X 'decidiu cumprir todas as determinações judiciais' no Brasil, afirma advogado nomeado pela empresa
Na quarta-feira (18/9), a empresa de Elon Musk enviou uma petição ao STF apontando dois advogados como seus representantes processuais, André Zonaro Giacchetta e Sérgio Rosenthal.
Após longa disputa com o Supremo Tribunal Federal (STF), o X decidiu cumprir todas as decisões da Corte, segundo o novo advogado apontado para representar a empresa processualmente.
"A empresa decidiu cumprir com todas as determinações judiciais", disse à BBC News Brasil o criminalista Sérgio Rosenthal.
"Isso será esclarecido, ainda, ao ministro. E, inicialmente, o importante é regularizar a situação da empresa no Brasil", acrescentou.
"Para isso, nós informamos ontem, por meio de uma petição ao ministro Alexandre de Moraes, que será indicado muito em breve um representante legal para a empresa no Brasil, para que ela possa regularizar sua situação", acrescentou.
Na quarta-feira (18/9), a empresa enviou uma petição ao STF apontando dois advogados como seus representantes processuais, André Zonaro Giacchetta e Sérgio Rosenthal.
No entanto, como não foi apontada na petição qual a representação legal da empresa, Moraes considerou que não há regularidade na constituição dos dois advogados.
O ministro deu, então, nesta quinta-feira (19/9), prazo de 24 horas para que os dois advogados comprovem "a regularidade e validade da representação legal da empresa X BRASIL INTERNET LTDA".
A decisão determina que seja apresentada "comprovação documental da respectiva Junta Comercial da regular constituição da empresa, com indicação de seu representante, com amplos poderes, inclusive de nomeação de advogados".
Segundo Rosenthal, os advogados estão atuando para atender à determinação.
"Nós vamos tentar fazer isso no prazo concedido por ele. Se não for possível, nós vamos fazer no prazo que isso seja possível", disse à reportagem.
Rosenthal enfatizou que ele e André Zonaro Giacchetta atuarão apenas como advogados e que trativas estão em andamento para determinar o novo representante legal da empresa.
O acesso à rede social no Brasil foi bloqueado após a empresa desrespeitar ordens judiciais do STF, entre elas a indicação de um representante legal e a suspensão dos perfis de bolsonaristas que estariam disseminando, segundo Moraes, discursos extremistas e antidemocráticos.
No entanto, o X voltou a funcionar no Brasil na quarta-feira com o que especialistas classificaram como uma manobra para contornar este bloqueio, o que a empresa nega.
Moraes e Anatel dizem que X contornou bloqueio intencionalmente
A decisão que impõe a multa milionária ao X foi tomada na quarta-feira (18/9) e tem validade a partir de quinta (19/9).
Moraes estabeleceu também que a multa poderá ser cobrada da Starlink, outra empresa de Musk que mantém atuação no Brasil, porque o X não tem mais escritório no país.
O ministro determinou, ainda, que a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) tome providências imediatas para reestabelecer o bloqueio da rede social e informe ao STF em 24 horas quais foram as medidas tomadas.
No dia anterior (18/9), a agência informou ao Supremo que, segundo informações preliminares, "uma atualização do aplicativo X, ocorrida na noite de ontem para hoje, comprometeu a efetividade do bloqueio previamente implementado pelas operadoras".
Para Moraes, uma postagem de Musk em sua rede social comprovaria que o descumprimento do bloqueio foi proposital.
O bilionário escreveu na quarta-feira (18/9), em mensagem original em inglês: "Qualquer magia suficientemente avançada é indistinguível da tecnologia".
"A DOLOSA, ILÍCITA E PERSISTENTE RECALCITRÂNCIA da plataforma X no cumprimento de ordens judiciais foi confessada diretamente por seu maior acionista, ELON MUSK, em publicação no próprio X dirigida a todo território nacional, conforme divulgado pela imprensa", escreveu Moraes em sua decisão.
A Anatel se manifestou no mesmo sentido. A agência afirmou que a conduta do X demonstrou uma "intenção deliberada de descumprir a ordem do STF".
Especialistas ouvidos pela BBC News Brasil explicaram que o retorno da rede só foi possível graças a uma mudança técnica que teria "driblado" os bloqueios impostos pelos provedores de telefonia e internet do Brasil.
Segundo eles, o X passou a hospedar o seu conteúdo em uma rede conhecida como Cloudflare, uma das mais abrangentes do mundo. Ao fazer isso, o bloqueio anteriormente feito pelas operadoras brasileiras passou a não surtir mais efeito.
Em nota, a Anatel disse que com o apoio das operadoras de telecomunicações e da Cloudfare identificou uma forma de garantir que a decisão do STF de bloquear o acesso à rede social voltasse a ser cumprida.
"Eventuais novas tentativas de burla ao bloqueio merecerão da Agência as providências cabíveis", disse a Anatel.
A agência refutou assim a declaração do X de que a volta da rede social teria sido "inadvertida e temporária".
Em nota divulgada após o restabelecimento do acesso vir a público, o X afirmou que uma mudança no servidor usado para hospedar a rede social teria levado ao restabelecimento do acesso.
