Projeto Arte, Horta & Cia, na região de Jacarepaguá, no Rio de Janeiro, oferece curso de agricultura urbana e agroecologia. Com duração média de quatro meses, e aulas práticas e teóricas, beneficiou cerca de três mil participantes, entre pacientes e moradores da região. O terreno onde funciona a horta abrigou instalação de internação masculina manicomial e, após reforma psiquiátrica, passou a ser usado como depósito de construção civil.
Num terreno que fazia parte de antiga colônia psiquiátrica na Taquara, área de população pobre no Rio de Janeiro, mato e entulho estão dando lugar a pés de alface e outras hortaliças.
São os frutos do projeto Arte, Horta & Cia, do Instituto Municipal de Assistência à Saúde Juliano Moreira, onde viveu o grande artista plástico Arthur Bispo do Rosário.
Integrado ao Museu Bispo do Rosário, o projeto é a primeira iniciativa dentro da Rede Carioca de Agricultura Urbana (Rede CAU) a receber o Certificado de Conformidade Orgânica da Associação de Agricultores Biológicos do Estado do Rio de Janeiro (ABIO).
A avaliação leva em conta a produção orgânica e a qualidade do serviço prestado, conforme a legislação vigente dos princípios agroecológicos. A horta é tocada por usuários dos centros de atenção psicossocial e moradores do entorno, como o casal Valéria e Vanderley.
Horta ajudou a recuperar marido de Valéria
O projeto pôde proporcionar a recuperação da independência e do desenvolvimento do marido da Valéria Serqueira. Moradora da região há 60 anos, ela começou a perceber uma movimentação na localidade em meados de 2022, e ficou interessada.
Decidida a levar seu esposo ao projeto, logo percebeu o quanto ele foi acolhido e evoluiu. Vanderley de Oliveira sofreu um Acidente Vascular Cerebral (AVC) em 2018 e, desde então, teve que lidar com sequelas.
A interação e a prática com o cultivo foram suficientes para o progresso dele. Valéria acompanhou de perto cada avanço e resolveu participar também.
“Meu marido é outra pessoa. Vendo como ele está hoje, você não acreditaria em como estava antes. O pessoal do projeto não só faz plantações, vasos ou ornamentações, faz a gente se lembrar que está vivo”, diz Valéria.
Dona Eliana e a plantação de almeirão
Cercada por lembranças de seus pais e de sua infância sempre que está na horta, Eliana Dias mora na região há 53 anos e chegou ao projeto convidada por uma vizinha.
Ela mantinha o hábito de cuidar de um jardim caseiro e se viu encantada com as plantações. Escolheu participar e, desde então, a cada aula é um novo aprendizado. Ela ficou particularmente impressionada com a plantação de almeirão.
“Aprendi a exercitar a paciência, esse é o grande ganho. Nos voltarmos para nós mesmos e reconhecermos o nosso papel nesse mundo. Respeitar a terra e suas nuances e, além disso, respeitar o próximo”, diz Eliana.
Um diferencial na horta é a utilização de tecnologias sociais como a compostagem, sistema de biodigestores e um jardim filtrante para facilitar melhores condições de cultivo e o aumento da produtividade.
Lugar de afeto onde havia dor e exclusão
Parte dos alimentos plantados é utilizada posteriormente no restaurante Bistrô do Bispo, no Museu Bispo do Rosário, no qual um cardápio é pensado e preparado para servir comidas brasileiras e naturais.
A colheita também é compartilhada entre os integrantes do projeto e a comunidade da região, procedimento decidido todo mês numa assembleia.
“Temos sustentado o desejo da horta de ser reconhecida como uma referência em agroecologia e saúde mental, além de geração de trabalho e renda dentro da perspectiva da economia solidária”, explica a diretora Luciana Cerqueira.
O projeto pretende expandir a participação da comunidade, bem como ampliar o plantio e a inserção de mais tecnologias sociais no espaço, como captação da água da chuva, participação em feiras e aproximação de parceiros para troca de conhecimentos.