Afinal, seu celular vai funcionar durante a Copa?
Após um desempenho distante do ideal na Copa das Confederações, o funcionamento de celulares durante a Copa do Mundo ainda é incerto em todo o País. E, apesar de uma série de medidas, a disponibilidade e estabilidade das telecomunicações sem fio ainda geram mais dúvidas do que certezas tanto dentro quanto fora dos estádios das 12 cidades-sede.
Entre os principais problemas está a sobrecarga do sistema 3G, a terceira geração da tecnologia de acesso à internet em smartphones e tablets, e o atraso em alguns dos estádios, o que deve deixar estruturas de rede incompletas. Além disso, há os gargalos acumulados do setor, que em 2012 sofreu sanções da Anatel pela má qualidade dos serviços.
Diante desse cenário, tanto os organizadores quanto as operadoras vêm destacando a utilização do 4G (quarta geração da tecnologia de internet móvel) como o grande diferencial do megaevento.
Mas especialistas ouvidos pela BBC Brasil apontam que poucas pessoas poderão, de fato, usufruir desta tecnologia tanto dentro quanto fora dos estádios - já que há poucos brasileiros com aparelhos habilitados e a maioria dos países usa um sistema diferente do adotado pelo Brasil no momento.
"O 4G é uma tecnologia que está crescendo, de fato, mas ainda é novidade. No Brasil ainda estamos em fase de consolidar totalmente o 3G, para se ter uma ideia. O 4G é algo que está em construção em todo o mundo, e só há três países onde a tecnologia está mais consolidada neste momento: Estados Unidos, Coreia do Sul e Japão", diz Eduardo Tude, engenheiro de telecomunicações e presidente da consultoria Teleco.
Ele explica que, como em toda nova tecnologia, tanto os aparelhos quanto o serviço ainda são caros - algo que deve mudar com o tempo.
Dados da Teleco compilados a partir dos informes regulares da Anatel mostram que em fevereiro de 2014 o 3G estava presente em 3.598 municípios brasileiros, atendendo 90,8% da população. Já o 4G é encontrado em apenas 105 cidades, o que corresponde a 37,2% dos brasileiros.
Outra questão é a banda de utilização do sinal. O Brasil optou pela frequência de 2,5 GHz, enquanto se faz a migração do sinal da TV analógica, que usa a banda de 700 MHz. Quando esse processo for completado, deve haver um leilão para que a nova frequência também seja explorada pelas operadoras.
Estados Unidos e Japão, por exemplo, dois dos países onde o 4G já se consolidou, usam a banda de 700 MHz, o que significa que, na verdade, os celulares dos turistas americanos e japoneses acabarão usando o 3G, assim como a esmagadora maioria dos brasileiros.
Atrasos e reforços
Cientes disso, organizadores e operadoras correm contra o tempo para tentar minimizar as chances de problemas com a sobrecarga da rede 3G.
Uma das estratégias é a instalação de redes "indoor", com um reforço do número de antenas dentro dos estádios.
Carlos Duprat, diretor do SindiTelebrasil, que representa as cinco maiores operadoras de telefonia celular do País responsáveis pela construção das redes para a Copa, diz que em algumas arenas a expectativa é melhor do que em outras.
"Trata-se de um projeto de altíssimo nível. Cinco empresas (Oi, TIM, Claro, Vivo e Nextel) construindo uma rede conjunta. Agora em alguns lugares estamos tendo mais dificuldades", diz.
Ele diz que a situação é melhor nas seis cidades que sediaram a Copa das Confederações (Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília, Fortaleza, Recife e Salvador), mas que é muito preocupante em Curitiba e São Paulo - onde os estádios sofreram maiores atrasos.
Cuiabá, Manaus, Natal e Porto Alegre também terão a mesma estratégia de rede, mas os atrasos não são tão cruciais.
"Precisávamos de ao menos 120 dias para construir e testar as redes indoor. Em alguns casos, tivemos menos de 70. É algo de alta tecnologia, não se pode fazer enquanto ainda há obras em andamento", explica.
Além da rede indoor, a maioria dos estádios deve contar com reforços de 3G e um sistema Wi-Fi (internet sem fio), que também ajudará a dar conta da demanda.
Eduardo Tude diz que, apesar dos problemas, a expectativa é de que, de maneira geral, os celulares funcionem dentro dos estádios de maneira semelhante à que funcionaram nas Olimpíadas de Londres.
"Em Londres era possível mandar mensagens, atualizar redes sociais, entrar na internet, mas a rede não tinha capacidade para streaming de vídeo, para assistir vídeos online" diz.
'Congestionamentos' nas cidades
Para aumentar a capacidade da rede 3G será preciso levar ao entorno dos estádios uma série de caminhões com antenas extras e o mesmo deve ocorrer em outros pontos da cidade, buscando evitar quedas de sinal devido a "congestionamentos" com a maior utilização das redes.
"A ideia é reforçar a rede 3G em torno dos estádios, aeroportos, fan fests (eventos da Fifa para torcedores), locais de muita concentração, como já se faz no Ano Novo em Copacabana, por exemplo", explica Duprat, acrescentando que os aeroportos devem apresentar problemas já que devido ao excesso de burocracia tem sido difícil obter a liberação para instalar antenas.
Para João Moura, presidente da TelComp (Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitiva), que reúne 50 empresas do setor, apesar dos reforços pode haver problemas, sobretudo nas maiores cidades como Rio e São Paulo.
"O serviço já tem deficiências, e elas não vão ser eliminadas justamente durante a festa. As operadoras estão se esforçando para aumentar a oferta, inclusive com equipamentos provisórios para isso. Não é a melhor situação, todos reconhecemos isso", explica.
Moura diz que, na maioria dos casos, não houve tempo para testes e que o setor de telecomunicações demanda tempo e muito trabalho, mas que não se trata de uma exceção.
Ele acredita que, no final das contas, haverá imprevistos e improvisos, e que as soluções temporárias para ajudar a dar conta da demanda devem funcionar - apesar dos problemas.
"Não será um privilégio da área de telecomunicações. Certamente outros setores como transporte público, mobilidade urbana, enfrentarão grandes desafios. Não estamos fora da curva", diz.
Todos os 12 estádios que sediarão jogos da Copa contarão com a rede indoor construída pelas cinco maiores operadoras de telefonia móvel do País, mas alguns têm nível de preocupação maior por estarem mais atrasados - caso do Itaquerão e da Arena da Baixada.
Os que já foram usados na Copa das Confederações são os de menor risco, e há os que tiveram atraso médio, ou não terão Wi-Fi para o público, como a Arena Pantanal, em Cuiabá - o que aumenta a preocupação já que os torcedores não poderão contar com esse recurso numa eventual sobrecarga do sistema 3G.