Deputado mais votado no estado de São Paulo, com mais de 1 milhão de votos, Guilherme Boulos (PSOL) quer transformar as pautas que ele já carrega na atuação como líder do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) em políticas públicas.
Em entrevista concedida à Agência Mural no último sábado (22), Boulos contou que suas prioridades na Câmara Federal será um projeto de lei inspirado nas Cozinhas Solidárias, iniciado pelo MTST durante a pandemia, além da retomada do Minha Casa Minha Vida, como resposta à questão da moradia popular, principal causa do movimento.
Enquanto janeiro - mês em que tomará posse como deputado federal - não chega, ele segue focado na atuação como coordenador da campanha de Lula (PT) no estado de São Paulo.
No domingo (23), ele esteve ao lado do candidato ao governo do estado Fernando Haddad, do deputado estadual eleito Eduardo Suplicy (ambos do PT) e de Geraldo Alckmin (PSB), vice-presidente na chapa de Lula, numa carreata que foi do Jardim Ângela ao Campo Limpo, na zona sul da capital.
A reta final de campanha tem como foco a periferia, com eventos previstos em regiões como o Jardim São Luís, também na zona sul, e Cidade Tiradentes, no extremo leste.
Para Boulos, a expressiva votação que recebeu em bairros periféricos de São Paulo - assim como Lula e Haddad - são reflexos da "urgência de mudança que o povo pobre vem passando neste momento".
Confira a entrevista completa:
Agência Mural: Como está sendo esse segundo turno para você?
Guilherme Boulos: Nós tivemos uma votação muito expressiva, fui o deputado federal mais votado [no estado] de São Paulo. E com muito orgulho também o deputado federal mais votado nas periferias da cidade de São Paulo, e estou neste segundo turno totalmente dedicado a fazer a campanha do Lula e do Haddad.
A agenda desta última semana de campanha está bem focada nos bairros periféricos e em algumas cidades da Grande São Paulo. Por que essa escolha?
Nós tivemos um nível de abstenção [em números absolutos, não em percentual, como aponta essa reportagem da Agência Mural] nas periferias que foi alto. É muito importante que essa abstenção se reduza no segundo turno.
Quem mora em comunidade, quem mora nas periferias, seja de São Paulo ou de qualquer outra cidade brasileira, em sua maioria votou no Lula. Porque sabe o que está em jogo, sabe o que sofreu nesses quatro anos de governo Bolsonaro, com arrocho salarial, com inflação, com a piora das condições de vida e com a destruição dos programas sociais.
É muito importante dialogar com essas pessoas para que votem, para que convençam seus familiares, vizinhos, amigos a votarem. A caravana "vira voto" que estamos fazendo passou pelo interior de São Paulo, que é uma outra realidade, mas já passou por vários bairros da periferia da capital e da região metropolitana, e nessa última semana [antes do segundo turno] nós vamos focar nesta região .
As recentes falas do Bolsonaro sobre as populações periféricas, associando à criminalidade, principalmente depois da visita do Lula ao Complexo do Alemão, pesou na escolha por esses bairros de alguma forma?
O Bolsonaro detesta o povo pobre. Ele tem preconceito, para ele quem mora em favela é ladrão, é bandido, ele disse isso em mais de uma ocasião. As pessoas sabem disso. E a maior parte do povo pobre também detesta o Bolsonaro por tudo que ele representa.
É muito importante nessa reta final, em uma eleição tão decisiva para os próximos quatro anos e para as próximas gerações no Brasil, que a voz do povo das periferias e das favelas se expresse nas urnas
Como está sendo a conversa com quem se absteve ou anulou o voto no primeiro turno?
Nós temos duas razões para a abstenção e voto nulo. No caso da abstenção, uma das razões inclusive é a dificuldade financeira, tem muita gente que não tem o dinheiro da passagem de ônibus, por isso a batalha para que a gente tenha passe livre no dia das eleições.
