No Brasil, grandes histórias permeiam a vida de muitos empreendedores, principalmente aqueles que passam por algumas dificuldades nas comunidades pobres, como questões financeiras, conflitos familiares, entre outros fatores. Entretanto, a determinação e a coragem são palavras que, de fato, transformam as vidas de muitas pessoas.
O exemplo disso são empreendedores de Salvador que mostram resiliência diante dos obstáculos do dia a dia, como Ilza Rejane Nunes dos Santos, de 51 anos, moradora do bairro de Pirajá. Para ela, empreender vale a pena, pois além de obter independência financeira, pode também ajudar na geração de empregos.
Ilza é dona da empresa “Ilza Nunes Estética & Saúde”, clínica de estética corporal e facial, a qual oferece atendimentos como massagem relaxante, ventosaterapia, drenagem linfática, detox corporal, limpeza de pele, entre outros. “Faço protocolo personalizado para cada cliente e ministro cursos livres na área da estética”, afirma.
A esteticista, que já tem a empresa há três anos, abriu uma filial ao lado de um grande shopping da capital baiana, no entanto antes desse crescimento como empreendedora passou por alguns problemas de saúde por causa das dificuldades no casamento, que gerou prejuízos como aumento de peso, depressão e ansiedade.
“Vim de um casamento repressor por 20 anos, e por isso tive depressão e obesidade. Como eu era mãe e dona de casa, eu só ouvia que eu era incapaz. Antes de me casar eu era uma pessoa livre, tinha uma mente completamente diferente, sempre estudei. Aos 23 anos abri meu próprio negócio, mas depois que eu me casei comecei a sentir repressão: eu não tinha meus pensamentos, não podia tomar decisões e nem podia fazer nada”, revela.
A história da baiana se transformou depois que ela teve coragem de se separar do marido e abrir a clínica de estética.
Ela explica que começou a empreender desde jovem, visto que começou a vender marmita, refeição industrial, por dez anos, depois saiu do interior, Simões Filhos, e foi morar na capital baiana.
“Após morar em Salvador, fiquei em casa por uns 4 anos sem trabalhar, sendo dona de casa e tomando conta dos filhos. Depois que comecei a sofrer no casamento, fiquei acima do peso. Com isso, comecei a fazer uma alimentação para cuidar do meu corpo; eu queria emagrecer. Consequentemente, algumas pessoas queriam que eu fizesse o mesmo com elas. Então surgiu a ideia da Marmita Fit, eu ia na casa das pessoas e organizava a geladeira com a marmita e também as vendias”, conta.
Como Ilza Rejane tinha conhecimentos de estética, por meio de cursos livres, as pessoas falavam para ela fazer as marmitas com as massagens. “Para aprimorar os atendimentos, fiz um curso de estética por três anos. Nesse intermédio, atendia em domicílio, logo em seguida abrir um ponto no bairro, o qual comecei atender os clientes”, diz.
A empreendedora ressalta que antes de concluir o curso e de ser dona da clínica, se separou do marido, todavia ele não se conformou. “Ele não se conformou, inclusive se chateou muito porque achava que eu não ia tomar uma decisão dessa. Contudo, não teve jeito, eu já estava com minha cabeça com os planos montados. Tenho muita fé em Deus e sempre acredito em mim. Passei um período desacreditada, porém não demorou muito para que ressurgisse das cinzas, eu vim com força total”, enfatiza e completa: “foi uma força interior que me fez virar o jogo. Emagreci 42 kg e assumi meus filhos. Como eu tenho metas e sei que sou capaz. Tudo isso foi muita luta. Sou perseverante”.
Depois que ela entrou no curso na área de estética e começou a trabalhar atendendo em domicílio, fez uma parceria com uma clínica de estética e posteriormente a comprou.
“Logo após fiz proposta para comprar a clínica e com um ano me tornei a dona. Mudei o nome para ‘Ilza Nunes Estética &Saúde’. Em agosto de 2022 abri uma filial no edifício ao lado de um dos maiores shoppings de Salvador”, fala com alegria.
A empreendedora diz que abrir o próprio negócio mostrou que ela tem um perfil de liderança e que tudo isso foi uma realização pessoal que trouxe benefícios, como independência financeira.
