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Como os limites podem estimular a criatividade

Tendemos a pensar em criatividade e liberdade como duas coisas que caminham sempre juntas - mas nem sempre é o caso.

18 jun 2022 - 16h49
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Ilustração de uma cabeça com lâmpada feita de papel amassado dentro
Ilustração de uma cabeça com lâmpada feita de papel amassado dentro
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Isaac Newton (1643-1727) fez algumas de suas maiores descobertas quando estava em isolamento durante a epidemia de peste bubônica que atingiu a Inglaterra no século 17.

A reclusão também parece ter inspirado William Shakespeare (1564-1616), que escreveu a peça Rei Lear quando todos os teatros foram fechados durante uma quarentena em decorrência da mesma doença em Londres.

Na década de 1960, o célebre autor infantil Theodor Seuss Geisel (1904-1991), mais conhecido como Dr Seuss, foi desafiado a escrever um livro cujo vocabulário não excedesse o limite de 50 palavras não só venceu a aposta, como Ovos Verdes e Presunto se tornou uma de suas obras mais famosas.

Tendemos a pensar em criatividade e liberdade como duas coisas que caminham sempre juntas. E que as restrições podem, por sua vez, parecer um tanto... limitantes.

Mas especialistas acreditam (e os exemplos acima nos mostram) que não é bem assim.

"É um belo mito pensar na criatividade como um campo aberto de infinitas possibilidades. A realidade é que, quando as pessoas estão diante de um campo aberto maravilhoso, elas podem ficar paralisadas", explica a psicóloga cognitiva Catrinel Tromp.

"As restrições são as âncoras da criatividade."

Isso acontece porque diante de uma limitação, somos levados a encontrar soluções.

"A resiliência (capacidade de superar obstáculos) aparece quando você tem problemas e desafios. Isso, por sua vez, te dá ideias", afirma a neurocientista Susan Greenfield, da Universidade de Oxford, no Reino Unido, especializada em criatividade.

Até que ponto os limites podem estimular a criatividade?
Até que ponto os limites podem estimular a criatividade?
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Estas limitações podem ser de cunho político e socioeconômico, por exemplo, como lembra a artista britânica Quilla Constance.

"Ser uma artista mulher, negra e de origem proletária pode ser visto como uma limitação dentro do mundo da arte, que historicamente é um espaço bastante patriarcal, branco e de classe média", avalia.

Ela cita o exemplo da hoje aclamada artista negra americana Faith Ringgold, ícone da luta pela igualdade racial e pelos direitos das mulheres nos EUA, que conseguiu driblar as adversidades de forma criativa:

"Ela queria fazer aquelas telas enormes, da mesma forma que muitos homens estavam fazendo grandes obras de arte modernistas. Mas ela não tinha espaço em casa para fazer isso. Ela começou então a fazer essas colchas enormes — enrolar e levar para várias galerias. Ela é um ótimo exemplo de como um artista pode florescer sob limitações."

Limitações na medida certa

Greenfield observa, no entanto, que as limitações podem nem sempre ser benéficas para a criatividade.

"Existe uma questão interessante sobre se as restrições são realmente benéficas ou problemáticas para a criatividade. E acho que a resposta para ambos os casos é sim", diz ela.

Então até que ponto as limitações podem estimular a criatividade?

Pesquisas indicam que existe uma curva de criatividade em forma de U invertido. Sem as limitações, podemos nos sentir entediados e pouco estimulados. Mas se houver muitas restrições, podemos ficar estressados e oprimidos. O ponto ideal está no meio.

E a boa notícia é que todo mundo pode exercitar a criatividade.

"A maioria das pessoas tende a pensar que a criatividade é algo que acontece com pessoas que têm um talento específico. Isso é um equívoco", afirma o psicólogo Volker Patent, da Open University.

"Não existe algo como um gene para a criatividade", completa Greenfield.

Embora grande parte das limitações seja imposta, como no caso de um lockdown em decorrência de uma epidemia, você também pode escolher estabelecer limites para estimular a criatividade.

A seguir, especialistas compartilham algumas dicas:

1. Marque na agenda

"Agende um horário específico em que você não fará nada além de se envolver na tarefa criativa. Esta é uma das maneiras pelas quais as pessoas com muito pouco tempo conseguem escrever livros — ao dizer a todos em sua família que é isso que você vai estar fazendo, você está, na verdade, reservando um espaço para si mesmo para que algo criativo aconteça", recomenda Patent.

2. Saia da zona de conforto

"Evite a familiaridade e abrace a novidade. Seja usando materiais diferentes, um método diferente ou um processo diferente. Se você sempre escreve poesia, tente prosa", sugere Tromp.

3. Acione o cronômetro

"Comece a desenhar e dê a si mesmo cinco minutos. Faça outro desenho. Dê a si mesmo 10 segundos para fazer o desenho. Quando temos menos tempo para fazer algo, geralmente as informações mais importantes aparecem", propõe Constance.

4. Troque de papéis

"Se você toca em uma banda e está se sentindo muito travado, troque de instrumento. Isso pode gerar novas ideias em suas músicas também", diz Patent.

5. Trace limites

"Pinte um ponto vermelho ou uma linha azul no canto superior esquerdo da tela em branco e desafie-se a incorporar essas restrições na composição. E mesmo que você não acabe usando essas restrições específicas no produto final, elas podem ser benéficas para a criatividade desde que você brinque com elas espontaneamente. O que pode acontecer é que a mera experiência de brincar com diferentes limitações amplie sua imaginação e melhore a criatividade", sugere Tromp.

Este artigo foi baseado no vídeo How limits can boost your creativity ("Como os limites podem estimular a sua criatividade"), da BBC Ideas — você pode assistir ao vídeo aqui (em inglês).

- Este texto foi originalmente publicado em https://www.bbc.com/portuguese/geral-61463427

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