Fósseis falsos de dinossauros: o que novo estudo revela
A história da falsificação de fósseis remonta aos primórdios da própria Paleontologia, com os primeiros relatos datando do final do século 18 e início do século 19.
Fósseis falsos estão entre nós, passando quase despercebidos aos olhos de especialistas em todo o mundo. Este é um problema sério — espécimes falsificados podem induzir paleontólogos ao erro de estudar um passado antigo que nunca existiu.
Em um novo estudo, meus colegas e eu revelamos uma verdade surpreendente sobre um fóssil celebrado por décadas como um dos mais bem preservados dos Alpes.
O Tridentinosaurus antiquus era um pequeno réptil semelhante a um lagarto que viveu durante o período Permiano (299-252 milhões de anos atrás), onde hoje estão localizados os Alpes.
Descoberto em 1931, o espécime foi valorizado pelo que os cientistas pensavam ser vestígios carbonizados da pele visíveis na superfície da rocha. Gerações de paleontólogos acharam que o fóssil era genuíno, talvez a múmia animal mais antiga já descoberta. Isso se deve, em parte, ao fato de o tipo de preservação ser raro.
O fóssil foi mencionado em livros e artigos, mas nunca foi estudado em detalhes com técnicas modernas. Os especialistas não tinham certeza em relação a que grupo de répteis o fóssil pertencia. Nosso estudo esperava resolver este e outros debates de longa data entre os cientistas.
Mas nossa equipe descobriu que a pele é, na verdade, falsa. O que se pensava ser uma pele carbonizada bem preservada, era apenas uma impressão corporal esculpida em forma de lagarto coberta com tinta preta.
O fóssil, no entanto, não é totalmente falso. Os ossos dos membros posteriores, em especial os fêmures, parecem genuínos. Também encontramos algumas escamas ósseas minúsculas (chamadas osteodermas, como as escamas dos crocodilos) preservadas no que talvez fosse o dorso do animal.
Foi a partir da nossa investigação preliminar, usando fotografia ultravioleta, que revelamos que o contorno corporal de cor escura e todos esses ossos e escamas haviam sido tratados com algum tipo de material de revestimento. O revestimento de fósseis com vernizes ou lacas costumava ser uma prática normal nos últimos dois séculos — e, às vezes, ainda é necessário para preservar espécimes fósseis em armários e exposições de museus.
Esperávamos que, sob a camada de revestimento, os tecidos moles originais ainda estivessem em boas condições. Mas técnicas químicas revelaram que o material, na verdade, correspondia a um tipo de tinta preta feita a partir de ossos de animais, o que significa que a pele foi de fato totalmente forjada.
Infelizmente, isso significa que nunca saberemos como o fóssil original realmente era.
As circunstâncias por trás desta falsificação são desconhecidas, mas sabemos que a mesma ocorreu antes de 1959 — data da descrição científica oficial do fóssil. No entanto, esta descoberta é um lembrete de como é importante registrar tais espécimes e combater as falsificações de fósseis.
A história das falsificações de fósseis
A história da falsificação de fósseis remonta aos primórdios da própria Paleontologia, com os primeiros relatos datando do final do século 18 e início do século 19.
Era motivada principalmente pelo lucrativo mercado de venda de espécimes fósseis para colecionadores particulares e museus. Por exemplo, um espécime original de Archeopteryx (um dinossauro aviário) foi vendido pelo equivalente hoje a £ 85 mil (aproximadamente R$ 535 mil) no início da década de 1860. Algumas pessoas também falsificaram fósseis para fins de reconhecimento científico e social.
Exemplos famosos abrangem uma variedade de tipos de fósseis, desde o Homem de Piltdown (1912), uma fraude elaborada que envolveu a construção de um hominídeo a partir de um amálgama de ossos humanos e de macacos; até o Archaeoraptor (1990), uma quimera (fóssil reconstruído com elementos provenientes de mais de uma única espécie ou gênero de animal) formada por partes de esqueletos de dinossauros diferentes para formar um novo espécime que, inicialmente foi reportado na revista National Geographic como genuíno em 1999.
Outros exemplos incluem casos de crânios parciais de mamíferos extintos que foram completados com ossos feitos de plástico. Às vezes, uma mistura de cimento, resinas, fragmentos de rocha e poeira é usada para este tipo de falsificação. Os falsificadores também podem usar tinta marrom escura ou preta para mudar a aparência de espécimes mal preservados que, de outra forma, não seriam de interesse para pesquisadores ou colecionadores.
Isso aconteceu no caso da Mongolarachne chaoyangensis, supostamente uma aranha gigante encontrada na China. Descobriu-se que se tratava de um lagostim mal preservado depois que paleontólogos deram uma olhada mais de perto, no mesmo ano em que o primeiro artigo sobre ela foi publicado, em 2019.
Os cientistas descobriram que museus de história natural em todo o mundo têm espécimes falsificados em suas coleções. Embora as novas tecnologias estejam ajudando a estudar mais detalhadamente os fósseis de trilobitas, um tipo de invertebrado marinho antigo, elas também estão revelando que muitos espécimes são falsos.
O mesmo está acontecendo com restos de animais e plantas fossilizados em âmbar (resina de árvore que preserva fósseis), adquiridos em épocas históricas e só recentemente analisados em detalhes com técnicas modernas.
O mercado de fósseis falsos é um grande problema atualmente. Isso acontece principalmente em países com menos regulamentação. O comércio de fósseis somente no Marrocos chega a US$ 40 milhões (cerca de R$ 200 milhões) por ano — e abastece exposições de fósseis em todo o mundo.
Enquanto isso, o colonialismo abafou o conhecimento local na América do Sul e, como resultado, um grande número de estudos sobre fósseis da região se baseia em espécimes transferidos ilegalmente para coleções em outros países, sobretudo na Alemanha e no Japão.
Precisamos que os governos de todo o mundo introduzam leis rigorosas para proteger o patrimônio paleontológico e geológico global.
O caso do Tridentinosaurus antiquus serve de alerta. Acreditamos que nossa pesquisa pode orientar práticas de conservação de fósseis que não são mais apropriadas, como a pintura sobre fósseis, e, por sua vez, delinear medidas mais éticas a serem tomadas quando um fóssil é descoberto.
Por exemplo, o estado de um fóssil no momento da descoberta deve ser registrado em detalhes — junto a informações sobre quando e onde ele foi encontrado, e como foi preparado e conservado. Floreios devem ser evitados.
Talvez não consigamos acabar com a fabricação de fósseis falsos, mas estamos aqui prontos para desmascará-los e proteger nosso maravilhoso patrimônio fóssil.
* Valentina Rossi é pesquisadora de pós-doutorado em paleontologia na University College Cork, na Irlanda.
Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado aqui sob uma licença Creative Commons. Leia aqui a versão original (em inglês).