Não dá para começar esse artigo de opinião, sem dizer que a carne exerce um papel central na casa das famílias brasileiras, sobretudo nas populações periféricas, como é o nosso caso.
A carne carrega em si um status muito poderoso, podemos afirmar que é um símbolo de fartura, ascensão social e dignidade.
Em casa, se a nossa mãe abrisse o congelador e visse que não tinha carne, ou salsicha que seja, ela mencionava que a gente estava sem comida em casa, que precisava ir ao mercado ou açougue. Crescemos com essa ideia de que ‘’congelador vazio é sinônimo de fome’’.
Porém, após sermos atravessados por muita informação de qualidade, aprendemos um pouco o significado de cada coisa, e essencialmente o quão enraizado está em nós a cultura da carne. Não fazíamos ideia de todos os problemas que estavam por trás de um pedaço de carne, ou um copo de leite, apenas não concordávamos com todo o sofrimento animal envolvido na produção.
Dessa maneira, descobrimos também que comer carne não é natural, nem normal, para nós humanos e, sim, algo completamente cultural.
Falar sobre consumo de carne, fome e hábitos num país onde mais da metade da população não têm a possibilidade de escolher o que comer, e também são excluídas do acesso à informação de qualidade, por conta da sua situação socioeconômica, é extremamente delicado e precisa ser debatido no âmbito político.
Acreditamos que as pessoas precisam ter acesso a todo tipo de produto e alimento, precisam ter acesso a pedaços sofisticados de animais (picanha), e, simultaneamente, ter informação para pensar o seu consumo. A escolha de parar de consumir deve vir da consciência e por meio da autonomia de cada um.
O que queremos dizer, é que, é muito difícil falar de consumo de carne para pessoas que foram bombardeadas a vida inteira com essa ideia, e nunca conseguiram acessar esse consumo. Por isso, não é simples sair dizendo que temos motivos para largar a carne e pronto.
É um paradoxo (aparente falta de nexo ou de lógica; contradição), a carne está destruindo a saúde das populações, destruindo o meio ambiente e contribui para o sofrimento sem precedentes de animais, e, por outro lado, populações pobres são bombardeadas com a ideia de consumir carne.
É necessário falar sobre o assunto, mas com muita responsabilidade. Aqui mostraremos alguns dados e informações relacionadas ao consumo de carne em diversos âmbitos.
Saúde da População
A carne vermelha concentra grande quantidade de ácidos graxos saturados, que contribui para o aumento do colesterol ruim no sangue, favorecendo assim o surgimento de doenças cardiovasculares. Segundo a OMS, doenças cardiovasculares estão entre as principais causas de morte no mundo. Além disso, o consumo de carne está relacionado com o desenvolvimento de diabete tipo 2.
Metanálises de 2021, indicam também que a carne pode contribuir para o desenvolvimento de cânceres, sobretudo carnes processadas (presunto, salame, mortadela, linguiça, salsicha).
Uma alimentação predominantemente vegetal é a melhor forma de ter uma saúde melhor e prevenir o desenvolvimento de doenças modernas.
Meio Ambiente
A questão ambiental afeta diretamente a população, principalmente a mais desfavorecida e vulnerável, além dos animais. Portanto, se atentar às crises climáticas é fundamental para o futuro da humanidade e de todos os outros seres vivos no planeta Terra.
O consumo de carne e derivados animais está diretamente relacionado com desastres ambientais, queimadas, destruição do solo, das águas, emissão de gás de potencial efeito estufa.
Animal (ética)
Já falamos aqui sobre a empatia do ser humano perante os outros animais, como cães e gatos, por exemplo, mas a produção de carne, leite, ovos e derivados, mesmo que consigam um dia chegar a redução dos danos ambientais e nos darem opções mais saudáveis (como carnes menos gordurosas entre outras), o sofrimento animal jamais deixará de existir. Até porque quanto mais o animal sofre, melhor é pro meio ambiente. A produção de origem animal não leva em consideração todo o sofrimento envolvido na sua prática, até porque colocar os animais como prioridade nunca foi o objetivo do negócio animal. O animal ali é uma ferramenta, um objeto, uma máquina insensível e submetidos às maiores atrocidades.
Fonte: DW Brasil, Walter Willet, nutricionista de Harvard, estudioso há 40 anos no assunto alimentação e saúde.