Altruísmo pode explicar passos do processo evolutivo das espécies
Estudo conduzido com crianças e cães mostra capacidade de cooperação do homem com outras espécies
O modo como os seres humanos estabelecem relações de cuidado com animais domesticados tem sido objeto de estudo ao longo do tempo. Essa característica, fundamental para a sobrevivência das outras espécies, é única do Homo sapiens.
Mas como essa prática surgiu, entre diferentes civilizações e com tantas espécies de animais, é algo que ainda intriga os cientistas.
De acordo com artigo publicado pela Human-Animal Interactions, uma hipótese é que, como espécie, o homem é altamente capaz e motivado a se comportar de maneira útil e cuidadosa em relação a outras espécies, em função de fundamentos psicológicos que permitem que a cooperação entre humanos se estenda a outros animais.
Gentileza inata
Duas capacidades psicológicas são consideradas para permitir essa cooperação e ajuda em contextos de humano para humano. A primeira é a capacidade de deduzir os estados mentais dos outros, incluindo conhecimento, emoções, crenças, desejos e objetivos.
Já a outra diz respeito a uma motivação para se comportar pró-socialmente em relação aos outros e, especialmente, para ajudá-los a alcançar seus próprios objetivos.
O estudo, conduzido por pesquisadores dos Estados Unidos, buscou testar a hipótese de que as propensões iniciais dos seres humanos em desenvolvimento para ajudar outros humanos se estendem a animais não humanos, por meio de experimentos realizados entre crianças e cães.
Motivado a doar
O objeto da análise seria o quanto as crianças poderiam demonstrar a capacidade de leitura e motivação para fornecer objetos fora do alcance dos cães.
Para tanto, foram recrutadas 97 crianças de 1,7 a 3,1 anos de idade (51 mulheres, 46 homens) para participar de três interações, sendo que, do total, 44 delas tinham cães de estimação em casa.
Crianças com animais em casa ajudavam os cães com maior frequência. Elas também se mostraram mais altruístas para oferecer alimento no lugar do brinquedo.
Segundo os pesquisadores, não estava claro o que esperar das crianças ajudando cães. Porém, pesquisas anteriores com os pequenos colaborando com adultos (Warneken e Tomasello) já permitiram registrar ajuda significativa.
“Observamos crianças de 2 a 3 anos ajudando cães de estimação a adquirir guloseimas ou brinquedos que não podiam alcançar sozinhos. Especificamente, as crianças deram aos cães esses objetos fora de alcance mais frequentemente quando os cães lutavam para alcançar os objetos em comparação aos animais que não se inclinavam ao objeto. Essa distinção indica que as ações das crianças decorrem, em grande parte, do reconhecimento dos objetivos e desejos do cão”, diz o estudo.
Inclinações pró-sociais
As descobertas apoiam a hipótese de que as crianças empregam suas habilidades de leitura de objetivos e inclinações pró-sociais a serviço de cães, assim como de humanos, desde cedo na vida.
“Nossas descobertas se somam a um amplo corpo de literatura que enfatiza a motivação pró-social útil como uma característica fundamental na evolução humana [...]. As tendências de desenvolvimento precoce para ajudar outras espécies podem, em parte, estar por trás do desenvolvimento cultural de práticas que levaram à domesticação de inúmeras espécies em todo o planeta”, afirma o estudo.
Pesquisas futuras serão necessárias para examinar componentes psicológicos adicionais e melhor entender os efeitos da gentileza e da dedicação ao próximo na nossa permanência — e das demais espécies — na Terra.