'O funk foi uma mãe que me abraçou quando eu mais precisava', diz MC Lalão do TDS

Larissa Manoel é de Taboão da Serra, cria do funk paulista e fala sobre carreira, novo lançamento, machismo na música e sobriedade

1 set 2023 - 05h00
(atualizado às 11h41)
MC Lalão do TDS lançou em 2023 o clipe “Mandraka Siliconada”
MC Lalão do TDS lançou em 2023 o clipe “Mandraka Siliconada”
Foto: Bruna Custódio/Divulgação

A caneta tem sido a munição de Larissa Manoel, a MC Lalão do TDS, 26, desde quando começou a frequentar as primeiras batalhas de rima na cidade de Taboão da Serra, na Grande São Paulo - cuja sigla ela carrega em seu nome de artista. Resistência no funk consciente e feminino, Lalão já tomou “muito socão na cara” e faz da música sua aliada.  

Mulher preta, sapatão e periférica, sua luta também é contra a dependência química. E foi no funk que ela conseguiu expressar as narrativas sobre suas identidades, paixões, referências, além de encontrar conforto e um propósito de vida. 

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“O funk foi uma mãe que me abraçou no momento que eu mais precisava, me salvou. Sempre falo muito nitidamente disso, porque rola uma marginalização que o funkeiro é só envolvido com droga. É uma contrapartida totalmente diferente: o funk é que me tirou da droga”, diz a MC, que está há mais de dois anos e seis meses sóbria. 

Ela conta que tem outras ferramentas de tratamento nesse processo, mas ressalta que o funk foi um alicerce desde 2020. “Demorou pra eu entender que longe dos b.o. é bem melhor de se viver”, cantou na letra de “Princesa do Gueto” (2021). 

“A arte foi uma coisa que me deu um sonho. Sempre estive nesse meio, mas nunca olhava a música como olho hoje. De falar: ‘mano, é isso que eu quero pra minha vida’. E dá pra fazer isso sem precisar estar locona ou se destruindo, tá ligado?”, explica, em entrevista ao Visão do Corre

Esse marco na recuperação de Lalão coincide também com o lançamento de seu último single, “Mandraka Siliconada”, que ganhou um clipe finíssimo realizado por muitas mulheres, trazendo uma atmosfera de aventura e grau, destacando um amor maloqueiro e revolucionário. 

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Dirigido e produzido por Pétala Lopes e Luíza Fazio, o clipe foi feito de forma voluntária por uma equipe de mais de 40 pessoas, principalmente LGBTQIAP+. “Foi um projeto independente, a gente não teve patrocínio nem uma grande produtora por trás. Tínhamos uma verba mínima para transporte e alimentação e a gente usou das redes sociais pra perguntar quem queria somar”, conta Luíza.

Sobre a canção, Pétala destaca a importância de visibilizar histórias sobre mulheres e mulheres que amam mulheres. “Duas meninas numa moto é uma ação política. Acho que é além da aventura, é celebrar o bom viver. Levar uma mulher pra passear numa sociedade que ensina a gente a amar homens e odiar mulheres é muito revolucionário”, comemora. 

Perceptível em “Mandraka Siliconada”, Lalão costuma trazer muito de sua vivência, inverter papéis e desafiar estereótipos de gênero ao escrever suas letras. “Por ser uma mulher lésbica não feminina, sempre tentam me colocar como o ‘homem da relação’, pegadora, etc. Quando dei seguimento à música, fui me tirando desse estereótipo de ser eu a menina que estaria na moto, que buscaria a outra mina, pra ser a mulher que foi buscada em casa, que é levada na garupa e que fica impressionada.”

Passeio na moto durante o clipe “Mandraka Siliconada”
Foto: Marcela Guimarães/Divulgação

A partir das últimas experiências, a MC pretende mesclar a linha do funk consciente com outras temáticas mais ousadas, driblando o lugar sexualizado e objetificado que geralmente os clipes de funk colocam as mulheres. Falar sobre putaria, segundo ela, não é um problema (nunca foi nem nunca será) dentro da cena, mas é necessário trazer um olhar diferenciado – menos masculinizado – quando o assunto é sexo e prazer.  

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Machismo dentro do funk

O machismo é justamente um tema bastante espinhoso dentro do funk. “Racionais fala que ‘por você ser preto, você tem que ser duas vezes melhor’, ainda mais eu sendo mina.”

“Preciso provar que canto bem, que sei fazer o bagulho. Tem que vir uma parada minha muito boa pra falarem ‘caralho, mano, você é zica’. Diferente de como funciona pra homem. É muito mais simples aceitarem o trabalho, fazer a música, ter um kitzinho, aquele olharzinho que a sociedade gosta e já era”, desabafa. 

Apesar disso, ela acredita que há um movimento muito forte de mulheres produzindo funk de forma independente. “Vejo várias minas também metendo marcha, não precisando de p***a nenhuma ou de produtora, fazendo as paradas sozinhas.” 

Foi assim, na coragem, que ela também passou a escrever letras de funk. “Vou criar essa parada da forma que eu quero ouvir eu vou fazer o que eu quero escutar, tá ligado? Foi nesse pensamento que eu pulei pra bala de começar a escrever funk”, relembra Lalão. 

Nas letras, funkeira costuma inverter papéis e desafiar estereótipos
Foto: Marcela Guimarães/Divulgação

E ela segue com "muita fé na caminhada", tomando o seu espaço dentro do funk e fazendo da sua música uma inspiração para outras pessoas. “É cantar sobre uma outra perspectiva de vida pra quem ouvir. O funk é como minha arma, minha potência e com ele quero continuar mudando a minha vida.”

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Fonte: Visão do Corre
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