Sucesso da Voyager só seria repetido em 150 anos, diz astrofísico brasileiro
Ulisses Barres afirma que uma nova sonda destinada a explorar o Sistema Solar não seria mais rápida que a Voyager I, enviada há 36 anos
Até a próxima terça-feira, o Rio de Janeiro recebe a 33ª Conferência Internacional de Raios Cósmicos, que reúne os melhores físicos e astrofísicos do mundo inteiro e que pela primeira vez acontece na América Latina. Cerca de mil pesquisadores de todo o mundo, incluindo o prêmio Nobel de Física de 1976, Samuel Ting, que fala nesta segunda-feira para o público, participam do evento promovido pelo Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas. Um dos organizadores, o professor Ulisses Barres, formado pela Universidade de São Paulo (USP) e com doutorado em Londres, conversou com o Terra sobre o evento e sobre o momento atual da física no Brasil.
Sondas Voyager chegam aos 35 anos; conheça história
Terra: É a primeira vez que o evento acontece na América Latina. Por que no Brasil?
Barres:
Acho que é um sinal claro da maturidade que o País vêm atingindo em ciência. Um apoio sólido por parte do governo, do financiamento. Os brasileiros que participam da conferência são muitos, e quase todos envolvidos nos projetos que estão sendo apresentados aqui. É um bom indicador.
Terra: Qual é maior novidade em termos de Brasil?
Barres:
Acho que o projeto mais interessante, que está em uma nova área da astrofísica, tem apenas 20 anos e se chama Astronomia de Raios Gama - que é a observação dos céus em altíssimas energias. E o Brasil está envolvido na construção de novos telescópios, a chamada CTA (Rede de Telescópios Cherenkov): 60 telescópios supermodernos que deverão ser construídos na América Latina, em lugar ainda a definir, e que vão representar um salto nessa área. O Brasil é um dos grandes investidores na construção desses telecópios, que devem começar em 2015.
Terra: E vamos ter um desses no Brasil?
Barres:
Não, porque são precisos alguns recursos de localização, como um altiplano bastante elevado de 2.000, 2.500 metros em região limpa, desértica, e não temos isso por aqui. Mas na Argentina e no Chile, sim. E isso para nós vai ser como abrir uma nova janela no espaço. Descobrir um cosmos totalmente novo. Algo que se poderia prever, mas que nunca foi visto.
Terra: Entre os diversos temas falados aqui, um dos mais interessantes foi o professor Ed Stone falando da Voyager, que está prestes a romper a barreira do Sistema Solar?
Barres:
Sem dúvida. Em tempos onde você compra um equipamento relativamente simples, com o que a gente hoje consegue produzir de tecnologia, e que quebra em 10 dias, ver algo feito há 40 anos e ainda funcionando é incrível. Enviando dados, antecipando coisas que ainda vão acontecer. Quando lançaram a Voyager, eles esperavam chegar na barreira do Sistema Solar, mas ninguém sabia quando e o que seria encontrado. E um equipamento capaz de medir esses dados é impressionante.
Terra: O que podemos esperar do trabalho da Voyager?
Barres:
As partículas que ela está medindo, mais energéticas, vindas de fora do Sistema Solar, nunca foram medidas. Elas trazem informação do estado do campo magnético e de qual é o ambiente cósmico fora do Sistema Solar, fora dessa proteção magnética que o Sol nos dá e que barra a entrada de partículas para cá.
Terra: Se tivéssemos que mandar um outra sonda hoje teríamos que esperar mais 40 anos para ter essas informações?
Barres:
Outros 40 anos, pelo menos. A viagem, começando hoje, não seria mais rápida do que a que começou na década de 1970. A Voyager foi muito especial porque, para chegar onde ela chegou, ela se utilizou dos planetas como "estilingue". Ela passou rente a Saturno, Júpiter, Urano e Netuno e com o impulso gravitacional deles acelerava e corrigia sua rota. Essa configuração, usando os planetas em sequência, acontece a cada 150 anos e isso foi bem calculado em 1977. Agora teríamos que esperar mais 150 anos para lançar um sonda com tanto sucesso. É coisa única.