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Brasileiro busca novas espécies em grãos de areia da praia - e já encontrou 140

Briozoários são seres invertebrados encontrados em ambientes aquáticos, desde poças rasas até regiões mais profundas. Biólogo Leandro Vieira tem seu zoo em miniatura dessas espécies, e várias moram exclusivamente em grãos de areia.

3 fev 2018 - 07h47
(atualizado às 10h34)
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Klugerella petasus, uma espécies de briozoário descrita para o Brasil. A foto tirada no Microscópio Eletrônico de Varredura mostra a complexidade do exoesqueleto dos briozoários
Klugerella petasus, uma espécies de briozoário descrita para o Brasil. A foto tirada no Microscópio Eletrônico de Varredura mostra a complexidade do exoesqueleto dos briozoários
Foto: BBC News Brasil

Para a maioria das pessoas, um grão de areia da praia é apenas um grão de areia do mar. Para os olhos treinados de um biólogo marinho, no entanto, cada um deles pode se revelar um habitat para várias espécies de animais.

A grande maioria delas é de briozoários, um grupo de seres aquáticos, invertebrados e sésseis (que vivem num substrato, como os corais). Mas também podem ser encontrados poliquetos (minhocas marinhas) e outros pequenos invertebrados, além de pequenos crustáceos e nematoides (vermes).

Desse verdadeiro zoológico em miniatura, o biólogo Leandro Vieira, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), escolheu os briozoários como seu objeto de estudo, aos quais se dedica desde que entrou no curso de Ciências Biológicas, na Universidade Federal de Alagoas (UFAL), em 2001. Antes do seu trabalho, poucos deles eram conhecidos no Brasil.

Nos últimos anos, ele já descobriu e descreveu cientificamente 140 novas espécies, das quais 18 que vivem exclusivamente em colônias em grãos de areia.

Vieira explica que elas são formadas por vários indivíduos, denominados zooides, com cerca de 0,5 mm de comprimento, cada um com uma estrutura de alimentação (lofóforo), responsável por capturar alimento em suspensão, e um exoesqueleto calcário ou quitinoso (feito de quitina, o que lhe confere rigidez). "Algumas vivem num simples grão de areia e têm até três indivíduos", diz. "Outras, no entanto, podem chegar a alguns centímetros, atingindo até o tamanho de uma bola de basquete."

Uma característica comum a todas as espécies é que as colônias são polimórficas, ou seja, formadas por zooides de morfologias distintas de acordo com suas funções. Entre eles, há o autozooide, que é unidade básica e alimentar do grupo. Os outros indivíduos podem apresentar funções diversas, incluindo reprodução (gonozooides), sustentação e formação da colônia (cenozooides)."

Esses invertebrados são encontrados em ambientes aquáticos marinhos, estuarinos (água salobra) ou água doce, desde o raso até regiões mais profundas. Por serem sésseis, dependem de um substrato para crescer, podendo viver em estruturas rígidas como rochas, pedras, algas, outros animais (como corais e crustáceos), ou até mesmo em diminutos grãos de areia.

Reptadeonella granulosa, uma espécie de briozoário descrita para o litoral Norte de São Paulo
Reptadeonella granulosa, uma espécie de briozoário descrita para o litoral Norte de São Paulo
Foto: BBC News Brasil

No caso desses últimos, sua existência foi relatada pela primeira vez em 1986, na Flórida, e redescoberta em São Paulo, durante Programa de Pesquisas em Caracterização, Conservação, Restauração e Uso Sustentável da Biodiversidade, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (BIOTA-Fapesp).

"Apesar de pouca conhecida, essa fauna é provavelmente comum, já tendo sido encontrada em vários locais do mundo, incluindo Japão e Austrália e no litoral brasileiro", diz Vieira.

