Pessoas negras costumam se destacar em diversas práticas esportivas, mas não são em todas que a maioria da população está representada. O esporte de aventura, também conhecido como esporte outdoor, é um nicho esportivo que ainda é pouco conhecido entre negros e negras. Para difundir esta prática, que é comparada a um estilo de vida, nasceu em 2020 o grupo Negritude Outdoor, que divulga as conquistas de aventureiros de todo o Brasil e promove eventos de várias modalidades voltadas para pessoas negras.
Fruto do engajamento de dois amigos, o sociólogo Denilson Silva e o designer Leonardo Ferreira, o coletivo Negritude Outdoor reúne pessoas que praticam as mais variadas modalidades de esportes de aventura, dentre elas montanhismo, escalada, corrida extrema, rapel e trekking. Também é voltado para pessoas amadoras e entusiastas que simplesmente gostam de estar na natureza.
“O coletivo surge de um questionamento sobre a presença de pessoas pretas nos espaços dos esportes e atividades outdoor (ao ar livre), no Brasil, que é rara, e quando existe é pouco mostrada e incentivada. Queremos ver pretas e pretas se divertindo, criando, empreendendo, competindo nos esportes e atividades outdoor, e conscientes que esse espaço também é nosso”, diz Denilson Silva.
No final de 2020, a Google realizou um estudo com 2 mil brasileiros e descobriu que entre março e novembro, as buscas por exercícios em casa cresceram duas vezes, além de um aumento no interesse por ciclismo (+144%) e natação (+230%). Segundo a pesquisa da consultora especializada Sport Track, 39% do público declara ter começado a praticar algum esporte novo no período, com destaque para caminhada (23%), corrida (18%) e bicicleta (10%). O estudo ainda mostra que a porcentagem dos que declaram praticar esportes cresceu de 58% em 2018 para 69% em 2020.
O desejo de estar perto da natureza, que já era uma tendência e referência de bem-estar, ganhou ainda mais importância ao longo da pandemia. O estudo mostra que 41% dos brasileiros se exercitam ao ar livre e 23% buscam artigos para atividades externas. Nesse ambiente, esportes individuais, como surf e skate são os grandes destaques, registrando crescimento de 672% e 550%, respectivamente, nas buscas nos últimos cinco anos.
Denilson afirma que a maioria das atividades e esportes outdoor são em grupo ou demandam que as pessoas tenham, de alguma forma, que adentrar a um nicho. “Muitas vezes, furar esta bolha é bem difícil, principalmente, quando não há pessoas iguais a você lá dentro. Tem sido legal ver como o coletivo [Negritude Outdoor] tem crescido e um ajudando o outro a encontrar melhores caminhos e também novos caminhos, é um quilombo”, comenta o atleta.
O grupo surgiu na pandemia e, desde então, tem colaborado para que mais pessoas negras possam se conectar e praticar atividades ao ar livre em segurança. “Nós, literalmente, colocamos negros e negras no topo. Pode ser no topo de uma montanha, nós estaremos lá”, conta.
Segundo o Censo do Montanhismo, realizado entre dezembro de 2020 e janeiro de 2021, o perfil geral do montanhista brasileiro é predominantemente formado por homens (69,93%), brancos (73,81%), entre 31 a 40 anos (41,81%), casados (45,33%), que vivem na região sudeste do Brasil (63,20%), com graduação completa (57,09%). A pesquisa foi Idealizada pela montanhista Giselle Melo, atual presidente do Centro Excursionista Mineiro e da Federação de Montanhismo e Escalada de Minas Gerais.
Em maio de 2021, a montanhista brasileira Aretha Duarte se tornou a primeira mulher negra e latino-americana a chegar ao topo do mundo, o Monte Everest. Ela é uma atleta profissional de montanha nascida na cidade de Campinas (SP). Para conseguir chegar até lá, Aretha recolheu 130 toneladas de lixo reciclável para financiar parte do valor necessário. Alguns patrocinadores ajudaram a completar o montante de 400 mil reais. Hoje, ela está rifando o seu carro a fim de publicar um livro sobre a sua história.
Outro atleta de destaque é o paulista Carlos Dias, profissional da corrida outdoor. Ele soma 28 anos de jornada e 148 mil quilômetros percorridos em todos os continentes, desde o lugar mais frio do planeta, a Antártida, ao lugar mais quente, o deserto do Saara, passando pelo mais úmido, na Mongólia, e o mais seco, no Atacama. Além do Nepal, vulcões do Equador, savanas da Ilha de Madagascar, florestas do Sri Lanka e a floresta Amazônica. Esse ano ele completou a Namib Race, uma prova de 250 km de corrida extrema realizada na Namíbia, país da África Austral.
O grupo Negritude Outdoor compartilha histórias como essas, de pessoas que estão na elite do esporte, mas é voltado para praticantes e entusiastas não profissionais. Em fevereiro do 2022, o coletivo vai realizar o primeiro encontro para escaladores negros do cerrado. O evento acontece em Brasília e pretende reunir pessoas negras para escalar ao ar livre. O encontro contará com uma oficina gratuita de iniciação à escalada esportiva oferecida pelo atleta Rafa Rebello. As inscrições já estão abertas e podem ser feitas pelo Instagram do próprio coletivo e das empresas parceiras.