No último sábado (02), em Fazenda Grande do Retiro, periferia de Salvador, foi inaugurada pelo coletivo “A Pombagem”, a Casa do Museu Popular da Bahia, data de extrema importância para a história do povo baiano, momento em que se comemora os festejos de 2 de julho, dia da Independência da Bahia.
Idealizado por Fabricio Brito, Patric Adler e Uilton Oliveira, moradores do bairro, o coletivo A Pombagem nasce do desejo de movimentar a cena poética da cidade de Salvador, focando principalmente na periferia e foi dessa maneira que em 2009, os “pombos”, como são chamados os poetas do grupo, começaram a realizar saraus literários, rodas de conversas e os grandes espetáculos de teatro de rua.
“Éramos vistos como pombos sujos pela ala burguesa da cidade, justamente por ocuparmos as praças e expormos nossos livretos de poesia no chão das calçadas. Além de expor e vender nossos livretos, rodávamos o chapéu com teatro e poesia no centro e orla de Salvador, onde havia gente que se aproximava para conhecer o nosso trabalho, mas também havia quem criticasse, quer dizer, quem nos colocava nesse lugar de pombos sujos ou de artistas de segunda ou terceira categoria”, conta o poeta Fabricio Brito.
Como resposta a tal forma pejorativa a que eram vistos, os artistas de rua do grupo ressignificaram o termo “pombo sujo”, transformando-o em um projeto cultural que focava na periferia de Salvador.
A ideia da Casa do Museu Popular da Bahia, na periferia de Salvador, além de gerar satisfação nas demandas do coletivo, traz na sua importância o deslocamento necessário, realocando a periferia que até então era vista como coadjuvante e nesse momento passa a ser a principal protagonista das histórias de lutas e resistências.
“Os museus comunitários são criados pela própria Comunidade, daí a ideia de Museu Popular. Museu feito pelo povo e para o povo, portanto é uma oportunidade para mostrar o bairro de Fazenda Grande do Retiro como o território potente e que merece ser visto como uma referência não de violência, mas sim de excelência no campo da Cultura”, explica o Filósofo Fabricio.
A inauguração da casa começou com uma limpeza do espaço e realocação do material cênico do grupo A Pombagem para área externa do espaço. Em seguida, aconteceu o almoço comunitário, reunindo os integrantes do grupo e a comunidade, que puderam interagir no momento de troca.
Durante a inauguração também teve espaço para o sarau realizado pelo grupo com microfone aberto. Teve espaço também para a velha guarda da comunidade, que testemunhou de 1975 a 1985, as manifestações culturais e popular do bairro denominada de festa do lixo, período em que se discutiu as questões políticas de cunho social e ambiental.
A Casa do Museu Popular da Bahia servirá também como local de estudo e pesquisas, pois ao longo desses anos, o grupo reuniu histórias que fazem parte da construção do bairro de Fazenda Grande do Retiro, área vista como marginalizada, pela sociedade.
O Museu é a Rua
Com aproximadamente 20 artistas – o número pode aumentar conforme apresentação – o grupo que integra o projeto da Periferia Brasileira de Letras, tem como carro chefe seu espetáculo O Museu é a Rua, com objetivo de desmistificar o museu como um espaço físico.
Segundo Fabricio Brito, que também é Mestrando em Cultura e Sociedade pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), os integrantes do coletivo não se reconheciam nas artes que eram apresentadas dentro do museu. Eles entenderam que o verdadeiro museu era o grito que saía dos muros da parede do tecido urbano da cidade.
“A gente não se reconhecia nas memórias e nas obras de arte expostas ali dentro e nos incomodávamos muito com essa relação de contemplação de passividade do visitante com museu e ao contrário, nos reconhecíamos nas artes e cultura de rua como teatro popular, como grafite, as manifestações da cultura popular do maracatu, a capoeira e o samba de roda. São os espaços que a gente constrói, os nossos pertencimentos e as nossas representações, foi ali que a gente viu o verdadeiro museu”, explica Fabricio.
O espetáculo tem como sua inspiração a festa do 2 de julho, uma das datas mais importantes na história do povo baiano, que promove no espaço público uma espécie de “visita guiada”, e é nesse festejo que começa o trabalho de investigação do grupo A Pombagem, que ao iniciar o processo criativo de construção do espetáculo reivindica a rua como o museu, fazendo homenagens e críticas as obras presentes.
Sobre a participação na Periferia Brasileira de Letras, conhecida como uma rede de coletivos literários que trabalham de forma coletiva e colaborativa, visando a territorialização de políticas públicas e pesquisas em prol da literatura e da saúde nas periferias e favelas do Brasil, o poeta diz, “É muito importante participar da Periferia Brasileira de Letras porque essa rede possibilita que a gente interaja com coletivos de outras quebradas e troquemos experiências. A gente percebeu que muitas das nossas experiências são similares às experiências de outras quebradas e isso faz com que a gente não se sinta só”, finaliza Fabricio Brito, um dos idealizadores do coletivo A Pombagem.