O Congado é uma tradicional manifestação cultural e religiosa de origem africana e afro-brasileira, celebrada em várias regiões do Brasil, especialmente em Minas Gerais, Goiás e São Paulo. A festa mescla elementos do catolicismo e das religiões de matriz africana, homenageando santos católicos como Nossa Senhora do Rosário e São Benedito, e reverenciando figuras simbólicas da história afro-brasileira, como os reis do Congo.
Minas Gerais é repleta de cultura negra em qualquer canto dos seus 854 municípios. E as manifestações culturais mantém a originalidade e a tradição em suas festividades e comemorações, inclusive nas favelas de grandes cidades, e vilas pobres do interior.
A maior festa popular mineira é o congado, também conhecido como congo, congada ou reinado. É uma expressão folclórica e religiosa que envolve canto, dança, teatro, espiritualidade cristã e de origem africana. Embora seja realizada em diversos lugares no interior do país, ela tem muita força e representatividade em Minas Gerais.
Há registros de que a história do congado começou com a chegada de Chico Rei vindo da África na metade do século XVIII. Conta-se que ele organizou a primeira festa dos negros como forma de agradecer à Nossa Senhora do Rosário. O agradecimento teria sido por enriquecer depois de explorar uma mina abandonada. A partir daí, surgiram as irmandades e guardas de congos.
Congado nas periferias urbanas e rurais
Nas vilas e favelas de Belo Horizonte e região metropolitana há diversas irmandades que prosseguem a tradição do Congado. Entre elas está a Guarda de Congo São Benedito e Nossa Senhora do Rosário, ambas em Vera Cruz de Minas, periferia da cidade de Pedro Leopoldo, nos arredores da capital mineira.
O grupo foi formado em 1988 e tem 38 integrantes, sendo seis moradores do bairro Santo Antônio, também na periferia de Pedro Leopoldo; e os outros 32 da comunidade Vera Cruz de Minas.
Jardel Vinícius, 38, participa da guarda desde os nove anos e hoje é presidente e capitão. Teve o primeiro contato com o congado através do pai e da tia. “Tudo que aprendemos é repassado para os mais novos para que a festa continue”, explica. Em Vera Cruz, as festividades acontecem sempre no terceiro final de semana do mês de agosto.
Gerações que perpetuam a tradição
Dirceu Ferreira, 65 anos, nasceu na Irmandade Nossa Senhora do Rosário e dela participa desde os três anos de idade. Hoje é o capitão regente da agremiação com sede no centro de Justinópolis, distrito de Ribeirão das Neves, Região Metropolitana de Belo Horizonte.
Dirceu mora ali, no bairro Botafogo, rodeado de outras vilas. Ele conta que seus familiares foram os fundadores do quilombo em Justinópolis, criado dois anos após a Abolição da escravatura. Não existe tempo nem idade para pertencer aos grupos. “Tenho três filhas, dois netos de oito anos, uma neta de quatro anos e uma neta de dois anos: todos participam da irmandade do reinado”, enumera.
Datas festivas o ano inteiro
As datas dos festejos variam de acordo com a localidade. Em Justinópolis são três por ano. Em janeiro é a de São Sebastião; em maio, festa de São Benedito; no último domingo de outubro, grande comemoração de Nossa Senhora do Rosário. Mas existem outras comemorações, que tomam o ano todo.
Há festas em diversas comunidades em quase todos os domingos e o reinado é encerrado em novembro. Manter o colorido das vestimentas, a qualidade dos instrumentos e a fartura nas festas exige dedicação e apoio de muitos voluntários.
Grande parte da população se mobiliza. Em Vera Cruz, os vizinhos doam alimentos para o café e o almoço. Os próprios reinadeiros confeccionam as caixas e os elementos simbólicos.
Para participar, interesse e fé na tradição
Jardel Vinícius explica que, para fazer parte da irmandade, é preciso de apenas um critério: fé. A partir dela, a paz, a alegria, a união e o amor sustentam o verdadeiro significado da tradição.
Para Dirceu Ferreira, a representatividade vai muito além de religião. “São muitos aprendizados que passam por nós nas festas. O catolicismo está dentro do fundamento do reinado, mas lá há uma diversidade de segmentos”, diz.
A importância de valorizar e manter viva a ancestralidade é comum, pois “as crianças estão levando a sério os ensinamentos e os jovens são bem interessados em nossa tradição”, finaliza, com inegável orgulho.