A Prefeitura de São Paulo liberou o passe livre em ônibus municipais, das 6h às 20h, para o segundo turno das eleições. A decisão foi tomada na tarde de segunda-feira (24).
A outra razão, aí no caso do voto nulo, é o sentimento de antipolítica, de pessoas que não querem saber de briga política, que entendem isso como uma coisa que não tem a ver com a vida delas.
O diálogo que nós estamos fazendo é mostrar que essa eleição não é simplesmente uma briga entre dois candidatos, dois partidos, esquerda e direita. Essa eleição é a possibilidade do povo trabalhador, do povo mais pobre do Brasil voltar a ter tranquilidade, oferta de emprego e dignidade.
E pensando na questão do "vira voto", ainda é possível convencer eleitores nessa última semana de campanha? Como fazer isso?
É possível sim, você tem de um lado um bombardeio bolsonarista com fake news, com uma grana incrível que receberam de grandes empresários, do agronegócio, fazendo impulsionamento de redes sociais todos os dias.
E do lado de cá nós temos, além da atuação em redes, da atuação do Lula que mobiliza muita gente por onde passa, gente de carne e osso, engajada, que acredita, que sonha. Com essas pessoas indo às ruas, conversando com mais gente, nós temos todas as condições de virar voto.
Precisamos entender o seguinte: o Lula teve 57 milhões de votos no primeiro turno. Se um décimo das pessoas que votaram no Lula, cada uma conseguir um voto novo, nós ganhamos essa eleição.
Você falou sobre a votação expressiva que recebeu nas periferias, tal como o Lula e o Haddad. Por que você acha que isso aconteceu?
Tivemos uma votação forte na periferia primeiro por uma atuação de mais de 20 anos em movimento social na zona sul, leste e norte de São Paulo, com muita força.
Uma atuação com trabalho de base, de construção de lideranças. Ela se reflete no ponto de vista eleitoral, tanto é que na eleição para prefeito há dois anos, no segundo turno, nós ganhamos em vários distritos da periferias.
O povo pobre tem mais urgência de mudança. As pessoas mais pobres sabem como está difícil ir ao mercado e não conseguir encher um carrinho, ir no açougue e não conseguir comprar uma carne
Nossa atuação e a minha candidatura para deputado também foi uma candidatura anti-Bolsonaro, ligada à campanha do Lula e pela mudança.
Já pensando no seu mandato ano que vem, quais serão as pautas que você pretende priorizar lá no Congresso?
Nosso foco vai ser o combate à desigualdade. Tem dois pontos que para mim são muito prioritários. O primeiro é o combate à fome. Nós [do MTST] fizemos durante a pandemia, através da luta e do movimento social, da solidariedade das pessoas, o projeto das Cozinhas Solidárias. São 35 cozinhas instaladas nas periferias do país e que já serviram mais de um milhão de refeições.
Queremos que isso se torne política pública e eu vou apresentar um projeto de cozinhas solidárias, no combate emergencial à fome e ligado à agricultura familiar.
Nossa segunda questão é o tema da moradia, que é o tema no qual eu atuo já há bastante tempo junto com meus companheiros do MTST. O Bolsonaro destruiu o Minha Casa Minha Vida e nós vamos apresentar um novo programa de habitação para o Brasil.
A população em situação de rua tem crescido de forma absurda não só em São Paulo, as pessoas que moram em áreas de risco, que não conseguem pagar aluguel. Vamos apresentar um programa de moradia popular
E como vai ser a articulação com os demais deputados da Câmara e principalmente com o Senado, que estará mais à direita ainda a partir de 2023?
Boa parte tanto da Câmara como do Senado é o centrão. O bolsonarismo tem a sua base nas duas casas, assim como a esquerda também tem. No governo do Lula, eu acredito que é muito difícil que esses setores vão se colocar para a sociedade como contrários a dar casa para o povo e comida para as pessoas. Eu acho que é muito possível que a gente consiga construir uma maioria para esses projetos fundamentais.
Agência Mural