Moradores de quatro comunidades da zona leste de Porto Alegre escaparam da inundação, mas sofrem com a falta de água e preços altos. Mulheres negras são mais atingidas e o Galpão da Cultura se mobiliza no Morro da Cruz para o socorro às vítimas.
Por estarem localizadas em regiões altas, nos morros, pelo menos quatro comunidades periféricas da zona leste de Porto Alegre escaparam da inundação. No vocabulário local, são vilas, com maioria de população trabalhadora.
Diferente das áreas alagadas, nos morros da Cruz, do Tuca, Bom Jesus e Lomba do Pinheiro o povão faz o corre e se articula para prestar ajuda e iniciar as reconstruções, especialmente de telhados.
Apesar de ainda contarem com energia elétrica e internet, casas estão destelhadas, há perigo de desabamento, falta combustível, alimentação e, sobretudo, água.
“Não tem água. Quando tem, o preço é altíssimo. Estão ganhando dinheiro com a desgraça dos outros”, reclama, indignada, a ativista Cris Medeiros, 53 anos, cria da Bonja, com é chamado carinhosamente o bairro Bom Jesus.
“Estamos sem água há 48 horas, é uma demanda urgente”, afirma no começo da noite de 6 de maio.
Mulheres negras são mais atingidas
Oficialmente, a região do bairro Bom Jesus tem 30 mil habitantes, uma das maiores comunidades de Porto Alegre. Embora abrigue moradores de classe média alta, a maioria é gente pobre, com alto índice de informalidade.
Concentram-se em três vilas: Nossa Senhora de Fátima, Pinto e Mato Sampaio. “É muito importante citar que a maioria das vítimas das chuvas do Bom Jesus é de mulheres negras à frente de suas famílias”, diz a ativista Cris Medeiros.
Ela preside uma das organizações que articulam o socorro às vítimas, o Centro de Educação Ambiental (CEA), com 28 anos de existência. “Embora essas regiões de periferia não tenham sido afetadas diretamente, foram afetadas indiretamente. O pessoal está sem conseguir trabalhar, por exemplo”.
Ela se preocupa especialmente com as catadoras de materiais recicláveis, com quem atua.
Galpão se mobiliza no Morro da Cruz
“Aqui não alagou, mas muitas famílias bem pobres vivem ao redor de uma nascente que passa pelo Morro da Cruz inteiro. Então corre o risco de deslizamento. E quebraram muitas telhas. Por mais que não sofra os danos do alagamento, sofreu os danos da chuva”, resume a cria do Morro da Cruz, Negra Jaque, de 36 anos.
Ela atua no primeiro centro cultural da área, o Galpão Cultural - Casa de Hip Hop em Poa, mais uma que está mobilizada no sorro às vítimas. Segundo a ativista, “Morro da Cruz é uma das comunidades mais articuladas. Tem coletivos, cozinha para preparar alimentos. Somos uma ferramenta de ajuda e dissemina informação”.
O Galpão da Cultura virou ponto de coleta e entrega de doações. “Não fechou, não vai fechar”. E nem poderia: sem aulas, cerca de cem crianças estão sendo atendidas com lanches e atividades lúdicas. “É uma forma de tirar um pouco do pensamento da própria tragédia. Se para a gente, que é adulto, é difícil, imagina para as crianças”, diz Negra Jaque.