Script = https://s1.trrsf.com/update-1727287672/fe/zaz-ui-t360/_js/transition.min.js
PUBLICIDADE

Grilos, larvas e escorpiões serão a comida do futuro?

30 out 2016 - 15h39
(atualizado às 15h49)
Compartilhar
Exibir comentários
Os fundadores da Coalo Valley Farms acreditam que a criação de grilos e outros insetos possa ser o futuro do setor agrícola
Os fundadores da Coalo Valley Farms acreditam que a criação de grilos e outros insetos possa ser o futuro do setor agrícola
Foto: BBC / BBC News Brasil

Cinco amigos de faculdade resolveram iniciar uma revolução em um depósito no bairro de Van Nuys, na cidade de Los Angeles, nos Estados Unidos.

Os amigos trabalham com agricultura urbana na empresa Coalo Valley Farm. Mas não é uma fazenda comum: o galpão está lotado com um "microrebanho", como um dos fundadores e diretor-executivo da companhia, Elliot Mermel, gosta de chamá-lo.

O "micro-rebanho" é formado por milhares de grilos e larvas de besouros. A Coalo Valley Farm é a primeira fazenda de insetos para consumo humano do Estado da Califórnia. E os donos do projeto têm grandes planos.

"Sabemos que insetos são uma fonte sustentável de proteína e, no momento em que o mundo já está lutando para alimentar 7 bilhões de pessoas, queremos tentar encontrar uma forma de alimentar as gerações futuras", diz Mermel.

Instalações da fazenda californiana lembram galpões de cultivo de maconha
Instalações da fazenda californiana lembram galpões de cultivo de maconha
Foto: BBC / BBC News Brasil

A fazenda buscou seguir diretrizes ecológicas e ambientais, considerando que a Califórnia sofre com clima seco e falta d'água.

O diretor-executivo se refere às operações da fazenda como um "circuito fechado": quase tudo é gerado no local. Peixes criados lá fornecem a água residual que sustenta os brotos de alfafa e o feijão, que, por sua vez, alimentam os grilos.

As instalações da empresa também se assemelham a galpões de cultivo de maconha - os cinco amigos pegaram emprestada a tecnologia desta indústria. As barracas prateadas são aquecidas e, dentro delas, há fileiras de tonéis e prateleiras com insetos.

Eles começaram o negócio em 2015, mas já contam com fãs nos mercados de comida saudável e barras de proteína.

Elliot Mermel defende que insetos podem colaborar para uma dieta mais sustentável
Elliot Mermel defende que insetos podem colaborar para uma dieta mais sustentável
Foto: BBC / BBC News Brasil
Larvas de besouros cultivadas na Coalo Valley Farm, empresa criada em 2015
Larvas de besouros cultivadas na Coalo Valley Farm, empresa criada em 2015
Foto: BBC / BBC News Brasil

Desbravando mercados

Ao sul da fronteira, no México, o cenário do mercado para esses novos empreendimentos não é tão simples.

Os insetos são consumidos no país desde antes da chegada dos colonizadores espanhóis. Não há, portanto, grande aversão cultural a a comê-los. Mas a criação de insetos para consumo humano ainda não existe.

Rene Cerritos, biólogo na Universidade Nacional Autônoma do México, trabalha com fazendeiros do país para tentar estimular a produção de insetos comestíveis.

Segundo ele, o México abriga cerca de 25% das quase 2 mil espécies de insetos comestíveis do mundo, mais do que qualquer outro país no mundo. Mas a demanda ainda é baixa.

México tem um quarto dos cerca de 2 mil insetos comestíveis do mundo
México tem um quarto dos cerca de 2 mil insetos comestíveis do mundo
Foto: BBC / BBC News Brasil

"Os ocidentais têm um problema concreto com o consumo de insetos (...) O México está se ocidentalizando, então, muitas tradições que tínhamos desde os tempos pré-colombianos foram perdidas. Os insetos estão lá, toneladas e toneladas deles. E poderíamos cultivá-los e consumi-los, mas não fazemos isso."

Para Silvio Nihei, professor de Zoologia no Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP), o número estimado pela ONU de quase 2 mil espécies de insetos comestíveis pode ser bem maior.

"Temos aproximadamente 1 milhão de espécies de insetos descritos (conhecidos) no planeta", explicou Nihei à BBC Brasil.

O professor então cita apenas o exemplo brasileiro e elabora uma hipótese.

"Em escala nacional, só de besouros das famílias Cerambycidae e Curculionidae há 10 mil espécies brasileiras (no mundo somam mais de 100 mil espécies), e de formigas são 2,5 mil espécies. Se restringirmos esses números para espécies de maior tamanho (e maior valor calórico e nutricional), poderíamos pensar em algo em torno de 2 a 3 mil espécies de besouros e umas 500 espécies de formigas. Isso só no Brasil."

Praga que dá lucro

Na Califórnia, a criação é de grilos. Já no México, os novos fazendeiros se concentram nos gafanhotos. As diferenças são sutis: os grilos são onívoros (se alimentam de fontes vegetais e animais) e os gafanhotos, vegetarianos.

No México, os gafanhotos são considerados pragas, porque atacam lavouras e reduzem a produção, dando prejuízos aos fazendeiros.

