Como está a saúde mental dos jovens nas periferias?

Em meio aos dilemas e problemáticas próprios da idade, jovens periféricos lidam com a violência e desigualdade social

28 jun 2022 - 11h47
Foto: (Coletivo Rua/Tércio Teixeira).

A adolescência tem problemáticas que por si só já são complexas demais para enfrentar sem qualquer acréscimo, tudo é muito intenso, quem já passou entende, quem está passando, ou ainda vai passar, tem a sensação de vivenciar o fim do mundo. Lidar com o furacão instável de emoções, comuns para o período é, ainda mais difícil para quem vive nas favelas.    

Um jovem periférico encontra dificuldades em equilibrar os próprios sentimentos e dilemas internos, com fatores como violência e desigualdade social, quase sempre presentes em seu cotidiano. Este é o caso de Cássia Pio, 17 anos, moradora da Favela do Carneiro em Mauá, cidade do ABC Paulista, “É complicado tentar resolver tudo sozinha, guardar tudo, tem a escola, tem a família, a gente vê os amigos passando por situações ruins e a gente não pode ajudar, dificuldade pra todos os lados, todo mundo precisando de ajuda”, desabafa a adolescente.

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Ainda sobre os problemas externos ocasionados pela vivência nas comunidades, estes surgem de diversas formas e são os vilões quando se pensa na saúde mental dos jovens periféricos, Cássia relata que os irmãos, de 14 e 19 anos, passam e irão passar pelo mesmo ciclo que ela, “Tudo se repete, como um ciclo, os problemas vão ser os mesmos pra quem vive aqui. É violência, energia faltando todo dia, enchente sempre que chove e, por aí vai, a gente chora sozinha e tenta ficar bem. Falar de depressão aqui ainda é um tabu”, comenta.

Os jovens de periferia incorporam responsabilidades sociais aos próprios anseios pessoais e isso realmente os adoece mentalmente. De acordo com a Psicóloga Ana Maria Oliveira, idealizadora do projeto Humana.Mente Psi, que leva atendimento psicológico a moradores das periferias de Belo Horizonte, atualmente não existe saúde mental dentro das favelas, “O adoecimento psíquico é real, a juventude está perdida, isolada, sem perspectiva e com medo do futuro. O choro, a angústia e a solidão são relatos constantes”, relata.

Ana Maria declara que quando o jovem decide ir atrás de ajuda, o sistema muitas vezes é caótico e não facilita o auxílio adequado. “Quando alguém faz uma visita à Unidade Básica de Saúde - UBS local, levando uma queixa de algum sintoma, lhe é dada uma receita de ansiolítico ou antidepressivo. Nesse mesmo local a pessoa também é orientada a deixar a receita na recepção para que seja renovada ao final do uso do medicamento sem nenhum acompanhamento psicológico ou psiquiátrico, comenta.

Falta auxílio do Estado para atuar em favor da saúde mental de quem vive nas periferias.
Foto: (Fabio Teixeira/Getty Images).

Quanto ao respaldo psicológico que o Estado poderia proporcionar a estes jovens, Ana é enfática, “Infelizmente o sistema não está preparado para suportar a demanda e também parece não estar interessado em agregar parceiros para suprir essa falta. Tudo que temos é lindo na teoria, mas, na prática, não se aplica”, pontua a psicóloga.

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Enquanto isso, iniciativas sociais como o “Saúde Mental na Periferia, Como Vamos?”, da Agência de Notícias das Favelas (ANF), atuam diretamente no enfrentamento dessas questões. O projeto tem foco nas mulheres e para além de atender, mapeou o estado da saúde mental da população em situação de vulnerabilidade social e, contribúi para a conscientização da proteção à mulher.

Se depender do André Fernandes, fundador da Agência de Notícias das Favelas, projetos assim serão cada vez mais frequentes nas favelas,  “No futuro a pesquisa pretende continuar falando e representando o que importa e as reais necessidades do povo periférico de todo o Brasil”, afirma André.

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