Ela, que faz mentoria e ajuda mulheres a empreender, faz questão de falar que ser empreendedora dá liberdade de escolhas e poder escolher os horários de trabalho. “Tenho total diferença de antes de ser empreendedora para agora, pois tenho liberdade de escolhas, definir os meus horários de trabalho e posso traçar metas para uma vida confortável e sem escassez”, conta.
A baiana diz que na comunidade de Pirajá oferece atendimentos com qualidade e os valores são conforme a realidade do bairro. “A nossa tabela de preço é de acordo com a realidade da nossa comunidade. Faço também sorteio de procedimento e dou como presente. Além disso, participo de ação social na nossa região. Portanto, entrego todos os serviços com excelência.”
A empreendedora, que tem um sonho de expandir o negócio e possuir filiais pelo Brasil e uma vida financeira com estabilidade, manda uma mensagem para as pessoas que querem empreender, mas não têm coragem.
“Nunca desista dos seus sonhos. Por pior que seja seu caminho, sempre terá uma solução para tudo. O tempo vai passar e, se insistir, você pode conseguir. Se você não insistir, não vai conseguir e o tempo passará do mesmo jeito. Em outras palavras, seja você o seu maior incentivo e limite. Constância é a chave do negócio”, pontua.
BIOM 3D
Geralmente, o que leva muitas pessoas a criarem o próprio negócio são os obstáculos impostos pela vida, como conflitos familiares e a busca da independência financeira. Além disso, empreendedores que vieram de família pobre também transformaram as situações problemáticas em fatores motivacionais para a criação de uma empresa, como é caso dos irmãos Nilton Barbosa dos Santos, 30 anos, e Stéfanie Barbosa dos Santos, 25, donos da empresa de tecnologia, BIOM 3D.
Filhos de pai taxista e mãe dona de casa, eles criaram o próprio negócio, uma empresa que trabalha com a produção de biomodelos pré-cirúrgicos impressos em 3D.
Os jovens foram nascidos e criados na Baixa do Tubo, Vale do Matatu, bairro periférico da capital baiana e passaram por muitas circunstâncias na vida, mas conseguiram sobressair aos problemas com a união familiar.
Os pais dos jovens, o senhor Antônio Andrade e dona Dorisday Matos, foram fundamentais para que eles não passassem privações. “Passamos por muitas adversidades na infância. Meus pais lutaram muito para que a gente não passasse fome. Foi uma época bem complicada, porém graças a Deus estamos seguindo em frente”, afirma Nilton Santos.
Com muitas dificuldades, os irmãos concluíram o ensino superior. Estéfanie Santos formou-se em odontologia e o irmão em biomedicina. “Podia até faltar comida em nossa casa, mas estudo, não”, diz o jovem empreendedor.
Depois de formados, os irmãos foram trabalhar em lugares diferentes, ,mas quando começou a pandemia tudo mudou.
“No ápice da pandemia, o receio em voltar às clínicas me afastou cada vez mais da prática cotidiana, principalmente enquanto mãe solo de uma criança ainda muito pequena. Dentro desse período, Nilton me convidou a iniciarmos esse projeto, que certamente tomou proporções maiores do que esperava muito rapidamente. Hoje consigo empregar, de fato, todo o meu conhecimento dentro do que faço”, explica Estéfanie Santos, diretora operacional da BIOM 3D.
Ainda de acordo com a jovem, saber separar questões familiares dentro da empresa é importante para a empresa atingir os objetivos. “Tivemos a experiência familiar na infância, e uma boa orientação dos nossos pais. Dito isso, ficou mais fácil entendermos onde começa e termina nossa relação de sócios, e onde começa e termina nossa relação de irmãos”.
Toda essa relação saudável dos irmãos vem do respeito e amizade desde a infância, como pontua Stéfanie Santos. “Sempre tivemos uma relação de amizade, respeito e cumplicidade, que se fortaleceu ainda mais após a abertura da empresa. Mantemos o profissionalismo, porém envolto na leveza que já mantínhamos enquanto irmãos”.
Para a empreendedora criar o próprio negócio possibilitou garantir a segurança financeira da filha futuramente, além de uma vida estável e com flexibilidade de horário. “O negócio que criamos dá uma garantia de segurança financeira da minha filha futuramente, além de uma vida estável, confortável, segura e com flexibilidade de horário, no qual eu consiga ser boa mãe e profissional simultaneamente. Além disso, me sinto confortável no papel de liderança e criação de projetos”, garante.