Fazendeiro mexicano parou de lutar contra os gafanhotos e decidiu criar os insetos para consumo
Fazendeiro mexicano parou de lutar contra os gafanhotos e decidiu criar os insetos para consumo
Foto: BBC / BBC News Brasil

José Moreno Sanchez é fazendeiro há 30 anos e decidiu mudar a relação com esses insetos.

"Os gafanhotos comeram as lavouras, e o dano financeiro foi grande, especialmente quando semeávamos verduras. Então, em vez de lutar contra eles, decidimos transformar os gafanhotos em negócio", contou.

Agora, ele espera algum lucro com os gafanhotos de sua fazenda.

Sanchez diz que a grande maioria dos gafanhotos são capturados de maneira informal. As pessoas coletam os insetos, mas não são donas da terra - e geralmente pisoteiam lavouras para capturar os bichos, irritando os fazendeiros.

O chef e crítico gastronômico mexicano Alejandro Escalante diz que a relutância dos fazendeiros mexicanos em relação aos gafanhotos é "terrível".

Ele faz uma lista dos insetos que usa na cozinha de seu restaurante, La Casa de los Tacos, no sul da Cidade do México, entre eles escorpiões e carrapatos.

José Moreno Sanchez espera conseguir lucros com a criação de gafanhotos para consumo humano
José Moreno Sanchez espera conseguir lucros com a criação de gafanhotos para consumo humano
Foto: BBC / BBC News Brasil

O chef afirma que todos são deliciosos. "Eles têm muita proteína, são saborosos e há uma grande variedade."

O professor da USP Silvio Nihei afirma que no Brasil não há levantamento dos insetos usados como alimentos.

"Mas o mais comum são os seus produtos derivados - mel, geleia real, própolis. Já o consumo de insetos inteiros é incomum por aqui, mas sabemos que em muitas partes do país, principalmente no interior, consome-se o abdômen de saúvas fêmeas quando estão cheias de ovos (chamadas de içá ou tanajura)."

Para Nihei, se fosse feito um levantamento das espécies de insetos consumidas no país, "seria um número bem reduzido entre a sociedade não indígena, enquanto o número para as comunidades indígenas, onde este hábito é mais comum, seria maior."

Iguarias finas

O mercado de San Juan, no centro da Cidade do México, é uma amostra desta variedade de insetos comestíveis.

Alejandro Escalante prepara insetos em seu restaurante
Alejandro Escalante prepara insetos em seu restaurante
Foto: BBC / BBC News Brasil

O grande galpão é onde se pode ter uma experiência gastronômica e encontrar uma variedade incrível de tipos de carne, incluindo crocodilo e avestruz.

Mas também é possível encontrar tarântulas, escorpiões, gafanhotos e larvas de agave. Sendo que algumas espécies em exposição ainda estão vivas.

Insetos e aracnídeos, contudo, não são baratos. E o potencial de lucro é uma das razões que levaram Alessandro Spagnuolo e sua família a abrir a própria fazenda de insetos, onde coletam algo que é conhecido como o "caviar" do México, larvas das formigas Liometopium apiculatum ou "escamoles".

Muitos dos que coletam os insetos não são donos das terras onde procuram as iguarias
Muitos dos que coletam os insetos não são donos das terras onde procuram as iguarias
Foto: BBC / BBC News Brasil

A companhia da família de Spagnuolo, a JC Redon, fica em uma fazenda em Hidalgo. Eles levaram a reportagem da BBC para um passeio por trilhas locais em busca de ninhos com ovas de insetos e plantas de agave, onde as larvas podem ser encontradas.

A temporada não tem sido muito boa e há poucas plantas de agave. O que pode explicar o preço da larva: cerca de US$ 100 (R$ 320) o quilo.

Exclusividade x popularidade

A exclusividade do produto é parte do charme para consumidores mais exigentes.

A fazenda Hidalgo tem passado por temporadas difíceis
A fazenda Hidalgo tem passado por temporadas difíceis
Foto: BBC / BBC News Brasil

Mas Spagnuolo acredita que a popularidade de seus produtos aumentará em breve, tornando exportações para a Europa, por exemplo, uma realidade.

Por enquanto, as leis não permitem exportação de insetos para consumo humano do México para o continente europeu.

"É como sushi. Há 20 anos, poucas pessoas na Europa achavam que não tinha problema comer peixe cru - agora, está em toda parte. Será o mesmo com insetos", explicou Spagnuolo.

De volta à Los Angeles, Elliot Mermel e o grupo de produtores da Coalo Valley Farm estão descobrindo que os clientes preferem os insetos sem as pernas e, frequentemente, moídos até virar pó.

Talvez a ideia de pedir um prato de insetos ou uma porção de grilos ainda é um passo muito grande para os consumidores que nunca tiveram por perto uma cultura de consumo de insetos.

É possível encontrar uma grande variedade de insetos e aracnídeos comestíveis no mercado de San Juan
É possível encontrar uma grande variedade de insetos e aracnídeos comestíveis no mercado de San Juan
Foto: BBC / BBC News Brasil
BBC News Brasil BBC News Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização escrita da BBC News Brasil.
Compartilhar
TAGS
Publicidade
Seu Terra












Publicidade