Na Flórida, nos Estados Unidos, por exemplo, onde os estudos sobre ela são mais antigos, descobriu-se que em apenas um metro quadrado de areia, com 10 centímetros de profundidade, podem viver até 7,5 mil colônias. No Brasil, esse número chega a 300, de pelo menos 20 tipos diferentes. No mundo todo, são conhecidas atualmente cerca 6 mil espécies de briozoários, com outros 15 mil fósseis já descritos. No país, há perto de 450, das quais um terço foi descoberto nos últimos dez anos.

Amathia evelinae - espécie descrita em 2014, no litoral Norte de São Paulo
Amathia evelinae - espécie descrita em 2014, no litoral Norte de São Paulo
Foto: BBC News Brasil

De acordo com Vieira, para que esses animais ocupem esse tipo de habitat são necessárias condições especiais no ambiente marinho. Uma delas é que a profundidade do mar esteja entre 6 metros e 45 metros. Outra é que os grãos de areia tenham tamanho variado, com mais de 0,5 mm de diâmetro, formas irregulares e apresentem uma mistura de fragmentos de conchas de moluscos.

Além disso, deve existir uma grande quantidade de matéria orgânica na água, para fornecer alimento para os briozoários, e uma baixa taxa de sedimentação, impedindo o acúmulo de partículas muito fina na superfície do grupo (evitando a morte dos animais). "Todas essas condições em conjunto criam um espaço adequado para eles se alimentarem e para o crescimento da colônia, evitando também a morte das mais jovens", explica Vieira.

Segundo ele, um fato interessante é que, nesse ambiente, algumas espécies ocorrem exclusivamente em fragmentos de conchas, e outras somente nos pequenos grãos de quartzo (com tamanho entre 0,5 e 1 mm de diâmetro). "Outro fato curioso é que a grande maioria das colônias de grão de areia é transparente, em contraste com as bem coloridas que ocorrem em outros substratos, como corais e algas marinhas", diz Vieira.

Como esse ambiente é instável, devido à abrasão entre os grãos de areia e o microambiente criado pelas condições fisico-químicas da água, os briozoários desse habitat se reproduzem rapidamente, o que favorece a sua dispersão.

Exoesqueleto de Reptadeonella granulosa observado no Microscópio eletrônico de varredura, que é essencial para o estudo desses animais
Exoesqueleto de Reptadeonella granulosa observado no Microscópio eletrônico de varredura, que é essencial para o estudo desses animais
Foto: BBC News Brasil

Por serem geralmente abundantes, esses animais são componentes importantes dos ecossistemas aquáticos, sobretudo marinhos. "Como são dominantes em muitas comunidades bentônicas, eles têm grande importância ecológica, incluindo a colonização do substrato e formação de novos habitats para outros invertebrados, como, por exemplo, pequenos crustáceos e anelídeos", diz Vieira. "Briozoários também servem como alimento para outros invertebrados marinhos, como algumas lesmas-do-mar e aranhas-do-mar, consideradas seus principais predadores."

A maior parte das suas pesquisas Vieira fez durante o mestrado (2006-2008), o doutorado (2008-2012) e pós-doutorado (2013-2014), todos realizados no Centro de Biologia Marinha da USP. "As 18 novas espécies que vivem em grãos de areia foram descobertas no litoral norte de São Paulo por mim e pela pesquisadora americana Judith Winston, em 2013", conta. "Esses animais são um caso bem específico dentro do filo dos briozoários. Uma larva se prende ao grão de areia, formando assim uma colônia que fica sobre ele."

O trabalho do pesquisador continua. Nos últimos três anos, desde que ele ingressou na UFPE, em 2014, e criou Laboratório de Estudos de Bryozoa (LAEBry), várias espécies novas estão sendo descritas no Nordeste, principalmente como resultado do Programa de Pós-Graduação em Biologia Animal da universidade.

Além disso, a atuação do grupo que Vieira coordena já descobriu dezenas de novas espécies de briozoários que ainda precisam ser formalmente descritas. "Acredito que o número das que serão que serão descritas por pesquisadores brasileiros deve aumentar consideravelmente nos próximos anos", prevê.

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