O que fezes e vômito de dinossauros revelam sobre seu domínio na Terra e as mudanças climáticas
Como os dinossauros superaram a concorrência e se adaptaram às mudanças climáticas? O segredo está em fezes e restos de vômito fossilizados de mais de 200 milhões de anos atrás, de acordo com um estudo publicado na revista científica Nature.
Como os dinossauros se tornaram uma espécie dominante no planeta?
Sabe-se que o fim de seu longo domínio ocorreu após o impacto de um asteroide há 66 milhões de anos.
Mas o mistério de como estas criaturas gigantes superaram outras espécies e passaram a dominar o planeta tem intrigado os cientistas há anos.
A resposta, de acordo com um novo estudo publicado na revista científica Nature, pode ser encontrada nas fezes e nos restos de vômito fossilizados de dinossauros de mais de 200 milhões de anos atrás.
Os fósseis de fezes e de vômito são chamados de coprólitos e regurgitalitos, respectivamente. Juntos, eles são conhecidos como bromalitos.
Esses fósseis nos permitem reconstruir as redes alimentares de ecossistemas passados — e o que eles contêm, incluindo insetos, é extraordinário.
"Os insetos eram incríveis. Alguns tinham apenas 1 mm de comprimento, mas estavam preservados com todas as suas minúsculas pernas, antenas e detalhes intrincados — em um coprólito de 230 milhões de anos", disse à BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC, o paleontólogo Martin Qvarnström, da Universidade de Uppsala, na Suécia, principal autor do estudo.
"Também descobrimos coprólitos repletos de fragmentos de ossos mastigados e dentes triturados. É que o primitivo arcossauro Smok mastigava ossos como as hienas modernas para extrair a medula e os nutrientes, mas, ao fazer isso, triturava e engolia seus próprios dentes", acrescenta Qvarnström.
"Estas são apenas algumas surpresas, mas, em conjunto, elas revelam a estrutura de ecossistemas inteiros daquela época."
A ascensão dos gigantes
Os dinossauros surgiram há aproximadamente 230 milhões de anos.
Mas, inicialmente, eles foram ofuscados por outros animais, incluindo parentes grandes de crocodilos e herbívoros do tamanho de elefantes.
No entanto, há cerca de 200 milhões de anos, os dinossauros passaram a dominar a Terra — e seus principais concorrentes desapareceram.
"Abordamos o surgimento dos dinossauros de uma maneira completamente nova", explica Qvarnström.
"Analisamos as evidências alimentares para deduzir o papel ecológico dos dinossauros ao longo de seus primeiros 30 milhões de anos de evolução."
O estudo se concentrou em uma região da Polônia com uma grande quantidade de fósseis desse período crucial.
"Estudamos mais de 100 quilos de fezes fossilizadas", diz Grzegorz Niedźwiedzki, paleontólogo e geólogo da Universidade de Uppsala e do Instituto Geológico Polonês, outro autor do estudo.
Qvarnström e seus colegas analisaram mais de 500 bromalitos — e examinaram seu conteúdo.
Os cientistas usaram diferentes tipos de microscópios e uma técnica conhecida como microtomografia síncrotron, que utiliza um acelerador de partículas para ver o interior dos fósseis em detalhes.
A análise dos materiais digestivos permitiu aos pesquisadores decifrar "quem estava comendo quem, e observar essa tendência durante um período de tempo bem longo", explica Qvarnström.
Mas como os pesquisadores podem saber quem produziu essas fezes?
Os ossos e as pegadas fósseis mostram quais animais estavam presentes em uma determinada época.
E os pesquisadores deduziram quem produziu um determinado coprólito com base em fatores como o tamanho e forma do fóssil e os sistemas digestivos de parentes vivos desses animais extintos.
Adaptar-se ou ser extinto
A equipe descobriu que o número e a variedade do conteúdo dos fósseis aumentaram com o tempo.
Isso indica que os dinossauros maiores, com hábitos alimentares mais diversificados, começaram a ganhar destaque no fim do período Triássico — de 237 milhões a 201 milhões de anos atrás.
Ao comparar os fósseis com dados de plantas da época, os cientistas descobriram que a ascensão dos dinossauros foi determinada pelo acaso e por adaptações.
Por exemplo, o clima mudou e houve um aumento na umidade, o que alterou a vegetação disponível.
Os dinossauros foram capazes de se adaptar melhor do que outros animais terrestres às mudanças climáticas e às modificações na dieta.
Outras mudanças ambientais relacionadas ao aumento da atividade vulcânica precipitaram uma variedade mais ampla de plantas que os dinossauros herbívoros, cada vez maiores, exploravam.
A proliferação de grandes dinossauros herbívoros levou, por sua vez, à evolução de dinossauros carnívoros maiores.
"O que aprendemos foi que o surgimento dos dinossauros levou bastante tempo e foi realmente complexo", afirma Qvarnström.
O domínio dos dinossauros "não aconteceu da noite para o dia; os dinossauros tiveram que competir ferozmente com outros grupos de animais, e um pouco de sorte influenciou".
A capacidade de adaptação dos primeiros dinossauros foi vital, segundo o cientista.
"Os animais com dietas mais especializadas tiveram dificuldade com as mudanças climáticas."
Por outro lado, "os animais com dietas mais variadas parecem ter enfrentado melhor as mudanças ambientais, o que foi crucial para o sucesso inicial dos dinossauros, à medida que os primeiros dinossauros se deram melhor com suas dietas variadas e flexibilidade".
O estudo ajuda a compreender como a vida responde a diferentes pressões, incluindo as derivadas das mudanças climáticas.
"Entender as mudanças passadas na fauna pode influenciar nossa compreensão dos ecossistemas atuais, que enfrentam desafios significativos devido às mudanças climáticas", afirmou Qvarnström à BBC.
No futuro, os cientistas esperam estudar bromalitos de outras regiões.
"Planejamos testar esse modelo com os principais fósseis de dinossauros primitivos em outras regiões. A América do Sul, onde os primeiros dinossauros de verdade foram encontrados, é uma área que estamos particularmente animados para explorar a seguir."