Drag queens do Jardim Romano montam coletivo e aproximam comunidade

Dhiana D’Água e Warralla Blackberry contam suas trajetórias na arte drag na zona leste de São Paulo

23 jul 2023 - 05h00
Integrantes do coletivo Acuenda no Arraiá das Drags de 2022
Integrantes do coletivo Acuenda no Arraiá das Drags de 2022
Foto: Divulgação

Em 2013, o ator Bruno Fuziwara, 30, aprendeu a se maquiar e começou a produzir espetáculos vivendo a drag queen Dhiana D' Água. “Não sabia nada desse universo [drag]. Depois da primeira vez que me montei, quis me montar outras vezes e passei a investigar tudo sobre arte drag”, conta. 

Dhiana foi batizada pelo diretor de teatro Renato Carrera quando fazia parte do grupo Estopô Balaio. Moradora do Jardim Romano, na zona leste, ela explica que o nome é uma referência a uma deusa, na mitologia romana, enquanto o sobrenome remete à força de sobreviver às enchentes recorrentes na região.  

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Com o objetivo de estimular o debate sobre diversidade de gênero e de orientações sexuais no bairro, em 2014, Dhiana ajudou a fundar o coletivo Acuenda, que comemora nove anos em 2023. 

O nome do grupo, formado por cinco moradores da região, também é cercado por simbolismos. O termo vem do verbo acuendar, gíria usada popularmente, principalmente por drag queens e travestis, para o ato de esconder o genital masculino. Porém, Dhiana explica que a expressão foi ressignificada. 

“Hoje, a gente pratica o desacuenda. Não se esconder, não o fato do genital, mas o fato de falar, de sair para a rua. A gente tem que desacuendar no mundo”, pontua.  

O Acuenda resgata a história da arte drag queen nas periferias e valoriza artistas LGBTQIAPN+ por meio de produções em diversas linguagens. A partir dos eventos produzidos, e do interesse das crianças, os moradores do Jardim Romano se aproximaram do coletivo. 

“Hoje, os pais e as mães das crianças vêem o que é um arte drag. Já ouvi: ‘Ah, eu não vou para o culto não. Vou ficar no Cabaret’. Ficar aqui no nosso Cabaret também os preenche de alguma forma”, diz a drag queen Warralla Blackberry, 26, outra fundadora do Acuenda.   

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Warralla é vivida pelo produtor cultural David Costa. Natural de Natal, capital do Rio Grande do Norte, Costa ressalta que foi no Jardim Romano que Warralla nasceu. “Começo a me montar de drag aqui em São Paulo quando faço parte do Acuenda. Até então, era drag só de carnaval. Agora o carnaval é o ano inteiro”, afirma. 

Cada uma delas leva de duas a três horas para se montar, mas explicam que a preparação para as apresentações exige mais tempo. “Somos um grupo periférico, então acabamos fazendo de tudo um pouco. A gente fica muito eufórica e ansiosa, porque queremos apresentar o melhor para o público”, diz Dhiana. 

O nervosismo, contudo, é recompensado. “No final, a gente fica muito agradecida com tudo o que acontece, porque a gente sabe o quanto é difícil ser uma pessoa LGBT no Brasil. A gente tem que comemorar porque é um dia a mais que a gente venceu”, completa Dhiana. 

O Arraiá das Drags teve duas edições online por conta da pandemia de Covid-19
Foto: Divulgação

O coletivo se mantém por meio de editais públicos e parcerias com empresas. Para Dhiana, os investimentos são os principais obstáculos enfrentados. "O maior desafio é a questão do dinheiro. Não ter recurso financeiro para que a gente possa desenvolver o nosso trabalho com qualidade, porque ser drag hoje é muito caro”, lamenta.  

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O Acuenda já promoveu cursos de drags, mostras, peças e concursos. Em fevereiro deste ano, lançou o Mapa Drag, com o objetivo de mapear e catalogar artistas drag queens/kings e atores transformistas. A ideia é aproximar empresas e pessoas físicas interessadas nos serviços oferecidos pelos artistas catalogados. Anualmente, as drags também organizam o Arraiá das Drags no bairro, em junho. 

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