"Quando o X foi suspenso no Brasil, nossa infraestrutura para fornecer serviço para a América Latina não ficou mais acessível à nossa equipe. Para continuar fornecendo um serviço de excelência para nossos usuários, mudamos de servidor. Essa mudança resultou em uma restauração inadvertida e temporária do serviço para usuários brasileiros", disse a empresa.
"Embora esperemos que a plataforma fique inacessível novamente no Brasil em breve, continuamos os esforços para trabalhar com o governo brasileiro para retornar muito em breve à população do Brasil".
Bloqueio de perfis no Brasil
Também nesta quinta-feira, algumas das contas que eram alvo de uma ordem de bloqueio pelo STF passaram a aparecer como suspensas na rede social.
Entre elas, estão os perfis do blogueiro bolsonarista Allan dos Santos, atualmente foragido nos Estados Unidos, de Paulo Figueiredo, ex-apresentador da Jovem Pan e investigado no inquérito que apura uma possível tentativa de golpe de Estado no Brasil, e do youtuber Monark.
Quem tenta acessar essas contas a partir do Brasil é informado que o bloqueio foi realizado "em resposta a uma ordem judicial".
O bloqueio a determinados perfis foi uma das determinações judiciais descumpridas pela rede social que levou ao seu bloqueio no país por determinação de Moraes.
A rede social X foi tirada do ar em 30 de agosto, dois dias após Moraes intimar Elon Musk a indicar um representante legal no Brasil no prazo de 24 horas.
A empresa havia fechado seu escritório no país em reação à determinação de Moraes de bloquear as contas de sete perfis de bolsonaristas.
Em seu perfil no X, Elon Musk se manifestou horas depois atribuindo o fechamento do escritório brasileiro a "exigências de censura" de Moraes.
"A decisão de fechar o escritório X no Brasil foi difícil, mas, se tivéssemos concordado com as exigências de censura secreta (ilegal) e entrega de informações privadas de @alexandre, não haveria como explicar nossas ações sem ficarmos envergonhados."
O perfil oficial do X dedicado às relações governamentais publicou uma nota confirmando o fim da operação no Brasil e divulgando um despacho sigiloso de Moraes destinado à empresa.
De acordo com a nota, o ministro teria ameaçado o representante legal com prisão na noite de sexta-feira caso a rede social não cumprisse as ordens. "Ele fez isso em uma ordem secreta, que compartilhamos aqui para expor suas ações", diz a nota.
Na decisão que levou à suspensão da rede social, Moraes argumentou que Musk e o X estariam incentivando, com sua postura, discursos extremistas e antidemocráticos.
Além disso, estariam obstruindo a Justiça ao não seguir determinações judiciais como bloqueio de contas e ao deixar de apontar um representante legal no país.
O ministro do STF determinou que a Anatel tomasse as providências para o bloqueio da rede.
Logo após a decisão, Musk disse que "a liberdade de expressão é a base da democracia e um pseudo-juiz não eleito no Brasil está destruindo-a para fins políticos".
Musk X Moraes
A tensão entre o bilionário e o ministro vem se escalando nos últimos meses.
No início de abril, um compilado de trocas de e-mails de funcionários do Twitter a respeito de decisões judiciais brasileiras que envolveram a rede social entre 2020 e 2022.
Os documentos, revelados pelo jornalista americano Michael Shellenberguer, ficaram conhecidos como Twitter Files Brazil.
Na época, Musk iniciou uma ofensiva pública a Moraes, acusando-o de censura e ameaçando descumprir ordens judiciais.
Moraes incluiu então Musk no inquérito das milícias digitais, e também abriu um novo inquérito para apurar se o empresário cometeu crimes de obstrução à Justiça, organização criminosa e incitação ao crime.
"As redes sociais não são terra sem lei; não são terra de ninguém", destacou Moraes na decisão, tomada após o dono do X fazer postagens na rede social que, segundo Moraes, são uma "campanha de desinformação" que instiga "desobediência e obstrução à Justiça".
Além disso, estabeleceu uma multa diária de R$ 100 mil para cada perfil da rede social que venha a ser desbloqueado, em descumprimento de decisão do STF ou do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Na ocasião, Musk chamou Moraes de "ditador brutal" e disse que o ministro tem o presidente Lula "na coleira".
Diversos perfis já foram suspensos ou tiveram sua suspensão decretada desde 2019, quando foi instaurado o inquérito das fake news.
Aberto para investigar ataques e notícias falsas envolvendo membros da corte, a investigação está sob relatoria de Moraes desde 2020, quando tomou posse como ministro do Supremo.
Entre os alvos dessas investigações estão o ex-presidente Jair Bolsonaro e apoiadores.
Alguns dos bolsonaristas que já tiveram suas contas bloqueadas no antigo Twitter são a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), o ex-parlamentar Roberto Jefferson e o empresário Luciano Hang.
Durante sua presidência no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), entre agosto de 2022 e junho deste ano, Moraes também tomou decisões contra usuários de redes sociais com a justificativa de coibir a disseminação de notícias falsas.
As determinações de Moraes neste sentido suscitaram um complexo debate, dado que não há uma lei prevendo especificamente este tipo de medida cautelar.