Segundo a jovem, apesar da empresa possuir rotatividade de atendimentos em clínicas e hospitais, a maior demanda do negócio é semestral, de acordo com a necessidade dos cursos de saúde. Durante o início das aulas práticas, chegam a atender cerca de 150 clientes no período de uma semana.
Ela ressalta que a comunidade se beneficia com o empreendimento, já que os profissionais de saúde, ao testarem os procedimentos em modelos pré-cirúrgicos, passam a atender com maior confiança e previsibilidade, possibilitando ao paciente um tratamento mais seguro, menos invasivo e com melhor tempo de recuperação, aumentando sua qualidade de vida.
“Os alunos que passam a usufruir da tecnologia 3D, além de se inserirem melhor num mercado de trabalho competitivo, que já está imerso nessa nova realidade, também passam a treinar com materiais de melhor qualidade, maior semelhança à anatomia humana real, acesso a desvios anatômicos e patologias que, em modelos convencionais, não seria possível”, afirma Stéfanie Santos.
Além disso, conforme Nilton Santos, a BIOM 3D desenvolve projetos sociais, como a impressão de pré-cirúrgicos nas faculdades para pacientes de baixa renda a preço de custo ou, em alguns casos, gratuitamente, garantindo um atendimento de excelência àqueles que não possuem acesso a esse atendimento de alto padrão.
Nilton Santos destaca que a princípio a empresa estava focada em atender a demanda profissional, no qual, por exemplo, quando há um procedimento cirúrgico complexo a ser feito, os profissionais enviam os exames de imagem do paciente para a BIOM 3D, com as orientações de quais estruturas anatômicas estarão envolvidas, com isso é isolado e impresso 3D as estruturas para que eles possam planejar e até mesmo treinar o procedimento cirúrgico na peça impressa antes de fazê-lo no paciente.
“Apesar de continuarmos prestando esse serviço, vimos que nem todos os profissionais da área estavam familiarizados com a tecnologia, e identificamos que a raiz desse problema estava na falta de orientação durante o período de formação acadêmica deles. Visto isso, direcionamos boa parte da nossa atenção a esse público, possibilitando o acesso a impressão 3D desde a faculdade e, para eles, com preços ajustados de acordo com a condição financeira do aluno”, afirma Nilton Santos, Diretor Executivo (CEO)
da BIOM 3D.
Ele ainda explica que a empresa tem parceria com várias faculdades e pós-graduações de Salvador, Lauro de Freitas e Feira de Santana, que utilizam as peças desenvolvidas juntamente com especialistas de cada área, nas aulas práticas de diversas matérias, evitando assim a necessidade da utilização de dentes de cadáver ou mandíbulas de porco, por exemplo.
No momento, estamos à procura de uma parceria para desenvolvermos um novo projeto social no qual faremos, gratuitamente, a impressão de exames de Ultrassonografia 3D para gestantes cegas de baixa renda”, revela.
Os irmãos afirmam que mesmo com as dificuldades, o risco de empreender é válido. “As dificuldades, principalmente de início, superam em muito os benefícios. A incerteza, as apostas altas, o tempo dedicado, todo o novo conhecimento necessário, abrir mão de muitas coisas para construir a própria empresa são riscos inerentes a essa decisão. Porém, a longo prazo, resta a certeza de que você está construindo para você, para os seus, e dando a oportunidade de outras caminharem juntas ao seu propósito. Essa é a grande diferença: o propósito”, pontua Stéfanie Santos.
E mesmo com as incertezas, a empresa tem um sonho de criar modelos que ajudem desenvolver as técnicas de procedimentos cirúrgico. “Objetivamos criar modelos que auxiliem no desenvolvimento e aperfeiçoamento de técnicas de procedimentos cirúrgicos, tornando-os cada vez menos invasivos e lesivos”, finaliza Nilton Santos.
A empresa BIOM 3D tem um ano e meio de existência com Estéfanie Santos exercendo a função de contato com o público (discentes, docentes e profissionais), agenda da empresa, mídias sociais, administração e controle das despesas. Já o irmão, é o responsável pela modelagem 3D, planejamento de impressão e direção executiva.