Copa do Catar deve ir muito além das diversas tecnologias que os anfitriões instalaram nos estádios e ao redor de Doha e outras cidades-sede do torneio. Este será um Mundial marcado pela digitalização do conteúdo produzido não só por veículos de imprensa, mas por influenciadores e marcas que têm, cada vez mais, tentado rejuvenescer a forma que se comunicam para atrair a atenção e audiência das novas gerações.
Nesse cenário, o Brasil terá, pela primeira vez em Copas, uma influenciadora preta como um dos destaques da cobertura digital, que conta com nomes de peso no cenário, como Fred e Casimiro. A fluminense Bianca Santos, de 25 anos e nascida em Petrópolis, é uma das apresentadoras do canal Desimpedidos, um dos maiores perfis sobre futebol no País, com mais de 9 milhões de inscritos só no YouTube. Ela ficará no Catar até o fim do torneio criando conteúdos para o canal, para marcas e para seus perfis.
Já a CBF criou o projeto "Nossa Seleça" e terá no Catar outros influenciadores, com mais de 100 milhões de seguidores nas redes sociais. Bianca foi convidada pela agência NWB a viver em uma casa com outros influenciadores brasileiros em Al Sakhama, localizada ao norte da cidade de Lusail. "Minha relação com o futebol se deu por conta de ser criada sozinha pelo meu pai. Apesar de ele ser flamenguista, não é de torcer, ir ao estádio. Isso me intrigava e acabei me interessando pelo universo do futebol para entender por que ele parecia desinteressado", conta Bianca, que sem saber que viraria uma criadora de conteúdo digital, procurou pela internet, aos 11 anos, um time do Rio para torcer.
"A primeira opção que gostei foi o Vasco, mas o time tinha acabado de ser rebaixado à Série B e eu queria um clube que estivesse na Série A. Nessa época, uma amiga minha torcia para o time, tinha até tatuagem e me influenciou".
Com 15 anos, Bianca foi viver na Cidade de Deus junto de sua madrasta na época e as irmãs. Ela demorou para se habituar à nova vida, apesar de considerar a mudança benéfica.
"Tive um período de tristeza e encontrei alegria e conexão comigo mesma na primeira vez que fui a um jogo do Fluminense no Maracanã, em 2013. Eu ia sozinha e muita gente estranhava ou perguntava se eu não tinha medo por conta do histórico de violência do estado no futebol. Com o tempo, alguns amigos começaram a me incentivar a falar sobre os jogos e em 2017 criei os primeiros conteúdos voltados para futebol na plataforma Snapchat."
A carioca percebeu que suas redes começaram a crescer e as pessoas, a gostar de ver o clima das arquibancadas que ela trazia nos vídeos. Durante a pandemia, criou um canal no Instagram, hoje com 48 mil seguidores, e só então começou a ter ideia do que a sua vida tinha se transformado, apesar de não acreditar que pudesse trabalhar só com internet.
"Só percebi que era possível quando o perfil do Desimpedidos começou a me seguir e em 2021, me fez um convite para ser uma das apresentadoras do canal. Só que era preciso me mudar para São Paulo e foi um choque para mim. Como não tenho medo de encarar as situações, decidi me mudar, sair do emprego que demorei para conseguir e viver sozinha pela primeira vez".
CHOQUES CULTURAIS
Assim que recebeu o convite para viajar a trabalho ao Catar, a influenciadora digital ficou apreensiva. Mas como já enfrentou muita coisa na vida, como o preconceito, aceitou.
"Me assustei um pouco com o que li, mas desde que cheguei, não me senti tão mal quanto pensei que ficaria. Percebo que as pessoas daqui estão sendo solícitas, mas me incomoda o fato de eles agirem assim por sermos turistas."
Bianca cita que os moradores do Catar, sejam nativos ou estrangeiros muçulmanos que vivem aqui, estão tentando ser flexíveis em alguns pontos que dizem respeito à cultura islâmica, como a exposição do corpo, considerado pecado e imoral.
"Fui gravar um dia na rua e como estava de shorts e uso tranças coloridas, senti alguns olhares de julgamento, de ser algo que não estão acostumados. Mas não vi nenhum policial pedir para mim ou outra mulher para cobrir as pernas ou ombros".
Ela também veio com uma coisa certa na cabeça: "Não tem preconceito que já não tenha sofrido no Brasil. Para mim, é uma cultura ruim para as mulheres. Vi cenas de famílias locais na praia onde o homem e o filho brincavam na areia e a mulher toda coberta e sem fazer nada. Isso em um calor enorme. Temos que respeitar a cultura daqui, apesar de ser um choque cultural bem grande".