Conhecido como discurso reivindicatório pela poesia, o rap tem predominância masculina, mas as mulheres vêm falando, cada vez mais, sobre racismo, gordofobia, LGBTfobia, misoginia, empoderamento, amor. É assim em Salvador, capital baiana, onde o coletivo Mulheres no Rap surgiu da necessidade de afirmação delas na cena.
Idealizado pela produtora cultural Leila Campelo, 39 anos, moradora de Tancredo Neves, periferia de Salvador, o coletivo é um projeto que surgiu da necessidade de contar a história das mulheres e sua importância no movimento.
Além de Leila, o coletivo conta com a participação de mais quatro mulheres na linha de frente: Manu das Rimas, coordenadora das redes sociais; Mina Nai e Tassila Franco, que fazem suporte nas atividades de comunicação e eventos; e Laísa Gabriela, assessora do Mulheres no Rap.
Contra o cenário machista e homofóbico
“Muito se fala dos pais do rap, como o jamaicano Kool Herc, um dos precursores. Mas quem fala da Cindy Campbell, sua irmã, que produziu o primeiro evento de hip-hop do mundo? Além disso, ela era dançarina e grafiteira”, lembra Leila Campelo.
Ela explica que o coletivo quer evidenciar a importância feminina no cenário do rap, dialogando com várias vertentes. “Nosso projeto é direcionado às mulheres cis e ao público LGBTQIA+, mas conversa com todes que estão na cena”, diz a idealizadora do coletivo.
Leila acrescenta que a predominância masculina gera a impressão de que mulheres são minoria, quando, na verdade, sua presença só cresce, abrindo espaço em um cenário que “ainda caminha de forma machista, misógina e homofóbica”.
Correrias pela sobrevivência
O coletivo Mulheres no Rap sobrevive das lutas diárias. Seus projetos são financiados por editais conquistados na caminhada de três anos. Isso possibilitou a construção do site e a compra de materiais para a gravação de documentários. Sem sede, o coletivo conta com parceiros como a Casa do Hip-Hop, gerenciada por DJ Branco, ilustre nome da cena cultural baiana.
A Bahia, apesar de ser um estado culturalmente rico, não gera visibilidade para alguns gêneros musicais. Ao abrir espaço para artistas, comunicadoras, bgirls, DJs e produtoras, a diversificação aumenta, ampliando a representatividade feminina na indústria da música.
Pensando no futuro, o coletivo está em processo de captação de recursos para a criação de um selo. Pretendem fomentar um trabalho por e para mulheridades.
Fazer acontecer na cena
A jornalista Laísa Gabriela, de 32 anos, é cria do bairro Engenho Velho de Brotas, periferia de Salvador. Para ela, integrar o Mulheres do Rap faz “entender que sou potência”.
“Esse coletivo me fortalece. A união entre as meninas faz entender minha potencialidade e que posso fazer isso por outras. É um trabalho de formiguinha, cujo objetivo é fazer com que essas mulheres entendam a própria força, que são capazes de fazer acontecer na cena do hip-hop”.
Mudar a forma de se ver
Manu das Rimas, de 24 anos, do bairro da Liberdade, periferia de Salvador, integra a equipe de comunicação do Mulheres no Rap. O projeto abriu muitas portas para ela, mudou seu mundo, que agora é “totalmente diferente”.
Manu diz que, a partir da atuação no coletivo, conseguiu entender seu valor, “a importância do trabalho, e o das outras mulheres.”
Isso leva a comunicadora a “ter inspirações”, porque “quando comecei eu não tinha tanta inspiração de mulheres negras, por não conhecer a história do hip-hop. No momento em que eu fiz os primeiros documentários, vi que existia a primeira mulher produtora da cena. Isso fez com que eu me sentisse mais importante”.
Manu das Rimas se sente amadurecendo pessoal e profissionalmente. Parte disso, é porque sabe que outras mulheres também estão. Afinal, é um sonho coletivo.