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Cientistas lançam guia de serpentes da Mata Atlântica

Obra conta com informações sobre 142 espécies, espalhadas de sul a norte do País

7 ago 2019 - 08h40
(atualizado em 8/8/2019 às 12h24)
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"A cobra é um animal ingrato", define Otavio Marques, pesquisador do Instituto Butantã. Ele se refere não à peçonha, mas à dificuldade em encontrar as serpentes e fotografá-las. Nada que o tenha desanimado. Após anos de pesquisa atrás das rastejantes, Marques e outros dois cientistas lançam nesta quinta-feira, 8, um guia de serpentes da Mata Atlântica, material que serve tanto como referência para pesquisadores como almanaque para quem ainda nem aprendeu a ler.

Na foto, a espécie Dipsas sazimai. Foi recentemente descrita pelo pesquisadores Daniel Fernandes, Antonio Argolo e Otavio Marques e homenageia o outro autor do livro Ivan Sazima
Na foto, a espécie Dipsas sazimai. Foi recentemente descrita pelo pesquisadores Daniel Fernandes, Antonio Argolo e Otavio Marques e homenageia o outro autor do livro Ivan Sazima
Foto: João Luis Gasparini/ Divulgação / Estadão

"É um livro para preguiçosos", diz, bem-humorado, o biólogo e professor da Universidade Federal do ABC (UFABC) André Eterovic, outro autor. Fotos de cobras com ícones sobre os principais hábitos dos animais - como reprodução, veneno e alimentação - tornam a obra fácil de ler. Mas, se há preguiça no leitor, o mesmo não se pode dizer dos autores. Foram anos de pesquisas de campo - e até mordidas de serpente - para chegar à publicação.

O trabalho começou com a pesquisa de doutorado de Marques, na Estação Ecológica Jureia-Itatins, em São Paulo. Em 2001, o pesquisador publicou o "Serpentes da Mata Atlântica: guia ilustrado para a Serra do Mar", mas a obra estava restrita a uma área pequena do bioma. Agora, há imagens e informações sobre 142 espécies, espalhadas de sul a norte do País. Uma das fotos, da cobra-verde Philodryas laticeps, foi incluída aos 45 do segundo tempo.

Philodryas laticeps, espécie com distribuição restrita em pequena área no Espírito Santo
Philodryas laticeps, espécie com distribuição restrita em pequena área no Espírito Santo
Foto: Otavio Marques/ Divulgação / Estadão

"Só se conhecia espécimes mortos e um exemplar vivo foi coletado por um colega no Espírito Santo e enviado ao Butantã, no momento em que o guia estava sendo finalizado", conta Marques. Aliás, para cobrir território tão grande, colaborações entre cientistas foram frequentes. Segundo ele, 45% das espécies catalogadas são endêmicas (restritas ao uma região), o que torna a Mata Atlântica um dos biomas mais especiais para estudar esses bichos.

Uma das serpentes mais ameaçadas de extinção também aparece no livro: a jararaca-de-murici (Bothrops muriciensis) só dá as caras em uma pequena área de mata em Alagoas. Sem contato com outros exemplares, corre o risco de desaparecer. A fragmentação do bioma, dizem os autores, faz soar o alerta para a continuidade das espécies.

"Na Mata Atlântica, há uma quantidade grande de espécies (de serpentes) arborícolas. A cobra não depende só da sombra da floresta, mas da estrutura. Essa riqueza de espécies arborícolas sofre impacto com a destruição", diz Marques. Só 12% da floresta original está de pé.

Hoje, sabe-se que em algumas ilhas, onde a oferta de alimentos é baixa, as cobras são quase anãs. "Na Queimada Grande (a famosa Ilha das Cobras, no litoral de São Paulo), a jararaca-ilhoa passou a comer passarinho porque é uma ilha que não tem mais rato", exemplifica Marques. Para Eterovic, é possível que espécies que já figuraram em guias ilustrados nem existam mais.

Se o processo de mutação genética para a formação de novas espécies na natureza é lento, a extinção, por outro lado, pode ocorrer em um piscar de olhos. "Às vezes não é necessário nem matar o último exemplar. Há espécies que chamamos de 'zumbis', um número tão pequeno de exemplares que nem se encontram para a reprodução", diz Eterovic.

Para os pesquisadores, além de um guia para acadêmicos, a obra ajuda na disseminação do gosto pela Biologia entre quem ainda nem sabe o que isso significa. Eles têm relatos de crianças que cresceram com a primeira versão do livro e se tornaram herpetólogos. "As cobras causam repulsa e nojo. Levando o conhecimento de forma leve, queremos quebrar essa barreira. Se isso acontecer com as cobras, as pessoas podem passar a ter respeito com toda a biodiversidade", diz Marques.

Serviço

Serpentes da Mata Atlântica: guia ilustrado para as florestas costeiras do Brasil

Autores: Otávio Marques, André Eterovic e Ivan Sazima

Editora Ponto A, com apoio da Fapesp. 320 páginas

Lançamento: 8/8 (quinta-feira), no Instituto Butantan, a partir das 19 horas.

Estadão
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