer como pessoas negras, resistentes, como quem pode, consegue, e é.”
Projeto pedagógico é político
A Escola do Olodum foi a primeira instituição de ensino a incorporar as diretrizes da Lei 11.645/08, que incluiu no currículo a obrigatoriedade de abordar a história e a cultura afro-brasileira e indígena no Brasil.
No contraturno da escola formal ou da universidade, os cursos culturais da escola oferecem dança, canto e percussão, além de formação para a cidadania. O seu projeto político pedagógico é inspirado em modelos educacionais de Cuba, Angola e Guiné Bissau.
A escola incentiva os talentos e a formação de lideranças. O ensino ultrapassa o toque do tambor, com atividades que valorizam o potencial de crianças, adolescentes e jovens, por meio de linguagens que estimulam a inclusão social e digital, trabalhando paralelamente a questão da cidadania.