Grafiteiras se unem contra “atravessadores” da arte urbana em SP

Duas artistas produzem o trabalho de outras sete no extremo das zonas sul e leste fazendo “a grana girar entre a gente”

6 nov 2024 - 15h17
Resumo
Desconhecimento da burocracia, receio de formalização e recursos financeiros das produtoras explicam o contexto de exploração da arte urbana, que grafiteiras pretendem quebrar.
“Achamos que falta transparência, valores justos e priorizar artistas", diz grafiteira, e agora também produtora, Pankill.
“Achamos que falta transparência, valores justos e priorizar artistas", diz grafiteira, e agora também produtora, Pankill.
Foto: Clara Dias

Sete grafiteiras selecionadas para o Museu de Arte de Rua (MAR), da Prefeitura de São Paulo, estão sendo produzidas por outras duas artistas periféricas para quebrar o ciclo de exploração da arte urbana por “atravessadores”, empresas geridas por homens e mulheres que atuam no mercado de produção artístico-cultural em São Paulo.

“Depois de ter trabalhado com produtoras e agências e se decepcionarem, a galera cunhou esse termo, atravessadores”, explica Amanda Pankill, grafiteira, que, junto com Mimura Rodriguez, criou a Seiva Cultural.

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Pankill é da Penha, zona leste de São Paulo, e Mimura, nascida no Jabaquara, mora em Guarulhos. Elas estão atuando como produtoras de outras sete mulheres que pintam enormes painéis de grafite em regiões periféricas da capital, como Jardim São Luiz e São Matheus.

Grafiteira Cali Nassar no Conjunto Habitacional Campo Limpo C, Jardim São Luiz II, zona sul de São Paulo.
Foto: Miguel Salvatore

“A gente começou a se mobilizar e se produzir. Neste projeto, partimos da premissa de que a artista tem que ganhar o maior cachê”, diz Pankill, que concedeu entrevista ao Visão do Corre.

Ela explica o que está por trás da produção de grafites, revelando bastidores da arte urbana que precisam ser conhecidos e discutidos.

Qual a sensação de trabalhar com produtoras de arte urbana em São Paulo?

A gente se sente explorado, principalmente pelo mercado das grandes produtoras, agências, pessoal de publicidade e marketing. Talvez enxerguem os artistas como menos preparados e precarizam as relações de trabalho. Ganham muita grana em projetos nos quais, na verdade, o protagonismo deveria ser do artista, muitas vezes pela falta de entendimento dos próprios artistas.

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Pode narrar um caso?

Teve uma dessas grandes produtoras exigindo que a artista comprasse tinta do fornecedor dela e era o dobro do valor. Em outra ocasião, a gente estava fazendo um trabalho para uma das maiores marcas de roupa do mundo e não tinha uma barraca, uma sombra, o sol estava escaldante. Cortam gastos para aumentar o ganho da produtora, não respeitam o artista.

Pode citar valores?

De um projeto de quatrocentos mil, tivemos que brigar e bater o pé e as artistas não ganharam nem dez mil.

Serão oito painéis de grafite feitos nas periferias de São Paulo no projeto só de mulheres.
Foto: Miguel Salvatore

Isso acontece em editais públicos?

Nem todas, mas muitas produtoras enxergam os editais como uma mina de ouro, ganhando dinheiro fácil. Artistas não têm grana para começar projetos, eles recebem depois, então muitas vezes a gente fica refém dessas produtoras, que podem bancar as tintas, por exemplo.

Qual o perfil dos atravessadores?

Fui percebendo que a qualidade de vida dessas pessoas era muito melhor que a nossa. Geralmente são de origem privilegiada, tiveram o insight ou o conhecimento para abrir uma produtora de arte urbana. É muito discrepante o quanto cada um leva nessa brincadeira.

Quais as barreiras para artistas urbanos se produzirem?

Acho que tem muito a ver com autoestima, achar que não é capaz, ter medo, mas não é um bicho de sete cabeças. Essa relação de exploração sempre existiu no meio da arte, e aí a gente entendeu como funcionava com as produtoras, galerias também, mas menos.

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Fonte: Visão do Corre
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